Londres – O Brasil manteve a posição de país da América Latina mais bem colocado na edição 2023 do ranking de soft power, divulgado nesta quarta-feira (2) em Londres pela consultoria Brand Finance – mas recuou três posições, passando de 28º para 31º na lista de 121 nações analisadas.
Mesmo marcando 2,4 pontos a mais do que em 2022, o Brasil deixou de integrar o grupo dos 30 países que mais influenciam os demais sem uso de armas ou poder econômico, que é o conceito de soft power.
A posição brasileira em 2022 havia sido a melhor desde que o ranking passou a ser feito.
A liderança no Global Soft Power Index continuou com os EUA, que em 2021 haviam perdido o posto para a Alemanha. Este ano, melhoraram ainda mais o resultado em relação a 2022, marcando 74,8 pontos.
O novo estudo da consultoria britânica consolida o resultado de pesquisas de opinião entre mais de 100 mil pessoas em 100 países, sem distinção entre público geral e audiências especializadas (políticos, acadêmicos, jornalistas) como nos anos anteriores.
“Apesar de um pequeno aumento em sua pontuação de soft power de 43,4 para 46,2, o resultado do Brasil indica que outros países estão tendo o valor de suas marcas reconhecido em uma velocidade maior para a geração de negócios, turismo e relações internacionais”, avalia Eduardo Chaves, diretor da Brand Finance para o Brasil.
Na elaboração do ranking, as “marcas nacionais” são classificadas com base em 35 atributos agrupados em oito pilares. Os três principais são Familiaridade (pessoas que sabem algo sobre o país), Reputação e Influência.
Entre os 35 atributos, o Brasil lidera em Esportes e Diversão, mas aparece mal colocado aos olhos do mundo em aspectos importantes como diplomacia e comércio exterior, incluindo governança, padrões éticos, corrupção, estabilidade política e segurança.
Os principais países no ranking de soft power
Os EUA, que lideram o ranking, conquistaram o primeiro lugar em 12 dos 35 atributos e estão entre os três primeiros em outros quatro, conquistando a melhor performance entre todas as marcas nacionais analisadas no ranking.
Com o fortalecimento do dólar e projetos de investimento de grande escala amplamente divulgados pelo governo federal, as percepções sobre a economia dos EUA são favoráveis, segundo a Brand Finance, salientando que o país tomou da China o primeiro lugar no atributo Negócios e Comércio.
O país está está em primeiro lugar em doze e entre os 3 primeiros em quatro categorias, conquistando 16 medalhas de soft power – mais do que qualquer outra marca nacional no Índice.
No entanto, problemas crescentes com tiroteios, crimes com armas de fogo e violência policial continuam a corroer a percepção do país como “seguro e protegido” (caiu de 21º em 2020 para 62º este ano) e de seu povo como “amigável” (caiu de 5º em 2020 a 103º este ano).
Único país a perder pontos este ano, a Rússia foi a grande derrotada, saindo do bloco dos 10 principais em soft power para ocupar o 13º lugar.
Já a Ucrânia ganhou 10,1 pontos (mais do que qualquer outro país), saltando 14 posições e figurando em 37º na lista. A popularidade do presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenskyy fez com que a nação subisse 36 posições na avaliação de países com “líderes internacionalmente admirados”, indo para o 12º lugar.
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Reino Unido e Alemanha mantiveram respectivamente o segundo e o terceiro lugares no ranking de soft power, com ganhos de pontos em relação a 2022.
A China cedeu o quarto lugar para o Japão e ficou em quinto.
Em seguida aparecem França, Canadá e Suíça, ocupando as mesmas posições de 2022. Itália e Emirados Árabes Unidos passaram a integrar o bloco dos 10 mais fortes em soft power.
Paul Temporal, professor da Said Business School da Universidade de Oxford, observou que apesar das controvérsias em torno do país árabe, a Expo 2020 Dubai, a escolha para sediar a COP 28 e a Copa do Mundo no Catar contribuíram para melhorar a percepção de familiaridade, reputação e influência.
Na América Latina, o país mais forte em soft power depois do Brasil é a Argentina, em 42º lugar.
Depois aparecem México (44º), Chile (54º) Colômbia (58º), Cuba (66º), Paraguai (75º), Peru (76º), Bolívia (82º), Equador (90º), Honduras (104º), Venezuela (106º) e Guatemala (12oº, penúltimo lugar na lista.
Na lanterna do ranking de 121 países está o Zimbabue.
Brasil: covid-19 e política afetaram soft power
Na análise sobre o desempenho do Brasil no índice anual de soft power, a Brand Finance destaca os anos difíceis enfrentados pelo país devido à alta incidência de covid-9 e situação política tumultuada, citando a invasão dos prédios dos Três Poderes na posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
“O ambiente político volátil do Brasil ganhou cobertura da imprensa mundial e claramente afetou sua posição em soft power”, diz o relatório.
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O Brasil pontuou significativamente abaixo da média global no pilar Governança, caindo 28 posições e figurando em 86º lugar globalmente.
O pais teve baixa pontuação em “altos padrões éticos e baixa corrupção” (115º), “lugar seguro e protegido” (108º) , “nação politicamente estável e bem governada” (88º).
Atributos tradicionalmente associados ao Brasil, no entanto, não foram afetados.
O índice de familiaridade é alto, com a 12ª melhor pontuação do ranking de 121 nações, posição inalterada desde 2021.
