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Prisões, mortes, agressões: relatório documenta violações da liberdade de imprensa no Sul da Ásia

No Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, Federação Internacional de Jornalistas publicou um relatório denunciando violações no Su da Ásia, que envolve países como Nepal, Índia e Bangladesh

Jornalistas do Nepal em manifestação no Dia Mundial da Liberdade de Imprensa (foto: divulgação IFJ via Twitter)

O Sul da Ásia não é um território fácil para o jornalismo, como foi demonstrado em um novo relatório lançado pela Federação Internacional de Jornalistas no Dia Mundial da Liberdade de Imprensa

Entre 2021 e 2022, a Federação Internacional dos Jornalistas (IFJ, na sigla em inglês) registrou 257 violações graves em uma região que inclui nações conhecidas pelo desrespeito à liberdade de imprensa e de expressão: Afeganistão, Bangladesh, Butão, Índia, Maldivas, Nepal, Paquistão e Sri Lanka. 

 Foram 13 assassinatos de profissionais de imprensa, pelo menos 76  deles presos ou detidos, e mais de 163 agredidos, intimidados e assediados, muitas vezes por agentes da lei, segundo o estudo. 

Falta liberdade de imprensa no Sul da Ásia

Os dados fazem parte da publicação “Relatório de Liberdade de Imprensa do Sul da Ásia da IFJ para 2022-2023 Pressão e Polarização: Fortalecendo a Resistência da Mídia no Sul da Ásia”.

O relatório aborda a interface entre o poder e os direitos humanos fundamentais da liberdade de imprensa e liberdade de expressão nos oito países da Sul da Ásia entre 1º de maio de 2022 a 30 de abril de 2023.

Os resultados estão alinhados ao relatório Global Press Freedom Index, publicado pela organização Repórteres Sem Fronteiras no mesmo dia. 

O documento aponta a Ásia como a região mais perigosa para a imprensa. O Brasil ficou em 92º lugar entre 180 nações. 

Dos 76 jornalistas presos ou detidos listados no documento da Federação Internacional de Jornalistas sobre a Ásia, pelo menos 10 deles permaneciam atrás das grades no Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. 

Além dos dados alarmantes acerca da liberdade de imprensa nessa parte da Ásia, o relatório “destaca os impactos da crescente polarização política e social, da disrupção digital e das consequências da pandemia na indústria de mídia da região”.

Em 2023″, diz o texto, “o sul da Ásia viu muitas ameaças graves à liberdade de imprensa e às instituições democráticas, com abusos do governo, violência e prisões prejudicando o cenário da mídia da região.”

Apesar disso, jornalistas corajosos continuam a se manifestar contra a polarização para dizer a verdade, iluminar e defender as liberdades fundamentais duramente conquistadas.

Como exemplos das ameaças ao jornalismo da região estão os casos dos profissionais afegãos exilados no Paquistão e as medidas extraordinárias que as autoridades adotaram para restringir a liberdade de expressão durante recentes eleições da região.

De acordo com a IFJ, eixos de opressão de gênero e religiosos, entre outros, estão sempre presentes nas estatísticas de violência, abuso e assédio judicial no sul asiático.

Desafios para a imprensa: do global ao local

Além dos problemas mais imediatos na região, o texto da FIJ mostra “como as organizações e plataformas de mídia em evolução estão explorando novos modelos para construir sustentabilidade” em meio ao contexto global de colapso da mídia tradicional e demissões em massa de jornalistas.

Segundo a organização, a mídia do sul da Ásia está trabalhando duro para fortalecer a confiança do público e reafirmar o papel vital que desempenha como pilar dessas democracias, apesar dos desafios. 

Novas legislações trabalhistas, ações sindicais e jornalismo independente de alta qualidade permanecem, apesar dos ataques à profissão, com alianças e colaborações novas e emergentes abordando questões como condições de trabalho e de gênero.

Problemas variam de país a país 

Cada país apresentou problemas singulares.

No Afeganistão, 49,6% dos veículos de mídia pararam de operar após o retorno do Talibã.  

Uma pesquisa mostrou que 95% de um total de 600 jornalistas questionados declararam que o direito ao acesso à informação está sob forte pressão. 

Quanto à questão do gênero, as jornalistas afegãs passaram a ser obrigadas a cobrir seus rostos na televisão após um decreto oficial. 

No atual contexto do país, pelo menos 200 profissionais se refugiaram no Paquistão e outros 100 no Irã. 

Em Bangladesh, o governo bloqueou 191 portais de notícias por “propagar conteúdo errôneo contra o estado”.

Nessa nação, um “Ato de Segurança Digital” está em vigor desde 2018. Das 3565 pessoas acusadas pelo mecanismo até janeiro deste ano, 9,2% são jornalistas e, desses, 60% sob a acusação de “ferir sentimentos religiosos”, aponta a IFJ. 

No Butão, o estudo aponta salários baixos, ambiente de trabalho ruim e dificuldade de informação como fatores que influenciam jornalistas a buscar outras carreiras ou deixar a profissão por oportunidades no exterior.

Ainda que o clima seja menos inóspito que no Afeganistão e em Bangladesh, as liberdades jornalísticas dos butaneses são restritas a ponto de não poderem entrevistar ou tirar fotos dos membros de seu Parlamento. 

Na Índia, profissionais do jornalismo online e de iniciativas independentes no YouTube se sentem mais vulneráveis em relação aos que trabalham nas mídias tradicionais. O clima é de “insegurança e assédio crescentes”, segundo o relatório.

Desde 2021, agências governamentais indianas de checagem de fatos podem derrubar conteúdos que considerem como fake news. 

Nas Maldivas, são as influências políticas que ameaçam a liberdade de imprensa.

Nesse país do Sul da Ásia, a falta de leis específicas para crimes cibernéticos também impacta o ambiente, marcado por insegurança.

No Nepal, os principais desafios se deram durante o período eleitoral. O ex-vice primeiro-ministro Rabi Lamichhane criou uma “imparável narrativa contra a mídia” após ser objeto de matérias.

Os jornalistas foram objetos de interpelações online: 88,6% das jornalistas mulheres foram atacadas via web, com 62,3% desses ataques ocorrendo no Facebook Messenger.

No Paquistão, a crise política causou grandes impactos na liberdade de imprensa digital. De todos os ataques online no Sul da Ásia, 41% aconteceram nesse país. 

Segundo a FIJ, o governo paquistanês foi inoperante em fazer valer o “Ato de Proteção de Jornalistas e Profissionais de Mídia”, de 2021.

Como resultado,  56% das jornalistas do país sofreram com campanhas de desinformação. 

No Sri Lanka, o clima não é melhor. Não apenas a política, mas a economia também impactou o jornalismo feito no território.

Jornalistas que cobriram os protestos contra o governo entre os meses de abril e julho de 2022 sofreram agressões policiais. 

Além disso, tal como na Índia, profissionais da mídia independente e canais do YouTube também sofrem com “crescentes ameaças, intimidações e agressões”.

O texto geral do relatório da IFJ pode ser lido, em inglês, aqui.

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