Londres – Em junho, o príncipe Harry deve se tornar o primeiro integrante da monarquia britânica a depor em um tribunal desde o século 19, como parte de sua incansável batalha contra a imprensa sensacionalista britânica – e contra sua própria família, que supostamente teria alimentado os tabloides com notícias desfavoráveis sobre ele. 

O duque de Sussex prestará depoimento na causa movida contra a MGM, editora que publica o Daily Mirror, Daily Express e Daily Star. A editora é acusada de hackear conversas telefônicas e de contratar detetives para espionar famosos. 

Desde terça-feira (9), quando o julgamento começou, revelações feitas pelo advogado de Harry estão respingando em Piers Morgan, um dos jornalistas mais conhecidos do país. Ele era editor do Mirror quando as práticas ilegais ocorreram. 

Sobrou até para o rei Charles, cujo secretário particular em 2002, Mark Bolland, era amigo de Morgan. Bolland foi apontado durante o julgamento como o responsável pelo vazamento de algumas das histórias sobre Harry ao jornalista.

Essa, porém, caso não é a única frente de batalha de Harry contra a mídia.

Em seu livro Spare e na série Harry e Meghan, da Netflix, o príncipe e a mulher disparam contra a imprensa sensacionalista, nem sempre deixando claro que o foco é o segmento de tabloides, o que acaba contribuindo para uma má percepção sobre a imprensa de forma geral. 

É uma luta épica. Os únicos grupos de jornais britânicos que Harry ou Meghan não processaram ou não estão processando são os que editam o The Guardian, o Financial Times e o Daily Telegraph. 

Embora em algumas queixas os jornais tentem desqualificar os processos sob o argumento de que o prazo legal para reclamações já passou, as práticas dos tabloides estão sendo expostas como nunca antes.

E como eles já pagaram indenizações vultosas no passado por tais práticas, não têm como negar que elas existiram, ainda que tentem usar o prazo legal ou afirmar que não as usaram contra Harry. 

Entenda a seguir os processos que Harry e Meghan já moveram contra a imprensa – com algumas vitórias – e as quatro que estão em curso.

Harry x MGM (Daily Mirror, Daily Star e Daily Express)

O MGM é uma divisão do Reach, um dos maiores grupos de mídia britânicos. Os acusadores alegam que as informações sobre eles foram coletadas de forma ilegal entre 1996 e 2011.

Hackers ligavam para os números telefônicos de celebridades, desvendavam a senha de acesso à secretária eletrônica e assim ouviam todas as mensagens gravadas.

O Mirror já fez acordos com famosos por causa dessa prática, que admitiu ter utilizado. Agora, se defende argumentando que o prazo para reclamações já havia se esgotado quando o novo processo foi aberto, em 2019. 

Junto com Harry no mesmo processo estão o ator Michael Turner, da série Coronation Street; Fiona Wightman, ex-esposa do comediante Paul Whitehouse; a cantora Cheryl, o jogador de futebol e apresentador de TV Ian Wright e o espólio do falecido cantor George Michael. 

A maioria das queixas de Harry está relacionada a seus relacionamentos com as ex-namoradas Chelsy Davy, Cressida Bonas, Laura Gerard-Leigh e Natalie Pinkham – incluindo detalhes de seus sentimentos em relação a elas, seus planos e conversas.

Davy teria terminado o relacionamento de cinco anos por causa da invasão de privacidade. 

Nesta semana, no primeiro dia do julgamento, a defesa do MGM fez um pedido de desculpas a Harry, admitindo que contratou um detetive para seguir seus passos em uma casa noturna. O julgamento deve durar seis semanas, com a presença de Harry no tribunal em junho. 

Harry x Associated Newspapers Limited, dona do Daily Mail, Mail On Sunday e MailOnline 

Em fevereiro de 2022, Harry abriu um processo contra o grupo ANL, por difamação.  

A queixa baseia-se num artigo do Mail on Sunday que o acusava de tentar enganar o público a respeito de uma batalha legal com o governo para conseguir proteção policial quando estivesse em Londres e tentar manter os detalhes do caso em segredo.

Um juiz do Tribunal Superior de Londres já deliberou que a reportagem era difamatória. Harry está buscando uma decisão a seu favor sem a necessidade de o caso ir a julgamento. 

