Uma das figuras mais polêmicas do jornalismo americano colocou novamente em questão esta semana a credibilidade dos veículos de imprensa que embarcaram no apoio incondicional ao ex-presidente Donald Trump e ao pensamento de extrema-direita, como as redes Fox News, One America News e Newsmax.
Em uma entrevista, o apresentador Tucker Carlson, estrela da Fox nos Estados Unidos (EUA), admitiu que “tenta não mentir na TV”. Com a ajuda do âncora Dave Rubin, Carlson criticava profissionais da rede rival CNN, vistos pelos dois como “defensores do sistema” a todo custo.
“Minto se estou realmente encurralado ou algo assim. Eu minto. Eu realmente tento não fazer isso. Tento nunca mentir na TV. Eu não gosto de mentir. Eu certamente faço isso, você sabe, por fraqueza ou algo assim.”
O apresentador, colunista e escritor revelou a faceta do seu comportamento enquanto preparava argumentação para atacar colegas que “mentem sistematicamente” — e não às vezes, como ele– em defesa de figuras que “representam o sistema”, na concepção de Carlson, como Jeff Bezos, fundador da Amazon e hoje dono do jornal Washington Post.
A polêmica declaração aconteceu no dia em que foi revelada a morte do radialista Bob Enyart. Ele foi o quinto jornalista americano que se posicionava abertamente contra a vacina para a Covid-19 e perdeu a vida para o coronavírus em seis semanas. Os cinco que morreram eram declaradamente conservadores, como Carlson.
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“Mentir sistematicamente assim, sem se perguntar ‘por que estou fazendo isso’? Então, se essas pessoas se perguntarem: ‘Por que estou fazendo isso?’
E elas responderem: ‘Bem, quero proteger o sistema porque realmente acredito no sistema’. Como elas ousam usa o poder que têm para fazer isso?”, indagou. Carlson já trabalhou na CNN.
Na Fox News na segunda-feira (13/8), Carlson voltou a um tema recente: hesitação ante a vacina da Covid-19 e defesa dos americanos que optam por comprar provas falsas de vacinação.
O apresentador não disse se está vacinado. Segundo informações da mídia americana, a Fox News incentiva vacinas entre os funcionários. Veja abaixo um trecho da entrevista de Carlson no Rubin Report (a partir do sétimo minuto, o trecho sobre mentiras):
Tucker Carlson é símbolo conservador e nacionalista nos EUA
Carlson é conhecido da audiência americana por seu perfil conservador e nacionalista, sendo um crítico da imigração, além de abordagens criticadas em relação a temas como o racismo ou a igualdade entre homens e mulheres.
O programa do apresentador na Fox News é uma das atrações que reforça o caráter conservador de direita da emissora, que durante os anos Trump teve status de uma das preferidas do presidente. Carlson é apontado como influenciador de decisões do ex-presidente em assuntos-chave, como manobras militares.
No início de agosto, ele viajou para a Hungria, onde entrevistou o primeiro-ministro Viktor Orbán.
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A visita de um jornalista de primeiro escalão como Carlson passa verniz no regime que vem sufocando jornais e publicações não simpáticas ao governo Orbán, bem como limitando direitos e implementando políticas de fertilidade em busca de uma Hungria “pura”.
Entre iniciativas do premiê, estão expulsar a Universidade da Europa Central do país, banir o estudo acadêmico de gênero nas faculdades, permitir que o partido Fidesz comandasse 90% da mídia no país e demonizar o investidor húngaro-americano George Soros como mentor de tendências culturais que servem para inflamar a base popular de apoiadores do primeiro-ministro.
Trump x mídia
Ao admitir que mente de vez em quando, Tucker Carlson ajudou a reforçar a má impressão sobre a mídia que Donald Trump tentava deliberadamente criar.
Em 2020, a veterana jornalista Lesley Stahl revelou que durante a preparação para uma entrevista com Trump para o programa 60 Minutes, da rede CBS, em 2016, ele explicou a ela a razão de seus constantes ataques à imprensa:
‘Sabe por que eu faço isso? Faço para descreditar todos vocês e para minimizá-los. Assim, quando vocês escreverem matérias negativas sobre mim, ninguém acreditará em vocês”.
Com a saída do ex-presidente do cargo, tanto a Fox News quanto a Newsmax e a One America News Network seguiram endossando a bandeira de que as eleições de 2020 teriam sido fraudadas, mas vem sendo questionadas até legalmente.
Em abril, a Newsmax teve que se retratar por ter acusado o diretor de uma empresa de sistemas eletrônicos de adulteração das urnas para prejudicar o ex-presidente.
A organização publicou em seu site uma declaração afirmando não ter encontrado evidências de que Eric Coomer, da Dominion Voting Systems, tenha manipulado as máquinas de votação, o software e a contagem de votos.
Para a Fox News o problema é ainda maior do que um pedido de desculpas. Ela está sendo processada devido a matérias associando duas empresas de tecnologia a fraudes eleitorais.
A primeira a pedir indenização, em fevereiro, foi a Starmatic, responsável pelo software do condado de Los Angeles. E a segunda, em março, foi a Dominion Voting Systems, que forneceu equipamentos para as eleições em 28 estados. Somadas, as causas podem custar à emissora US$ 4,3 bilhões.