Londres – A ideia de Elon Musk de mandar enviar uma resposta automática com emoji de cocô a jornalistas que pedem informações sobre o Twitter pode ter vindo em boa hora para evitar explicações sobre problemas fresquinhos na plataforma comprada por ele por US$ 44 bilhões há menos de seis meses. 

Um deles é justamente o valor de mercado, que segundo o próprio Musk, não passaria agora de US$ 20 milhões, conforme um documento interno enviado pelo próprio empresário aos funcionários e obtido pelo New York Times. 

Outro é o vazamento de parte do código-fonte da plataforma no site para desenvolvedores GitHub, de propriedade da Microsoft, que pode colocar em risco a segurança dos usuários.

O terceiro é a notícia de que uma queixa por antissemitismo no Twitter aberta na Austrália recebeu sinal-verde para seguir adiante. Embora a queixa tenha sido protocolada antes da aquisição, a notícia reforça a ideia de que o relaxamento de políticas de moderação representa risco social, e que o Twitter não está agindo à altura para evitar propagação de discurso de ódio. 

Comprado por US$ 44 bilhões, Twitter agora vale menos da metade 

A avaliação negativa do valor de mercado do Twitter não foi feita por nenhum analista financeiro, mas pelo próprio dono da plataforma comprada por US$ 44 milhões depois de uma briga de meses com a diretoria executiva. 

Musk chegou a tentar voltar atrás na compra, sob a alegação de que os números de usuários fornecidos como parte da negociação continham um número superior de contas falsas do que o estimado.

Mas pressionado e sob risco de ser obrigado a efetivar a aquisição por decisão judicial, antecipou-se e concretizou o negócio – e começou a onda de demissões e mudanças que muitos creditam como responsáveis pelos problemas enfrentados atualmente. 

Em um email enviado à equipe, Elon Musk admitiu que o Twitter vale agora menos de US$ 20 bilhões, uma queda brutal frente aos US$ 44 milhões que valia há seis meses. 

O email, revelado pelos sites de tecnologia Plataforma e Information, era relativo ao processo de participação nos lucros por meio de ações da companhia. 

O dono do Twitter destacou que o Twitter chegou a ficar com caixa suficiente para funcionar durante apenas quatro meses. 

E justificou as “mudanças radicais”, como demissões, como forma de evitar a falência. Uma delas foi a venda de itens da sede principal do Twitter, em São Francisco.

Musk afirma na carta que o Twitter agora pode ser considerado “uma start-up ao contrário”.

A queda de valor está associada a movimentos arriscados do próprio Musk, que deterioraram a confiança e afastaram anunciantes. 

Uma das mais controvertidas foi o selo de verificação. Ele era gratuito para organizações e pessoas públicas, a fim de evitar contas criadas por impostores.

Musk implantou a assinatura paga logo que fez a compra do Twitter e enfrentou problemas, como uma avalanche de contas falsas criadas por quem pagou para ter o selo. Depois relançou a venda, supostamente com novos mecanismos de proteção. 

Agora, ele anunciou que a partir de 1º de abril os que detinham a marca antes da aquisição a perderão – o que alguns sites chegaram a especular que pode ser uma brincadeira para o Dia da Mentira. 

Mas aparentemente não é. Nesta segunda-feira (27) Musk respondeu ao ator canadense William Shatner, que questionou a medida, afirmando que trata-se de uma questão de igualdade, e que celebridades não deveriam ter padrões diferentes. 

Código-fonte vazado: foi alguém do Twitter?

O vazamento de partes do código-fonte do Twitter de certa forma antecipou uma promessa que o próprio Elon Musk fez – mas não como ele planejava. 

No início de março, ele tuitou dizendo planejar tornar pública a parte da programação que define como os tweets são recomendados.  

Ele acrescentou: 

“Nosso ‘algoritmo’ é excessivamente complexo e não totalmente compreendido internamente. As pessoas descobrirão muitas coisas bobas, mas corrigiremos os problemas assim que forem encontrados!

Estamos desenvolvendo uma abordagem simplificada para servir tweets mais atraentes, mas ainda é um trabalho em andamento. Isso também será de código aberto.

“Fornecer transparência de código será incrivelmente embaraçoso no início, mas deve levar a uma melhoria rápida na qualidade da recomendação. Mais importante ainda, esperamos ganhar sua confiança.”

Antes que o dono do Twitter, que investiu US$ 44 bilhões na empresa, pudesse revelar um dos principais segredos das plataformas digitais, alguém correu antes e fez isso por ele, usando o site GitHub como canal. 

A história emergiu na sexta-feira (24), revelada pelo New York Times. O jornal publicou a notícia de um pedido feito pelo Twitter ao Tribunal Distrital dos EUA do Distrito Norte da Califórnia para ordenar ao Github que apresente “todas as informações de identificação” associadas ao usuário chamado ‘FreeSpeechEnthusiast’.

O nome da conta parece uma brincadeira com o próprio Musk, que ao decidir comprar o Twitter, justificou como uma de suas motivações o desejo de que a plataforma se visse livre das amarras da moderação – o que ele efetivamente fez depois da compra. 

O código-fonte foi retirado pelo GitHub no mesmo dia, mas Musk quer mais: descobrir o autor da brincadeira e possivelmente adotar medidas legais contra quem estiver por trás do vazamento. 

Nos documentos judiciais o Twitter informou que foram publicados “vários trechos” do código-fonte, a programação que determina as funções de um site. Segundo o New York Times, uma investigação interna também foi aberta. 

Embora já tenham sido removidos, os trechos vazados do código-fonte do Twitter podem afetar o valor de mercado da companhia, fazendo-o se distanciar ainda mais dos US$ 44 bilhões pagos por Musk.

Problemas de segurança como vulnerabilidade a hackers são fatores que influenciam a valorização de companhias de tecnologia e mídias sociais. 

Na Austrália, moderação do Twitter em questão 

O aumento de discurso de ódio é outro problema para o Twitter, e não apenas diante das organizações governamentais. Ele foi o motivo para afastar algumas companhias da plataforma, afetando as receitas de publicidade. 

Um problema nessa seara está à vista na Austrália.

No sábado (25), a edição australiana do The Guardian informou que a tentativa do Twitter de engavetar uma queixa apresentada à Comissão de Direitos Humanos de Queensland pela ONG Australian Muslim Advocacy Network (Aman) foi rejeitada. 

A queixa é importante porque pode definir o entendimento de responsabilidade do Twitter e de outras plataformas pelo conteúdo postado por usuários. 

Essa é a reclamação da organização, que aponta a rede social como responsável por uma conta de extrema direita  citada no manifesto do extremista que matou 77 pessoas na Noruega em 2011.  O Twitter se recusou a apagar a conta, que tem postagens como a de que o Alcorão deveria ser chamado de “manual do terrorismo”.

A acusação é baseada na  Lei Anti-Discriminação de Queensland. O Twitter teria “incitar o ódio como editor de contas de terceiros”, e praticado discriminação ao se recusar a agir contra conteúdo de ódio. 

Em 2021, o Tribunal Superior da Austrália definiu em um processo judicial que veículos de comunicação do país tornaram-se responsáveis pelos comentários de leitores em reportagens publicadas nas redes sociais e em seus próprios sites. 

Elon Musk não comentou sobre nenhum dos problemas novos. Tentativas de obter a posição oficial da empresa por meio do canal de comunicação com a imprensa receberam de volta o emoji de cocô. 

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