Eduardo Chaves associa o resultado às dimensões do país.
“Devido ao seu tamanho, o Brasil tem mais facilidade de alavancar a familiaridade do que países menores, mas ainda há potencial para melhorar a marca Brasil no exterior.
O logotipo do país passou por uma reformulação em 2018 e depois foi revertido para o design anterior. Essas mudanças em pouco tempo, possivelmente por pressão política, podem reduzir a eficácia dos esforços de comunicação do Brasil.
Ainda assim, Brasil, México e Argentina são as únicas marcas latino-americanas entre as 30 primeiras no índice de familiaridade.”
No “quadro de medalhas” dos 35 atributos que compõem a percepção de soft power, o Brasil lidera em dois, mas não está entre os três primeiros em nenhum outro.
O país é visto como mais divertido do que qualquer outra nação e líder em Esportes.
No pilar Influência, a marca Brasil caiu para o 26º lugar, perdendo sete posições desde a avaliação de 2022, resultado associado pela Brand Finance ao foco nas eleições presidenciais e política interna.
Embora a pontuação do índice de influência da marca Brasil tenha aumentado em 0,1 pontos, outros países tiveram melhor desempenho, levando ao declínio da posição relativa no ranking.
No atributo Negócios e Comércio, o Brasil caiu nove posições, para a 38ª colocação.
A exposição a notícias positivas ou negativas molda a imagem de um país, afetando sua familiaridade, observa Chaves, e o Brasil sofreu em 2022:
O país foi noticiado de forma predominantemente negativa no ano passado, com más notícias sobre a gestão da saúde pública durante a pandemia, violações de direitos humanos, desmatamento da Amazônia e questões de política externa.”
Isolamento do mundo
No atributo Governança, embora a pontuação tenha sido ligeiramente superior à de 2022 (+ 0,7 pontos), a Brand Finance avalia que o país ainda tem um longo caminho a percorrer para alcançar
as primeiras posições.
“O governo do Brasil assumiu uma postura política severa, resultando em um país cada vez mais fechado em anos recentes.
Isso levou a problemas nas relações internacionais, falta de flexibilidade nas negociações e isolamento do mundo.”
No quesito Relações Internacionais, a marca Brasil caiu 10 posições, passando para 41ª no ranking deste ano.
O pilar em que a marca Brasil é mais forte diante da opinião pública global, incluindo público geral e audiências especializadas, é Cultura e Patrimônio, mantendo a 9ª posição na avaliação de 2022.
Já no pilar Pessoas e Valores, o país migrou da 19ª para a 25ª posição, perdendo seis posições, apesar de ter crescido 0,7 pontos.
Outras marcas-país têm apresentado crescimento ainda maior nessa dimensão, resultando na queda relativa do Brasil, explica o relatório.
Em Comunicação, a marca Brasil também sofreu internacionalmente, descendo 17 degraus na escala para ocupar o 43º lugar.
A Brand Finance atribui essa percepção negativa ao ” conflito contínuo entre o governo e a mídia, juntamente com o aumento de notícias falsas”.
No entanto, a consultoria destaca a existência de uma indústria de mídia livre e independente como aspecto positivo.
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Em Educação e Ciência, o Brasil também não figurou bem, passando de 35º para 73º no ranking de soft power em 2023, movimento explicado pela Brand Finance:
“Embora o Brasil tenha um grande potencial para iniciativas de educação, houve falta de investimento nessa área no último ano.
Apesar de ter a melhor universidade da América Latina, a Universidade de São Paulo, a educação no Brasil continua concentrada em uma pequena parcela da população.
Incentivos governamentais são necessários para melhorar a educação básica no país e apoiar o desenvolvimento do Brasil.”
No pilar Sustentabilidade, a marca Brasil ocupa a 55ª posição, com 4,3 pontos.
Os países do topo do ranking alcançaram 7 pontos, deixando o Brasil com espaço significativo para melhorias nesta categoria.
O que é soft power
O soft power, conceito criado na década de 90, representa a capacidade de cada país de influenciar os demais por meio da atração ou persuasão em vez da força.
O primeiro a formulá-lo foi Joseph Nye, em 1990. Ele argumentou existir um método alternativo de política externa para as nações ganharem o apoio de outras.
Essa alternativa é baseada em reputação e valores, em vez do método tradicional de coerção baseada na força militar ou econômica.
Isso ocorre porque as nações, como os humanos, são mais propensos a confiar e colaborar com aquelas com quem compartilham ideais comuns.
O Soft Power Global Index O Global Soft Power Index incorpora uma ampla gama de medidas que, combinadas, fornecem uma avaliação equilibrada da presença, reputação e impacto das nações no cenário mundial.
Um total de 121 marcas nacionais, como os países são denominados no estudo, foram incluídas na pesquisa, incluindo o Zimbábue pela primeira vez.
As principais nações cujas reputações globais são de maior interesse para usuários e assinantes do Índice (por exemplo, China, EUA, Brasil) foram priorizados como ‘Nível 1’ (veja o mapa). Esses 32 países de Nível 1 têm tamanhos de amostra maiores classificando-os.
Uma pesquisa online foi realizada entre uma amostra de 111.364 adultos de 18 a 75 anos, em 101 países. Assim, a amostra
é representativa da população online de cada país, segundo a consultoria.
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