Londres – Uma conferência promovida pela Unesco em Genebra reuniu mais de 4,3 participantes de diversos países e áreas de atuação interessados em encontrar solução para um dos maiores problemas da sociedade contemporânea, que a organização classifica como crise de informação online: a proliferação de desinformação e discurso de ódio na internet.
Entre os participantes estavam o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o influenciador Felipe Neto e a jornalista vencedora do Prêmio Nobel da Paz de 2021, Maria Ressa, que virou símbolo de perseguição online em seu país, as Filipinas.
A Unesco defende diretrizes globais comuns para melhorar a confiabilidade das informações e proteger os direitos humanos, alertando para o risco de iniciativas individuais nos países fracassarem se não seguirem uma linha coletiva.
Desinformação na internet floresceu com redes sociais
“O embaçamento das fronteiras entre o verdadeiro e o falso, a negação altamente organizada dos fatos científicos, a amplificação da desinformação e das conspirações – tudo isso não se originou nas redes sociais. Mas, na ausência de regulamentação, eles florescem muito melhor do que a verdade”, alertou Audrey Azoulay, secretária-geral da entidade.
“Apenas avaliando ao máximo esta revolução tecnológica podemos garantir que ela não sacrifique os direitos humanos, a liberdade de expressão e a democracia.
Para que a informação continue sendo um bem comum, devemos refletir e agir agora, juntos.”
Participaram da conferência Internet for Trust, que terminou no dia 22 de fevereiro, representantes das várias partes interessadas no debate sobre desinformação na internet, como governos, reguladores independentes, empresas de mídia digital, academia e sociedade civil.
Os debates servirão para fundamentar as primeiras diretrizes globais para a regulamentação das mídias sociais, a serem lançadas pela Unesco em setembro de 2023.
“As mentiras se espalham mais rápido que os fatos. Por alguma razão, os fatos são realmente chatos. Mentiras – especialmente quando misturadas com medo, com raiva, com ódio, com tribalismo – nós contra eles. Eles se espalharam. É como jogar um fósforo aceso em gravetos”, disse a jornalista ganhadora do Prêmio Nobel da Paz, Maria Ressa, em seu discurso.
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Ela advertiu que, se continuarmos a “tolerar algoritmos de mídia social que recompensam mentiras”, as gerações futuras herdarão um mundo em que a verdade foi perigosamente desvalorizada:
“Sem fatos não se pode ter verdade, sem verdade não se pode ter confiança e não temos realidade compartilhada”.
Em sua mensagem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, relembrou os violentos ataques às instituições democráticas no Brasil em 8 de janeiro.
“O que aconteceu naquele dia foi o ápice de uma campanha iniciada muito antes, e que usou mentiras e a desinformação como munição”, disse.
“Em grande parte, essa campanha foi alimentada, organizada e divulgada por meio de plataformas digitais e aplicativos de mensagens.
Este é o mesmo método usado para gerar atos de violência em outras partes do mundo. Isso tem que parar”.
Regulação coordenada
A diretora-geral da Unesco destacou o avanço de iniciativas regulatórias – pelo menos 55 países estão trabalhando nelas, segundo a organização.
Mas ela defendeu uma abordagem coerente e global, baseada nos direitos humanos.
“Se essas iniciativas regulatórias forem desenvolvidas isoladamente, com cada país trabalhando em seu canto, elas estão fadadas ao fracasso.
A interrupção da informação é, por definição, um problema global, então nossas reflexões devem ocorrer em escala global”.
“As discussões, como as que estamos tendo agora em Paris, são imensamente importantes”, explicou a primeira-ministra islandesa Katrín Jakobsdóttir. “É importante descobrir um conjunto comum de diretrizes sobre como regular esse espaço digital. A tecnologia não pode ser mal utilizada para reprimir as pessoas, para vigiar ou assediar, ou para desligar a internet.”
O influenciador do YouTube Felipe Neto compartilhou suas próprias experiências com conteúdo extremista impulsionado por algoritmos, como um dos criadores de conteúdo com mais inscritos do mundo.
“É claro que não queremos fechar as plataformas – não queremos combatê-las.
Estamos falando sobre responsabilidade, sobre acabar com a impunidade, trazê-los para a mesa e dizer ‘você precisa ser responsável pelos erros que cometeu e que vai cometer.”
Durante o encontro, a Repórteres Sem Fronteiras apresentou um novo relatório com recomendações para a regulamentação das redes sociais, voltadas para governos e plataformas.
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