Plataformas de mídias sociais venceram duas importantes batalhas judiciais, ainda que preliminares, contra leis dos Estados Unidos que querem impedir big techs de removerem conteúdos de “opinião”, mesmo que ofensivos.

A Suprema Corte dos Estados Unidos barrou na terça-feira (31) uma lei do Texas apoiada por republicanos que já tinha sido suspensa no fim do ano passado, mas voltou a vigorar em maio no estado com apoio do governador Greg Abbott. A decisão da Corte suspende a lei até que se decida sobre a validade do texto.

Na semana passada, um projeto semelhante apresentado na Flórida foi considerado inconstitucional por um tribunal de apelações — uma vitória para as empresas de redes sociais acusadas de “discriminar o pensamento conservador” por apoiadores do ex-presidente Donald Trump.

Leis querem impedir ‘censura’ de republicanos em mídias sociais

Ambos projetos de leis do Texas e da Flórida têm como objetivo proibir plataformas de mídias sociais de bloquearem ou banirem usuários com base em publicações que emitam “pontos de vista” — mesmo que isso viole os termos de uso das redes, como discurso de ódio, teorias conspiratórias e fake news.

No ano passado, o governador do Texas, Greg Abbott, promulgou a lei sob a justificativa de era necessário frear a autonomia das big techs sobre quais conteúdos e usuários elas removem de sua base, acusando-as de censurarem de forma deliberada conservadores e republicanos do país.

Por 5 votos a 4, no entanto, a Suprema Corte decidiu suspender a legislação até que sejam aprofundadas discussões sobre sua constitucionalidade.

A votação desta semana não analisou a legalidade do projeto, atendendo apenas a um pedido apresentado por dois grupos que representam as empresas de redes sociais, como Twitter, Facebook e YouTube.

Em maio, o 5º Tribunal de Apelações dos EUA reestabeleceu a lei no estado e, em reação, os grupos representantes das plataformas — a Associação da Indústria de Computadores e Comunicações (CCIA) e a NetChoice — acionaram a instância máxima do Judiciário norte-americano para proteger as big techs.

Leia mais

Lei polêmica que proíbe redes sociais de banirem usuários por ‘pontos de vista’ volta a valer no Texas

Regulamentação redes sociais Lei Texas Trump

“Nenhuma plataforma online, site ou jornal deve ser instruído por funcionários do governo a veicular determinado discurso”, disse o presidente da Associação da Indústria de Computadores e Comunicações (CCIA), Matt Schruers, após a decisão da Suprema Corte. “Este tem sido um princípio fundamental da nossa democracia por mais de 200 anos.”

Na ação apresentada pela NetChoice e CCIA à Suprema Corte, as empresas de tecnologia classificaram a lei do Texas como “um ataque sem precedentes à discrição editorial de sites privados (como Facebook.com , Instagram.com , Pinterest.com , Twitter.com , Vimeo.com e YouTube.com ) que fundamentalmente transformar seus modelos de negócios e serviços”.

Para as empresas, a proposta do estado traz “sérios problemas” à Primeira Emenda americana, que resguarda a liberdade de expressão e de imprensa, pois quer “regular um fenômeno global” representados pelas redes sociais e ataques/publicações ofensivas que ocorrem nelas.

No documento para a Corte, as empresas ainda argumentam que a lei texana é “inconstitucional” e com riscos de causar “danos irreparáveis” à internet e às próprias redes sociais.

“Enquanto o Judiciário analisa cautelosamente essas questões importantes, as plataformas não devem ser compelidas pelo governo a disseminar o discurso mais vil imaginável – como manifestos de supremacia branca, discursos nazistas, propaganda do estado russo, negação do Holocausto e recrutamento de organizações terroristas.”

Leia também

Procuradora de NY abre investigação sobre papel das redes sociais no ataque de Buffalo

Letitia James Procuradora Nova York ataque Buffalo redes sociais investigação

Republicanos se defendem de objeções das plataformas no Texas

O procurador-geral do Texas, o republicano Ken Paxton, se defendeu das objeções das plataformas de mídias sociais sobre a lei estadual ferir a Primeira Emenda. Segundo ele, o projeto tem como foco apenas a conduta das empresas.

