Londres – Faltando ainda duas semanas para o fim do ano, a Federação Internacional de Jornalistas (IFJ) confirmou 2022 como um dos piores anos para a segurança de profissionais de imprensa da história, com 67 mortos durante coberturas ou em crimes relacionados ao trabalho em 21 países. 

Foi uma reversão do declínio visto nos últimos anos. Em 2021, a Federação contabilizou 47 perdas. Houve ainda este ano oito mortes classificadas como acidentais. 

O Brasil tem dois assassinatos na lista: o do inglês radicado no país Dom Philips, morto na Amazônia em junho, e a do cearense Givanildo Oliveira, atingido por tiros na periferia de Fortaleza em fevereiro. 

Mais jornalistas mortos nas Américas

Fundada em 1926, a IFJ tem sede em Bruxelas e representa 600 mil profissionais de mídia por meio de 187 sindicatos e associações em mais de 14o países. No Brasil, é representada pela Fenaj (Federação Nacional de Jornalistas).

O levantamento anual da organização revela que apesar da guerra na Ucrânia e de conflitos na Ásia, como no Iêmen e no Afeganistão, as Américas ocuparam este ano o posto de região mais mortífera para o jornalismo. Foram 29 perdas – mais de duas por mês. 

No México, segundo a IFJ, aconteceram 11 mortes. Já a Unesco contabiliza 19. Os números variam entre as organizações devido a critérios diferentes, como a confirmação por autoridades de que o crime foi relacionado à profissão. 

Duas mortes na Tanzânia foram consideradas acidentais pela IFJ mas aparecem na lista de vítimas de crimes da Unesco. 

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Ucrânia foi país com mais jornalistas mortos

Apenas a Ucrânia registrou mais jornalistas e profissionais de apoio da mídia mortos em seu território em 2022, a maioria estrangeiros cobrindo a invasão pela Rússia. 

Segundo a Federação, “o domínio do terror das organizações criminosas no México e o colapso da lei e da ordem no Haiti também contribuíram para o aumento dos assassinatos, com 11 e 6 documentados, respectivamente”.

A Colômbia também é destacada no relatório: 

“Jornalistas na Colômbia enfrentam violência renovada, ameaçando tornar o país uma zona de matança para jornalistas e profissionais da mídia mais uma vez e destruindo as perspectivas de liberdade de imprensa após o acordo político para encerrar décadas de sangrenta guerra civil.”

Das dezesseis mortes na Ásia-Pacífico, seis aconteceram do Paquistão, duas na Índia, três em Bangladesh, quatro nas Filipinas e uma em Mianmar.

A lista anual relata uma diminuição em relação 2021 na região. O Afeganistão, anteriormente a nação mais mortal da Ásia-Pacífico para profissionais da mídia, experimentou uma queda dramática de dez mortes em 2021 para zero em 2022.

Já no Paquistão a situação se inverteu, com ataques contínuos no contexto da crise política, resultando em seis mortes.

Os jornalistas Muhammad Younis, Zia-Ur-Rehman Farooqi, Hasnain Shah e Iftikhar Ahmed foram vítimas de violência armada, enquanto o jornalista do Canal 5 Sadaf Naeem foi esmagado sob um contêiner enquanto cobria um comício político em Lahore em 1º de novembro.

Nem no exterior os profissionais estão a salvo. Depois de fugir do Paquistão devido a ameaças legais, o veterano jornalista Arshad Sharif foi morto por oficiais da Unidade de Serviços Gerais do Quênia em 23 de outubro. Um relatório recente de uma equipe de investigação paquistanesa concluiu que sua morte foi um assassinato direcionado, supostamente envolvendo indivíduos transnacionais . 

E o novo governo das Filipinas “não deu trégua aos ataques mortais contra jornalistas”, com quatro mortos no primeiro ano da presidência de Ferdinand “Bongbong” Romualdez Marcos Jr. 

O Oriente Médio e o mundo árabe viram os assassinatos de profissionais da mídia aumentarem de três para cinco no ano passado, incluindo o tiroteio em plena luz do dia da veterana jornalista da Al Jazeera Shireen Abu Akleh, na Palestina.

Ela cobria uma operação do exército de Israel e foi atingida por soldados, mesmo trajando identificação de imprensa.

A família e a emissora continuam pressionando Israel para que haja identificação e punição dos que atiraram na jornalista.

No dia 6 de outubro, a emissora protocolou outra reclamação na Corte Criminal Internacional (ICC, na sigla em inglês) com base em um relatório independente. 

Quatro jornalistas foram mortos no Chade e na Somália, levando a África a registrar o menor número de mortes entre as cinco regiões da lista da IFJ, atrás das Américas (29), Ásia-Pacífico (16), Europa (13) e Oriente Médio e Mundo Árabe (5).

“O aumento nos assassinatos de jornalistas e outros profissionais de mídia é um grave motivo de preocupação e mais um alerta para que os governos de todo o mundo tomem medidas em defesa do jornalismo, um dos principais pilares da democracia”, disse o Secretário-Geral da IFJ, Anthony Bellanger.

“A omissão em agir encoraja os que buscam suprimir o livre fluxo de informações e minar a capacidade das pessoas de responsabilizar seus líderes, inclusive para garantir que aqueles com poder e influência não se interponham no caminho de uma sociedade aberta e inclusiva”. 

A IFJ voltou a cobrar da comunidade internacional ações concretas para proteger a segurança e a liberdade de jornalistas. Uma delas é aprovação pela Assembleia Geral da ONU de uma Convenção proposta pela entidade sobre segurança e independência.

Jornalistas presos 

A lista da FIJ também mostra como a repressão política durante 2022 na China, Bielorrúsia, Egito, Hong Kong, Irã, Mianmar, Turquia e Rússia resultaram em atos para silenciar a mídia e esmagar os protestos pela liberdade.

Os jornalistas estão entre as primeiras vítimas da repressão, com pelo menos 375 profissionais da mídia atualmente atrás das grades, um novo recorde desde dois anos atrás, quando a FIJ começou a publicar listas de jornalistas presos para marcar o Dia Internacional dos Direitos Humanos.

China e Hong Kong encabeçam a lista, totalizando 84 jornalistas presos, seguidos por Mianmar (64), Turquia (51), Irã (34), Bielo-Rússia (33), Egito (23), Rússia e Crimeia ocupada (29), Arábia Saudita (11), Iêmen (10), Síria (9) e Índia (7).

“Esses números são uma leitura sombria e lançam sérias dúvidas sobre a vontade política por parte dos governos de lidar com ameaças tão graves à liberdade de imprensa”, lamentou Bellanger, criticando as “declarações grandiosas” sobre direitos humanos e liberdade de imprensa feitas por muitos governos e alardeadas em conferências internacionais.

“Tais compromissos soam vazios para aqueles que definham nas prisões sem acusações nem qualquer base legal para sua prisão. É hora de a comunidade internacional agir para garantir que todos os jornalistas detidos ilegalmente sejam libertados”.

A lista completa de jornalistas mortos a serviço ou em crimes relacionados ao trabalho pode ser vista aqui.