Londres – O repórter Budhinath Jha, 22 anos, foi encontrado morto no distrito de Madhubani, em Bihar, no nordeste da Índia, em mais um caso de violência contra jornalistas no país. Também conhecido como Avinash Jha, ele investigava clínicas ilegais na região.

Seu corpo carbonizado foi deixado ao lado de uma árvore, em uma rodovia na região, onde foi achado no dia 12/11.  O repórter editava uma página de notícias locais no Facebook chamada BNN News.

A Índia tem sido palco de uma sequência de violações à liberdade de imprensa, com atos praticados por insatisfeitos com a cobertura da mídia independente e ações do próprio governo. Em julho, um dos principais grupos editoriais do país teve várias redações invadidas pela polícia. 

Ameaças e Impunidade

As clínicas investigadas pelo jornalista ficavam em Benipatti, cidade no distrito de Madhubani, onde ele morava. Jha também havia entrado com pedidos de informações sobre as clínicas, de acordo com a Lei de Direito à Informação (RTI) da Índia.

Seu irmão, Chandrashekhar Kumar, disse à mídia local que Jha já havia sido alvo de repetidas tentativas de extorsão e ameaças que buscavam silenciá-lo.

Ele desapareceu dois dias depois de fazer um post no Facebook que mencionava clínicas médicas que ele classificava como “falsas”.

O trabalho do repórter freelance levou ao fechamento de algumas dessas clínicas, bem como multas pesadas para outras, e a violência contra o jornalista pode ter relação direta com os fatos.

O repórter assassinado em seu local de trabalho
Buddhinath Jha (Reprodução/Facebook)

O diretor da região Ásia-Pacífico da organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF), Daniel Bastard, ressaltou a impunidade de crimes contra jornalistas na Índia e cobrou as autoridades:

“A morte de Avinash Jha é ainda mais chocante porque ele claramente pagou com sua vida pelo seu trabalho e integridade jornalística. Convocamos o ministro-chefe de Bihar, Nitish Kumar, que ordene uma investigação independente sobre esse assassinato e identifique os responsáveis ”, disse.

A violência contra jornalistas na Índia 

Durante o ano de 2021, houve pelo menos cinco invasões em redações de publicações na Índia, o que demonstra o agravamento da crise de liberdade de imprensa no país. Os casos foram denunciados pela Federação Internacional de Jornalistas (IFJ), que condenou os atos e considerou se tratar de uma tentativa de reprimir a mídia nacional.

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(Reprodução)

As linhas de investigação do assassinato

Notícias publicadas pela mídia local indiana em 15/11, como no India Today, indicam que seis pessoas foram presas, suspeitas de conexão com o assassinato de Budhinath Jha. Uma das primeiras linhas de investigação trata o caso como desentendimentos em um triângulo amoroso, do qual o repórter faria parte.

Essa é uma teoria que a família refuta.

A violência contra jornalista é um problema recorrente no país. De acordo com a RSF, que acompanha violações à liberdade de imprensa, Jha é o quarto jornalista morto em conexão com seu trabalho nos últimos meses na Índia. Em um dos casos mais recentes, o repórter de TV Raman Kashyap foi mortalmente ferido quando cobria um protesto de agricultores em outubro. 

Já a jornalista Chenna Kesavulu foi esfaqueada até a morte por um policial em agosto, após expor casos de corrupção. O repórter Sulabh Srivastava foi encontrado morto, também na beira de uma estrada, em junho. Nenhuma das investigações em andamento identificou os responsáveis.

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142º em Liberdade de Imprensa 

O Índice Mundial de Liberdade de Imprensa de 2021 da RSF mostra a Índia em 142º lugar entre 180 países analisados. O documento informa com grande quantidade de dados a independência dos meios de comunicação, a qualidade do quadro legislativo dos países e a segurança para os trabalhos dos jornalistas.

Casos sem solução

Os nomes dos jornalistas indianos mortos também constam no The Global Impunity Index 2021 (“Índice de Impunidade Global 2021”), elaborado pela organização internacional de defesa de jornalistas, o Committee to Protect Journalists. A Índia ocupa o décimo segundo lugar (o Brasil é o oitavo).

De acordo com o relatório, há 20 casos não-solucionados de jornalistas assassinados na Índia, um número que acaba de aumentar com a morte de Budhinath Jha.

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Um repórter fotográfico trabalhando
(Al Grishin/Pixabay)

Saúde e violência contra jornalistas 

Em tempos de pandemia de Covid-19, as dinâmicas de cobertura dos trabalhos de jornalismo foram direcionados para a área de saúde, e o desempenho das autoridades públicas em contornar essa situação. Isso se refletiu diretamente na execução dos trabalhos dos jornalistas, que começaram a enfrentar problemas em governos autoritários.

A liberdade de expressão ficou em risco na Índia já no início de 2021, depois que o governo indiano determinou a remoção de conteúdos de Twitter, Instagram e Facebook. Eram posts com críticas à gestão da pandemia e cenas mais dramáticas do que acontece nas ruas e nos hospitais.

No final de abril, o país indiano registrou mais de 400 mil infecções por covid-19 em um único dia, e as big techs receberam ordens de derrubar os posts de quem criticou a situação e a relacionava com o governo.

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