Londres – O uso da tecnologia de inteligĂȘncia artificial (IA) para geração de imagens e textos, visto por muitos com desconfiança, começa a chegar aos tribunais.
A Getty Images anunciou na terça-feira (17) que entrou com um processo no Supremo Tribunal de Justiça em Londres contra a empresa Stability AI, sob o argumento de infração de propriedade intelectual,” incluindo direitos autorais em conteĂșdo de propriedade ou representado pela Getty Images”.
Nos EUA, o escritĂłrio jurĂdico Joseph Saveri entrou na semana passada com uma ação coletiva em nome de um grupo de demandantes que buscam compensação por danos causados ââpela Stability AI, pela DeviantArt (uma rede social que permite compartilhamento de trabalhos artĂsticos em forma digital) e pelo Midjourney, um sistema de criação de imagens grĂĄficas.
Geração de imagens com inteligĂȘncia artificial a partir de palavras
A Stability AI é a dona da ferramenta de arte AI Stable Diffusion, que permite criar imagens a partir de palavras. Em outubro do ano passado, a empresa levantou US$ 101 milhÔes em uma rodada de financiamento e foi avaliada em US$ 1 bilhão.
O argumento da Getty Images Ă© que a Stability AI copiou e processou ilegalmente milhĂ”es de imagens protegidas por direitos autorais e os metadados associados a elas sem licença, “para beneficiar os prĂłprios interesses comerciais e em detrimento dos criadores de conteĂșdo”.
Ao anunciar o processo, a Getty disse acreditar que a inteligĂȘncia artificial tem o potencial de estimular empreendimentos criativos, e que por isso forneceu licenças aos principais inovadores de tecnologia para fins relacionados ao treinamento de sistemas de inteligĂȘncia artificial de maneira a respeitar os direitos de propriedade pessoal e intelectual.
No entanto, diz a empresa, a Stability AI nĂŁo pediu nem negociou licença de uso, “optando por ignorar opçÔes de licenciamento viĂĄveis ââe proteçÔes legais de longa data em busca de seus interesses comerciais autĂŽnomos”.
JĂĄ a ação dos EUA Ă© mais ampla, colocando em questĂŁo os limites da criação de conteĂșdo usando referĂȘncias protegidas por direitos autorais.
O processo alega violação direta de direitos autorais, violação indireta de direitos autorais relacionada a falsificaçÔes, violaçÔes da Lei de Direitos Autorais do MilĂȘnio Digital (DMCA), violação dos direitos de publicidade dos representados, violação de contrato relacionado aos Termos de Serviço do DeviantArt e vĂĄrias violaçÔes da lei concorrĂȘncia desleal da CalifĂłrnia.
A petição inicial afirma que o Stable Diffusion, um produto de inteligĂȘncia artificial usado pela Stability AI, DeviantArt e Midjourney em seus produtos de imagem IA, foi treinado em bilhĂ”es de imagens protegidas por direitos autorais baixadas e usadas sem compensação ou consentimento dos artistas.
Em um comunicado sobre a ação coletiva, o escritório apontou riscos para os artistas:
“Se o Stable Diffusion e produtos similares puderem continuar a operar como agora, o resultado previsĂvel Ă© que eles substituirĂŁo os prĂłprios artistas cujas obras roubadas alimentam esses produtos de IA com os quais estĂŁo competindo.
Os produtos de imagem AI nĂŁo sĂŁo apenas uma violação dos direitos dos artistas; independentemente de terem ou nĂŁo essa intenção. Eles eliminarĂŁo o “artista” como uma carreira viĂĄvel.
AlĂ©m de obter reparação pela conduta ilĂcita, este processo visa evitar esse resultado e garantir que esses produtos sigam as mesmas regras de qualquer outra nova tecnologia que envolva o uso de grandes quantidades de propriedade intelectual. Se o streaming de mĂșsica pode ser realizado dentro da lei, os produtos de IA tambĂ©m podem.”
“Como as tecnologias emergentes continua a mudar todos os aspectos do mundo moderno, Ă© fundamental que reconheçamos e protejamos os direitos dos artistas contra roubo e fraude ilegais”, disse Joseph Saveri.
O programador e advogado Mathew Butterick, um dos autores da causa, defende Ă©tica e justiça no uso da InteligĂȘncia Artificial.
“Stability AI, Midjourney e DeviantArt estĂŁo se apropriando do trabalho de milhares de artistas sem consentimento, sem crĂ©dito e sem compensação. Como advogado que tambĂ©m Ă© membro de longa data da comunidade de artes visuais, Ă© um prazer defender em nome de outros artistas e continuar esta conversa essencial sobre como nĂłs, as pessoas, queremos que a IA coexista com a cultura e a criatividade humanas.”
Livro provoca debate
Fora dos tribunais, a controvĂ©rsia sobre o uso de inteligĂȘncia artificial para criação de conteĂșdo segue colocando em campos opostos os que a defendem e os que temem seus efeitos sobre o trabalho dos criadores ou sobre questĂ”es Ă©ticas, como a desinformação, jĂĄ que os recursos tornam mais fĂĄcil produzir imagens inexistentes a fim de enganar.
O gerente de design de produtos Ammaa Reshi, dos EUA, lançou em dezembro pela Amazon um livro infantil, Alice and Sparkle, que diz ter feito em 72 horas usando os recurso ChatGPT (que cria textos) e Midjourney, para as imagens.
I spent the weekend playing with ChatGPT, MidJourney, and other AI tools⊠and by combining all of them, published a childrenâs book co-written and illustrated by AI!
Hereâs how! 𧔠pic.twitter.com/0UjG2dxH7Q
— Ammaar Reshi (@ammaar) December 9, 2022
Mas recebeu uma avalanche de crĂticas de criadores pelas redes sociais e pela imprensa. Em entrevistas, ele disse ter ficado chocado com a reação.
O livro chegou a ser retirado da Amazon, mas continua Ă venda. Nos crĂ©ditos, o livro Ă© descrito como “por Ammaar Reshi”, e em seguida aparecem os nomes do ChatGPT como ‘autor’ e MidJourney como ‘ilustrador’.
O resumo da histĂłria Ă© sugestivo:
“A menina Alice cria sua prĂłpria IA, chamada Sparkle, e juntas elas embarcam em aventuras e usam seus conhecimentos combinados para tornar o mundo um lugar melhor.
A histĂłria explora as incrĂveis habilidades da IA ââe a importĂąncia de usĂĄ-las para o bem.”
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