Londres – A morte de Luis Enrique Ramírez, nono jornalista assassinado no México este ano, confirma a incapacidade de o país controlar os crimes contra a imprensa, situação que o levou a ocupar a 127ªa posição entre 180 países no ranking de liberdade de imprensa da organização Repórteres Sem Fronteiras em 2022.

O corpo de Ramirez, de 59 anos, foi encontrado na quinta-feira (5) dentro de um saco preto à beira de uma estrada em Culiacán.

A cidade é a capital do estado de Sinaloa, onde opera o cartel de mesmo nome, uma das maiores organizações criminosas do mundo. 

Revolta por mais um jornalista assassinado no México 

Assim como outros profissionais assassinados no México, o jornalista havia fundado e dirigia um site de notícias locais, o Fuentes Fidedignas.

Mas era um profissional conhecido, premiado, com mais de 40 anos de carreira, passagens por grandes jornais mexicanos e colunista de política do El Debate, organização de mídia regional com mais de 300 funcionários. 

O desaparecimento de Ramirez, capturado perto de casa na cidade de Culiacán, havia sido notificado ao Gabinete do Procurador-Geral de Sinaloa, segundo reportagens da imprensa mexicana. 

Depois que a morte foi confirmada, a Procuradoria Geral do Estado, Sara Bruna Quiñónez, disse “não descartar nenhuma linha de investigação”, como relatou Fuentes Fidedignas.

E assegurou que as investigações serão feitas “mesmo que isso signifique chamar atores da vida política do Estado”.

As organizações de defesa da liberdade de imprensa internacionais, como o Centro de Proteção a Jornalistas (CPJ), voltaram a criticar fortemente a impunidade e insegurança para a mídia no México, cobrando apuração.

O novo assassinato coloca o presidente do país, Andres Manuel Lopéz Obrador, em situação ainda mais difícil diante de críticas locais e notícias nos principais veículos de imprensa do mundo, afetando a imagem do país.

Assim como em outros assassinatos de jornalistas no México, o porta-voz do chefe do governo condenou o ato, prometeu proteção aos jornalistas e garantiu que não haverá impunidade. 

Mas a repetição dos casos mostra que essas promessas não estão sendo cumpridas. Segundo um relatório da organização de liberdade de imprensa Artigo 19 publicado em abril,  34 jornalistas foram mortos durante o mandato de López Obrador. 

No Índice Mundial de Liberdade de Imprensa da Repórteres Sem Fronteiras, o México aparece na zona classificada como “difícil, figurando como o 6º país em que o jornalismo segue mais ameaçado.

A posição deve-se principalmente à falta de garantias para a imprensa exercer seu trabalho livremente. No indicador Segurança, o país ficou no penúltimo lugar geral entre os 180 analisados.

O contexto político também foi fortemente criticado. Na avaliação da RSF, o presidente López Obrador e outros funcionários do governo adotaram uma retórica combativa e estigmatizante contra a imprensa, acusando frequentemente os jornalistas de promoverem a agenda da oposição. 

“Nos três anos de seu governo, o presidente criticou os jornalistas por sua falta de profissionalismo e descreveu a imprensa mexicana como tendenciosa, injusta e a escória do jornalismo.”

Para Emmanuel Colombié, diretor da organização para a América Latina, a retórica antimídia por parte de governos como o do México configura uma ameaça real à liberdade de imprensa no continente, ao alimentar a hostilidade generalizada contra profissionais de imprensa, refletida nas redes sociais. 

“Vivemos uma desconsideração geral e global do papel da imprensa. É necessário lutar contra a banalização desse discurso de ódio, que é inaceitável e perigoso”. 

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Intimidação e agressões a jornalistas independentes 

Embora fosse colunista do El Debate, jornal que faz parte de um grupo de mídia tradicional, Luiz Enrique Ramirez dizia ter fundado o Fuentes Fidedignas, inicialmente como um blog, para “expor a verdade, sem meias medidas […] sem cair na típica chantagem de muitos meios de comunicação que questionam ou aplaudem o poder na medida em que se dobra aos seus interesses”, como informa a apresentação do site.

A ideia é nobre, mas como mostra a sequência de jornalistas assassinados no México, não agrada a todos. E vira alto risco quando é praticada na cidade de um dos maiores cartéis de drogas do mundo. 

A maioria dos profissionais de imprensa mortos no México trabalhava em veículos pequenos ou mantinha seu próprio canal de notícias, denunciando crimes e atos de administrações locais que não entram no radar dos grandes jornais nacionais. 

O mesmo aconteceu no Brasil, com o cearense Givanildo Oliveira, assassinado em fevereiro na periferia de Fortaleza. Ele era dono de um canal que falava dos problemas de sua comunidade. 

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Crimes como esses têm o potencial de silenciar outros jornalistas e veículos pequenos que não queiram correr riscos semelhantes. 

No México, o crime mais recente antes da morte de Ramirez  foi o de Armando Linares, diretor e editor do site mexicano Monitor Michoacán.

Ele foi morto a tiros no dia 15 de março em frente à sua casa na cidade de Zitacuaro, apenas 43 dias após denunciar a morte de um colega do mesmo veículo em um vídeo. 

Com a morte de Linares, o número de jornalistas assassinados no México em 2022 superou o total de 2021, quando sete perderam a vida. E agora já são nove. 

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