Londres – Mesmo tendo suspendido as operações em março, o jornal Novaya Gazeta, fundado e dirigido pelo jornalista russo ganhador do Nobel da Paz, Dmitry Muratov, foi novamente multado por reportagens anteriores à interrupção, em mais um capítulo da sequência de atos de repressão por parte do governo de Vladimir Putin. 

O Tribunal Distrital Simonovsky de Moscou multou na quarta-feira (10) a publicação em em 350 mil rublos (R$ 28,5 mil) sob o dispositivo de ‘disseminação de informações deliberadamente falsas’ do Código de Ofensas Administrativas ), segundo a organização de defesa dos direitos humanos OVD-Info.

Em 6 de julho, o Novaya Gazeta tinha sido multado em 300 mil rublos sob o mesmo artigo por causa de um vídeo sobre a guerra na Ucrânia postado em fevereiro. Na ocasião, o argumento foi “ameaça à ordem pública”. 

Repressão do governo Putin começou em março 

Desta vez, o motivo alegado para justificar a multa foi uma reportagem publicada em março que continha uma entrevista de uma testemunha da ocupação russa na cidade ucraniana de Kherson.

A matéria foi apagada do site por determinação da agência reguladora de imprensa da Rússia, afirmou a porta-voz do órgão, Nadezhda Prusenkova.

A saga do Novaya Gazeta para continuar informando sobre questões que incomodam o regime de Vladmir Putin, como já fazia há quase 30 anos, vem sendo uma batalha difícil. 

Em 28 de março, o jornal suspendeu as publicações impressas e a atualização do site depois de receber uma segunda notificação do órgão regulador de mídia. Isso poderia custar a licença para funcionar. 

Dias depois, Dmitry Muratov sofreu um atentado quando viajava de trem, supostamente praticado por agentes da inteligência russa. Ele foi atingido com tinta vermelha e teve queimaduras. Nenhum suspeito foi apontado. 

Jornalistas da equipe de Muratov que saíram da Rússia montaram uma versão do Novaya Gazeta na Europa, com ajuda de um fundo da organização Repórteres Sem Fronteiras. Mas o site foi bloqueado em território russo. 

Uma outra tentativa de quebrar a censura também durou pouco. Em julho, integrantes do Novaya Gazeta que ficaram na Rússia criaram uma revista impressa e online, a NO.  

No entanto, em uma semana o site da publicação também foi bloqueado. 

Esta semana, outra tentativa foi anunciada. A equipe está criando uma espécie de agregador de notícias chamado Espaço Livre, permitindo aos leitores assinarem para ler conteúdos de outras publicações e do próprio jornal, além de oferecer acesso ao YouTube e Telegram. 

Dmitry Muratov não está oficialmente à frente de nenhuma das iniciativas de sua equipe, o que pode ter o objetivo de reduzir as pressões contra os novos projetos.

Mas ainda assim, e embora o Novaya Gazeta tenha suspendido a atualização do site para não perder a licença, o governo de Vladimir Putin segue determinado a exterminar o jornal que tornou o jornalista um símbolo de luta contra a repressão à imprensa independente no mundo. 

Além das multas, a Rússia tenta judicialmente cassar o registro da publicação, o que significaria o fim de uma história reconhecida. O processo é baseado em supostas violações de caráter burocrático datadas de 2006. 

O jornal foi criado em 1993 por Muratov e por um grupo de ex-profissionais do Komsomolskaya Pravda.

Os primeiros computadores foram comprados com a ajuda do ex-líder Mikhail Gorbachev, que usou o dinheiro de seu Prêmio Nobel da Paz de 1990 para ajudar o Novaya Gazeta. 

O fundador do jornal também destinou seu Nobel para causas sociais. O valor em dinheiro recebido em novembro de 2021 foi doado a entidades que cuidam de crianças na Rússia. 

E em junho, Muratov leiloou a medalha do prêmio e doou o valor integral ao Unicef, para ajudar refugiados da guerra na Ucrânia.