Ele tem outro processo em curso contra o mesmo grupo, junto com Elton John e seu marido, o cineasta David Furnish; as atrizes Liz Hurley e Sadie Frost e Doreen Lawrence, mãe de um adolescente assassinado, Stephen Lawrence. 

As alegações são de que o jornal usou meios ilegais para apurar notícias, como escutas telefônicas, pagamento de policiais corruptos para fornecer informações, colocação de aparelhos de escuta nas casas e nos carros das vítimas, uso de fraude para obter registros médicos e invasão de contas bancárias.

Em março, Harry e Elton John compareceram ao tribunal, sem depor, para chamar a atenção sobre a causa. 

Harry x News Group Corp (NGN), dona do The Sun e do diário The Times

Harry acusa o tabloide The Sun de ter hackeado suas mensagens de voz, contratado detetives particulares e ter interceptado ligações do então príncipe Charles e da princesa Diana contendo informações sobre ele nos anos 2000. 

Na audiência deste processo, Harry alegou que não entrou com a ação em 2012, quando soube do caso, por ter sido convencido pela família a não seguir adiante. 

Em abril, advogados de Harry apresentaram documentos para tentar comprovar que houve um ‘acordo secreto’ entre o Palácio de Buckingham e o The Sun  para que ações judiciais não fossem abertas.

E que o príncipe William teria sido indenizado pelo jornal em segredo, sem necessidade de processos, por escutas telefônicas realizadas contra ele em 2020.

Harry pede pelo menos £ 200 mil em danos. O alvo principal é a jornalista Rebecca Brooks, então editora do The Sun.

Ela chegou a ser presa quando era editora de outro jornal do grupo, o tabloide News Of The World, que fechou as portas devido ao escândalo de escutas ilegais. 

O caso deu origem a um inquérito (Leveson Inquiry) sobre as práticas do jornalismo sensacionalista, que resultou em um conjunto de recomendações e um novo órgão para fiscalizar a imprensa. 

O ator Hugh Grant também processa o The Sun pelos mesmos motivos, e as duas ações correm juntas.

 

Batalhas vencidas por Harry e Meghan 

Agência Splash 

Em maio de 2019, Harry ganhou uma indenização substancial (o valor não foi divulgado) e aceitou um pedido de desculpas da Splash News and Picture Agency por fotos aéreas tiradas de sua casa em Oxfordshire, no centro da Inglaterra.

A agência usou um helicóptero em 9 de janeiro para tirar fotos e gravar vídeos da residência do casal, registrando a sala de estar, a sala de jantar e até o quarto.

Agência de fotografia de celebridades X17

A mídia não deu sossego a Harry e Meghan mesmo depois da mudança para os EUA.

Eles entraram com uma ação nos Estados Unidos em julho de 2020 alegando que fotógrafos paparazzi não identificados usaram drones e helicópteros para tirar fotos “ilegais” de seu filho, Archie, em sua residência particular na Califórnia quando ele tinha 14 meses de idade.

Em outubro de 2020, a X17 aceitou um acordo, concordando em parar de distribuir as imagens e também se desculpando com a família.

Meghan x Associated Newspapers 

Em dezembro de 2022 a editora que publica o tabloide Mail on Sunday anunciou em sua primeira página que havia desistido de recorrer contra a sentença favorável a Meghan Markle no processo da atriz contra o grupo.

Meghan acionou o jornal depois da publicação de trechos de sua carta ao pai, após o casamento com o príncipe Harry, acusando-o de infração de direitos autorais e invasão de privacidade. 

A Corte decidiu a seu favor, entendendo que não havia interesse público na publicação do conteúdo.

A indenização pela invasão de privacidade foi simbólica, de apenas £ 1, e pela infração de direitos autorais foi estabelecida uma soma não revelada.

Quando saiu o resultado, Meghan divulgou um comunicado incisivo: 

“Esta é uma vitória não apenas para mim, mas para qualquer um que já sentiu medo de defender o que é certo”.

Ela enfatizou que os tabloides “lucram com a mentira e a dor”. 

A família real até agora não se manifestou sobre os processos, nem sobre as acusações específicas envolvendo alguns de seus membros, como o suposto acordo entre o Príncipe William e o tabloide The Sun.