Paxton alegou que, por serem os “descendentes do século XXI das empresas de telégrafo e telefone”, as big techs devem ser tratadas como “trafegadoras comuns”, que estão sujeitas à regulamentação do governo devido à natureza essencial dos serviços que oferecem aos americanos.

Além do procurador-geral, a legislação do Texas tem o apoio de outros políticos republicanos, que acusam redes sociais de terem um “viés anticonservador”, e de praticarem censura. As empresas negam veemente essas alegações.

A maior vítima desse viés seria Donald Trump, que foi excluído das redes principais por postagens incitando os invasores do Capitólio, em janeiro passado.

Outros políticos associados a ele também já perderam suas contas ou foram suspensos temporariamente. 

Leia também

Trump de volta, demissões, ‘projeto X’: o que Elon Musk planeja para o Twitter

Elon Musk dono do Twitter

Por se aplicar a empresas com mais de 50 milhões de usuários ativos por mês nos EUA, a regulamentação é feita sob medida para as big techs. E exige que as plataformas prestem contas sobre qualquer conteúdo ilegal ou potencialmente violador de políticas. 

O texto também prevê a criação de um sistema para reclamações, pelo qual cidadãos podem contestar as decisões de remoção de conteúdo que considerarem injustas.

No Texas e em outros estados que apresentaram legislação semelhante, as empresas de tecnologia se uniram para pressionar contra a aprovação dos textos.

As empresas defendem que leis desse tipo podem “diminuir seus esforços para remover conteúdo censurável”, como o terrorismo e violência, por exemplo.

Para o governador do Texas e os demais republicanos que elaboraram a lei, ela, na verdade, impedirá que “pontos de vista conservadores” sejam banidos das mídias sociais.

Na Flórida, lei para mídias sociais é considerada inconstitucional

Semelhante à do Texas, a lei da Flórida para as redes sociais também tinha a proposta de penalizar as big techs por remoção de conteúdos e usuários por suas “opiniões”, ainda que contrárias às políticas de uso das plataformas.

Por unanimidade, o 11º Tribunal de Apelações dos EUA, com sede em Atlanta, decidiu em 23 de maio que grande parte do texto estadual violava a Primeira Emenda, logo, era inconstitucional.

Em uma justificativa detalhada de 67 páginas , os três juízes – todos indicados por presidentes republicanos – rejeitaram a maioria dos argumentos legais que os estados conservadores vêm usando para embasar as leis de mídias sociais. O parecer foi escrito pelo juiz Kevin Newsom, nomeado do ex-presidente Donald Trump.

Na decisão, o tribunal concluiu que foi um “exagero” do governador da Flórida, o republicano Ron DeSantis, e seus pares estaduais em “dizer às empresas de mídia social como conduzir seu trabalho sob a garantia de liberdade de expressão da Constituição”: 

“Simplificando, com pequenas exceções, o governo não pode dizer a uma pessoa ou entidade privada o que dizer ou como dizer.

Acreditamos que é substancialmente provável que as empresas de mídia social – mesmo as maiores – sejam atores privados cujos direitos a Primeira Emenda protege”.

O entendimento do tribunal foi celebrado pelos grupos comerciais que representam as big techs e também por entidades defensoras da liberdade de imprensa, como a Repórteres sem Fronteiras (RSF). 

Essa lei teria impedido que empresas de mídia social como o Facebook e Twitter banissem políticos e, portanto, limitaria seriamente a capacidade das plataformas de remover contas que espalham desinformação e desinformação”, disse a RSF.

“Embora concordemos que as plataformas que moldam e estruturam o domínio online devem ser mais transparentes e respeitar os princípios democráticos, estamos preocupados com a tendência de estados como Flórida e Texas se moverem para proteger propagadores de desinformação em vez de enfrentar o problema do caos da informação.”

A CCIA afirmou que a decisão na Flórida representa uma vitória para os usuários da internet e a liberdade de expressão em geral – especialmente no que se refere a conteúdo potencialmente ofensivo.

“Quando um serviço digital age contra conteúdo problemático em seu próprio site – seja extremismo, propaganda russa ou racismo e abuso – está exercendo seu próprio direito à liberdade de expressão.”

Leia também

Doomscrolling: por que somos atraídos por notícias ruins e 5 formas de evitar o ‘efeito deprê’