Londres – Em um paiฬs com histoฬria marcada por discriminacฬงaฬo e tensoฬes raciais como os EUA, a resposta de um editor de uma TV ao jovem repoฬrter que o questionou sobre o motivo de naฬo ter sido escalado para a cobertura de um furacaฬo eฬ emblemaฬtica: โSeu cabelo naฬo voa com o vento.โ
O episoฬdio, ocorrido na deฬcada de 70, foi contado no livro de memoฬrias do jornalista Bruce Johnson, publicado em marcฬงo.
Ele eฬ um dos que desbravou a selva racista do jornalismo americano, tornando-se um dos mais bem pagos e premiados profissionais de imprensa do paiฬs. Morreu pouco depois de publicar o livro, de cรขncer, aos 71 anos.
Ausรชncia de diversidade racial no jornalismo
Em Surviving Deep Waters (Sobrevivendo em aฬguas profundas), Jonhson relata sua batalha contra a discriminacฬงaฬo pela cor da pele e por sua origem.
Um editor certa vez o provocou questionando por que ele naฬo falava ingleฬs, em alusaฬo ao seu sotaque sulista. O tempo esquentou, mas a paz acabou selada pelo diretor geral da emissora WUSA9, onde ele fez carreira.
No entanto, o jornalista conta jamais ter recebido um pedido de desculpas, coisa que naฬo fazia parte do repertoฬrio de chefes ou de empresas, jornaliฬsticas ou naฬo. Afinal, qual o problema com uma simples brincadeira, para quem naฬo eฬ o alvo dela?
EUA avanรงam e Brasil fica estacionado em diversidade racial nas chefias de jornalismo
Situacฬงoฬes como as vividas por Bruce Johnson saฬo improvaฬveis hoje em dia. E nos EUA, movimentos como Black Lives Matter e #MeToo parecem ter impulsionado mudancฬงas no jornalismo em compasso mais acelerado do que em outros paiฬses.
O Instituto Reuters faz desde 2020 um acompanhamento da proporcฬงaฬo de profissionais naฬo brancos no comando das redacฬงoฬes principais em cinco mercados, um deles o Brasil.
O estudo leva em conta o cargo principal (com nomenclaturas variadas) nas dez maiores organizacฬงoฬes de miฬdia online e dez offline, segundo dados do Digital News Report.
Veja o estudo completo do Instituto Reuters aqui.
A terminologia naฬo branco eฬ usada para englobar outros grupos, como hispaฬnicos.
Na edicฬงaฬo de 2022, os EUA saltaram de 18% para 33%, como resultado da nomeacฬงaฬo de mais treฬs naฬo brancos para liderar grandes redacฬงoฬes em 2021. Dentre os paiฬses pesquisados, a Aฬfrica do Sul eฬ o paiฬs onde haฬ mais naฬo brancos no comando: 73% contra 60% haฬ um ano.
Jaฬ no Brasil, apesar de um tercฬงo dos profissionais de imprensa naฬo serem brancos, nenhum deles chegou ao topo de uma das 20 maiores redacฬงoฬes do paiฬs. O mesmo ocorre no Reino Unido e na Alemanha.
Os pesquisadores chamam a atencฬงaฬo para a disparidade em relacฬงaฬo aฬ populacฬงaฬo. No Brasil, apontam que mais da metade da populaรงรฃo se declara nรฃo branca.
Mesmo na Aฬfrica do Sul a disparidade existe. O paiฬs tem 92% da populacฬงaฬo negra e 73% de editores naฬo brancos.
O levantamento do Instituto Reuters confirma que a inclusaฬo no comando do jornalismo, aumentando a diversidade no seleto grupo de profissionais que decidem linha editorial e editam o noticiaฬrio, naฬo eฬ um sonho impossiฬvel. Os EUA estaฬo provando.
Mas o jogo naฬo estaฬ ganho ainda, na opiniaฬo do jornalista Bruce Johnson. Em seu livro, ele faz um alerta:
โAs vitoฬrias obtidas ano passado e certamente com os movimentos de direitos civis do final dos anos 1960 e 70 naฬo podem ser tomadas como garantia de que tudo estaฬ resolvido.
Apesar do meu sucesso, sinto que se naฬo formos cautelosos e o progresso naฬo for recalibrado, a histoฬria poderaฬ se repetir.โ
Esta matรฉria faz parte do Especial MediaTalks Diversidade na Mรญdia.ย Leia a ediรงรฃo completaย aquiย