Londres – Parecia uma boa notícia, mas a anistia concedida pelo governo do Irã a 12 jornalistas que estavam presos ou aguardando julgamento acabou se revelando uma medida inócua, pois todos tiveram que assinar compromissos que restringem sua atuação profissional e os coloca em risco permanente.

O alerta foi feito pela organização Repórteres Sem Fronteiras, que recriminou as condições estabelecidas para devolver a liberdade aos profissionais, muitos deles com prisões associadas aos protestos pela morte da jovem curda Mahsa Amini.

A Repórteres Sem Fronteiras (RSF) considera esses perdões uma nova forma de suprimir a liberdade de imprensa no Irã tentando dar a impressão de clemência.

“Nada mudou”, disse Jonathan Dagher, chefe do departamento de Oriente Médio da RSF.

“Esses perdões condicionais nada mais são do que uma ilusão de clemência, confirmando que as autoridades iranianas não afrouxaram de forma alguma sua política de perseguição sistemática.”

Desde que Amini foi detida por usar o véu islâmico de forma errada, segundo a polícia, e morreu sob custódia, mais de 60 jornalistas foram presos no Irã.

O país tem um histórico de conceder perdões em massa em datas especiais, como o aniversário da revolução Islâmica, em 11 de fevereiro.

Este ano teriam sido liberados “dezenas de milhares” de prisioneiros, alguns acusados de crimes relacionados aos protestos. 

Irã usa anistia a jornalistas como recurso político

Nove dos profissionais perdoados na anistia estavam na cadeia quando souberam da notícia e outros três estavam em liberdade condicional enquanto aguardavam julgamento. 

A RSF diz que Hojjat al-Islam Rahimi, vice-chefe do judiciário do Irã, impôs condições aos indultos concedidos àqueles presos por conta dos protestos contra a morte de Mahsa Amini.

Ele disse que só haveria perdão se os repórteres “exprimissem remorso por suas ações passadas e se comprometessem a não repeti-las no futuro”, sob ameaça de sofrerem uma punição mais severa se quebrassem esse compromisso.

Jornalistas perdoados

A situação jurídica dos jornalistas indultados, segundo a RSF, varia. Milad Alavi, do jornal diário Shargh, estava respondendo em liberdade, após ficar 15 dias preso em janeiro.

Ele confirmou no Twitter que foi obrigado a assinar um compromisso de não participar de “distúrbios” ou “manifestações ilegais”, sob pena de ser punido com mais severidade no futuro.

Os freelancers Kianoosh Sanjari e Saba Shardoost também aguardavam julgamento em liberdade e tiveram seus nomes incluídos na lista de perdoados.

Em outros casos, os profissionais já estavam condenados e cumprindo pena, segundo o levantamento da Repórteres Sem Fronteiras. 

Ehsan Pirbornash , ex-editor da revista esportiva Bank Varzesh , condenado a 18 meses de prisão em 10 de janeiro, foi libertado em 8 de fevereiro .

Masoud Kurdpour , editor da agência de notícias Mukrian , foi libertado da prisão de Bukan em 14 de fevereiro, depois de cumprir apenas três meses de sua sentença de 17 meses.

Três outros jornalistas que foram presos nos últimos três meses – os freelancers Mehdi Soufali e Hossein Yazdi e a fotógrafa da Agência de Notícias Estudantis do Irã, Aria Jafari – foram perdoados e libertados, mas não ficou claro se foram obrigados a assinar compromissos ou declarações de remorso, observou a organização. 

Segundo reportagem do jornal Shargh , o processo de assinatura de depoimentos é arbitrário e varia de acordo com a região, presídio e situação pessoal do jornalista.  

E em alguns casos, as declarações incluíram uma admissão implícita das acusações feitas contra o detido.

Depois que Shargh publicou a reportagem, as autoridades negaram que quaisquer promessas tenham sido assinadas, contradizendo declarações anteriores, afirmou a RSF. 

No entanto, foi constatado que os três jornalistas indultados que foram presos em 16 de setembro de 2022, antes do início dos protestos de Mahsa Amini, não precisaram assinar nenhum compromisso.

Uma carta conjunta de cinco mulheres detidas que receberam indultos – incluindo Noushin Jafari , fotógrafa da Etemad detido desde fevereiro de 2021, e Alieh Motalebzadeh , fotógrafa do Zanan detida desde outubro de 2020 – disse:

“A solidariedade demonstrada pelo povo e pelos jovens amantes da liberdade no Irã é a principal razão para a libertação de muitos presos políticos nos últimos dias”. 

Amirabbas Azaramvand, repórter de negócios do jornal diário Samt, cumprindo pena de quatro anos e três meses de prisão desde março de 2022, também está entre os perdoados. 

Dos 28 jornalistas atualmente detidos no Irã, oito já estavam presos antes do início dos protestos. Um deles é Narges Mohammad, homenageado com o prêmio Coragem da RSF em 2022. 

Atualmente o quinto maior carcereiro de jornalistas do mundo, o Irã está classificado em 178º lugar entre 180 países no Índice Mundial de Liberdade de Imprensa de 2022 da RSF .

Em janeiro, o Comitê de Proteção a Jornalistas denunciou que profissionais de imprensa estavam recebendo penas acima do que prevê a lei, incluindo trabalhos forçados.