Londres – “Sharenting” Ć© uma das palavras adicionadas ao dicionĆ”rio Oxford em 2022, descrevendo a prĆ”tica dos pais que compartilham (share, em inglĆŖs) fotos, vĆdeos e informaƧƵes sobre os filhos nas redes sociais – mas especialistas alertam para os riscos dessa prĆ”tica Ć primeira vista inocente.
Pesquisa recente mostrou que mais de 40% dos pais do Reino Unido colocam fotos ou vĆdeos de seus filhos online. No Brasil, o compartilhamento tambĆ©m Ć© comum, embora nĆ£o haja dados precisos. Mas basta ver os perfis de parentes e amigos para encontrar lĆ” imagens de pequenos que nem sabem ainda o que Ć© uma rede social.
Um dos principais riscos Ć© a violaĆ§Ć£o da privacidade das crianƧas, jĆ” que elas tĆŖm as vidas expostas sem o seu consentimento. Fora da bolha virtual, compartilhar informaƧƵes detalhadas sobre os filhos tambĆ©m podem colocĆ”-los na mira de pedĆ³filos, segundo pesquisadores.
Pais se sentem pressionados a postar sobre filhos nas redes sociais
Pais compartilham a vida de seus filhos na internet por muitas razƵes, segundo a professora de Direito Claire Bessanta, da Northumbria University Newcastle.
Em artigo publicado na plataforma de divulgaĆ§Ć£o cientĆfica The Conversation, ela explica que entre os motivos estĆ£o o orgulho que sentem das crianƧas e, por isso, querem contar Ć famĆlia e amigos sobre os marcos e a vida diĆ”ria dos pequenos; buscar apoio e aconselhar outros pais; e para guardar memĆ³rias.
“TambĆ©m pode ser uma fonte de renda. Os influenciadores podem ganhar quantias substanciais com parcerias com marcas ao compartilhar suas vidas familiares online”, lembrou a professora.
Mas as decisƵes sobre se, onde e quanto compartilhar representam um dilema para muitos pais. “Alguns podem sentir que nĆ£o tĆŖm escolha real. Cada vez mais eles sĆ£o incentivados a compartilhar por terceiros. Isso inclui famĆlia, amigos, escolas, comunidade, imprensa e as grandes marcas”, disse Bessanta.
Pesquisas ainda sĆ£o necessĆ”rias para entender exatamente como o compartilhamento afeta as crianƧas e sua privacidade, mas jĆ” Ć© fato que existem riscos no excesso de exposiĆ§Ć£o da vida de crianƧas online.
AlƩm de ficarem vulnerƔveis a predadores, a professora explicou que Ʃ fƔcil para terceiros obter fotos, nomes e datas de nascimento de crianƧas por meio de postagens dos pais no Facebook e no Instagram.
Essas informaƧƵes sĆ£o cruzadas com outras fontes online e offline para criar perfis detalhados e falsos usando os dados nas redes sociais.
“Os novos pais que pensam em publicar um anĆŗncio de nascimento nas redes sociais devem ter em mente que compartilhar essas informaƧƵes pode expor seus filhos ao risco de fraude de identidade.”
Vale lembrar que muitas plataformas de redes sociais, como Facebook e TikTok, por exemplo, coletam e compartilham informaƧƵes entre si.
“As informaƧƵes compartilhadas podem ser coletadas por outras empresas, que monetizam essas informaƧƵes, perfilando crianƧas e suas famĆlias, usando seus interesses e gostos para direcionar o marketing”, afirmou Bessanta.
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Como proteger os dados dos filhos nas redes sociais
Existem maneiras de tornar o compartilhamento sobre os filhos nas redes sociais mais seguro, segundo a professora.
Um deles Ć© a desativar o GPS no aplicativo da cĆ¢mera do smartphone para que os dados de localizaĆ§Ć£o nĆ£o sejam anexados Ć s fotos. Outra opĆ§Ć£o Ć© revisar as configuraƧƵes de privacidade nas plataformas e limitar quem pode ver as postagens.
No Instagram, por exemplo, por padrĆ£o, as contas de adultos sĆ£o definidas como pĆŗblicas. Ć necessĆ”rio colocar a conta como privada para que as informaƧƵes estejam disponĆveis apenas para os seguidores.
Mas nĆ£o sĆ£o sĆ³ os pais que compartilham as informaƧƵes dos filhos online. Familiares, amigos e atĆ© as escolas costumam fazer publicaƧƵes pĆŗblicas com informaƧƵes de crianƧas.
A especialista recomenda conversar com as instituiƧƵes, a famĆlia e as pessoas mais prĆ³ximas sobre como as informaƧƵes dos filhos devem ser compartilhadas — e, se possĆvel, isso deve ser feito antes mesmo do nascimento do bebĆŖ.
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TambĆ©m vale a pena pensar no impacto que as postagens podem ter no futuro. “BebĆŖs e crianƧas pequenas nĆ£o podem dizer o que pensam sobre suas postagens ā entĆ£o, como responsĆ”vel pela privacidade, vocĆŖ precisa considerar como suas publicaƧƵes podem afetĆ”-los”, afirma Bessanta.
Segundo ela, ao compartilhar as informaƧƵes de filhos nas redes sociais, estƔ se criando uma identidade digital que o acompanharƔ por toda a vida.
“Considere se seu filho vai querer que amigos ou futuros empregadores vejam as informaƧƵes que vocĆŖ compartilhou dele quando bebĆŖ.
Quando os adolescentes comeƧam a desenvolver sua prĆ³pria identidade, eles podem se tornar particularmente preocupados com sua privacidade e como a maneira como sĆ£o retratados online pode afetar suas amizades e relacionamentos.”
Por isso, a recomendaĆ§Ć£o Ć© evitar postar informaƧƵes que sejam excessivamente reveladoras ou privadas, ou que possam perturbar ou constranger as crianƧas no futuro, como birras e imagens de nudez, por exemplo.
Algumas pesquisas jĆ” foram realizadas para investigar o que os jovens pensam sobre o compartilhamento feito por seus pais na internet.
Enquanto algumas crianƧas acham que isso pode ser positivo, desde que sejam retratados em em uma imagem ou identidade online positiva, outras dizem que o excesso de exposiĆ§Ć£o da prĆ³pria vida por terceiros pode causar constrangimento e ansiedade. E muitos querem que seus pais peƧam permissĆ£o antes de postar.
“Mesmo quem nĆ£o achava que o sharenting tivesse um impacto negativo sobre eles disse que isso pode significar ‘um tipo diferente de crescimento’ e nĆ£o Ć© algo que eles fariam como pais.”
Para evitar conflitos desse tipo, a professora aconselha que pais peƧam a opiniĆ£o dos filhos que tĆŖm idade suficiente para expressĆ”-la sobre como eles se sentem com a publicaĆ§Ć£o deles nas redes sociais.
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