Desde o início da guerra na Ucrânia, em 24 de fevereiro, mais de 150 jornalistas deixaram a Rússia para fugir da censura e repressão do governo de Vladimir Putin, alertam entidades defensoras da liberdade de imprensa.

Uma nova lei de censura aprovada no parlamento russo, que pode punir com até 15 anos de prisão jornalistas opositores ao Kremlin, tem sido usada para silenciar organizações de mídia, afetando especialmente profissionais e empresas independentes.

Por isso, a Media Freedom Rapid Response (MFRR) e a Federação Internacional de Jornalistas (IFJ, na sigla em inglês), em conjunto com outras associações, apelam para que jornalistas da Rússia e, também, de Belarus sejam aceitos como refugiados em países da União Europeia.

Jornalistas deixam Rússia para fugir de forte repressão

Sob o governo Putin, a liberdade de imprensa sempre esteve ameaçada na Rússia. Porém, isso foi intensificado há três semanas com a invasão à Ucrânia, aumentando a repressão contra jornalistas e correspondentes que retratassem a chamada “operação especial” como uma guerra.

Desde então, profissionais e meios de comunicação independentes na Rússia enfrentam a censura mais severa e abrangente dos últimos trinta anos, alerta a IFJ:

“As principais emissoras foram silenciadas ou fechadas; dezenas de sites de notícias foram bloqueados; o uso da palavra ‘invasão’ ou ‘guerra’ foi proibido; e uma nova lei que criminaliza o que as autoridades consideram notícias ou informações ‘falsas’ sobre as forças armadas pode levar jornalistas à prisão por até 15 anos.”

O início da guerra na Ucrânia provocou um verdadeiro êxodo da imprensa nacional e estrangeira da Rússia. The New York Times, CNN, EFE e Bloomberg são algumas das companhias que já retiraram seus profissionais do país, enquanto a mídia independente local foge para nações vizinhas.

Mais de 150 jornalistas russos fugiram do país temendo por sua segurança e liberdade, contabiliza a IFJ. Até agora, a maioria viajou para países vizinhos com entrada isenta de visto para cidadãos russos, como a Turquia, Geórgia e Azerbaijão.

Mas nem todos os refugiados foram aceitos nesses países.

O caso de Mikhail Fishman, jornalista da emissora opositora a Putin Dozhd TV, é um exemplo. Ele acabou detido no aeroporto da Geórgia quando tentou entrar com a família no país.

Outro problema que jornalistas russos que conseguem fugir para os países vizinhos também enfrentam são os ambientes repressivos e pouco seguros para a mídia independente nesses locais.

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Como a repressão contra a imprensa não dá sinais de diminuir na Rússia, a IFJ se uniu à MFRR e demais associações que apoiam o jornalismo profissional e independente para instar países membros da União Europeia a darem abrigo de emergência e isenção de visto para os profissionais de imprensa russos que fogem do país.

O mesmo pedido é feito para os jornalistas bielorrussos que procuram refúgio da guerra e da repressão.

Desde a reeleição de Alexander Lukashenko em agosto de 2020, Belarus viu diminuir a liberdade de imprensa e foi um dos países que mais prendeu jornalistas de forma arbitrária em 2021.

“As prisões em massa e a ameaça de processo criminal levaram a um êxodo de jornalistas bielorrussos, inclusive para a vizinha Ucrânia.

Enquanto os jornalistas ucranianos que fogem da guerra atualmente desfrutam de isenção de visto, seus colegas bielorrussos estão presos e incapazes de buscar segurança dentro das fronteiras da UE.”

Fuga de jornalistas da Rússia coloca em risco mídia independente local

A fuga de jornalistas da Rússia por causa da censura e repressão do governo Putin coloca em risco a própria mídia independente do país, aponta a IFJ.

Por isso, a entidade reforça a necessidade de que nações da União Europeia deem abrigos seguros para jornalistas dissidentes russos se restabelecerem e continuarem trabalhando.

O manifesto assinado por seis entidades defensoras da liberdade de imprensa pede que isenções sejam feitas pelos países membros da UE para fornecer vistos de emergência a jornalistas e suas famílias.

Além do apoio financeiro à mídia ucraniana, os governos da UE devem fornecer financiamento para ajudar as redações russas a se mudarem para um local seguro, diz o texto. 

“A União Europeia já demonstrou notável unidade na sua resposta à invasão da Ucrânia. Embora muito mais precise ser feito, o apoio para ajudar a realocar jornalistas ucranianos que fugiram foi louvável.

É agora necessária uma demonstração semelhante de unidade europeia para ajudar os jornalistas independentes russos e bielorrussos.”

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Jornalista presa e multada por governo é exemplo de censura russa

Exemplo recente e explícito da repressão russa a jornalistas é o caso da editora e produtora Marina Ovsyannikova, da TV estatal Channel One.

Na segunda-feira (14), ela invadiu o estúdio durante a transmissão ao vivo do jornal noturno Vremya, com audiência estimada de 15 milhões de pessoas, com um cartaz condenando a guerra e as mentiras da propaganda estatal.

https://mediatalks.uol.com.br/2022/03/16/conheca-a-jornalista-filha-de-ucraniano-que-desafiou-putin-na-midia-estatal-russa/

Ovsyannikova ficou desaparecida desde o momento de seu ato de protesto até ser vista novamente ao sair de uma instalação policial.

Ela disse a repórteres que passou dois dias sem dormir e foi interrogada por mais de 14 horas, sem advogado ou a oportunidade de entrar em contato com seus entes queridos.

“Foi minha decisão anti-guerra. Tomei essa decisão sozinha porque não concordo com a invasão iniciada pela Rússia”, disse ela em inglês ao sair do tribunal.

A jornalista foi considerada culpada por “organizar um evento público não autorizado” e multada em 30.000 rublos (R$ 1,4 mil).

Segundo especialistas, a jornalista pode enfrentar uma década de prisão por acusações de traição, decorrentes da nova lei de fake news imposta por Vladimir Putin e que acabou determinando a saída da mídia estrangeira e das plataformas digitais do país.

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