Londres – A decretação de falência da Vice Media não significa o fim de uma das estrelas do mundo das novas mídias digitais, mas uma tentativa de salvar a marca que se consolidou por sua forma de contar histórias alinhada ao gosto dos jovens.
Foi o que prometeram Hozefa Lokhandwala e Bruce Dixon, CEOs da Vice, no comunicado enviado à equipe e ao mercado quando o pedido foi protocolado no Tribunal de Falências dos EUA nesta segunda-feira (15).
Todas as marcas da empresa (Vice, Vice News, Vice TV, Vice Studios, Pulse Films, Virtue, Refinery29 e iD) continuarão a produzir conteúdo enquanto o processo de venda caminha.
Com falência, credores da Vice Media assumem passivo
Como não houve um comprador interessado na marca que já chegou a valer US$ 5,7 bilhões, a Vice passou para as mãos de um consórcio formado por Fortress Investment Group, Soros Fund Management e Monroe Capital, por US$ 225 milhões.
Segundo o comunicado, os três credores injetam este valor na operação e assumem todo o passivo, que não é pequeno.
A dívida com o Fortress registrada pela Vice Media no pedido de falência é de US$ 474,6 milhões.
O comunicado informa que a injeção de recursos, assim como o caixa gerado pelas operações em andamento, “será mais do que suficiente para financiar seus negócios durante todo o processo de venda”, que espera concluir nos próximos dois a três meses.
Embora os credores tenham assumido a empresa, outros interessados podem fazer lances maiores e acabar levando a marca.
O tom otimista dos CEOs tenta reverter a onda negativa que se abateu sobre a Vice Media recentemente.
Em abril, chegou ao fim o principal programa de jornalismo, o Vice News Tonight, resultando na demissão de dezenas de profissionais.
A notícia da falência iminente tinha sido revelada pelo New York Times e não desmentida.
“A Vice atende a uma enorme audiência global com uma marca única de conteúdo de notícias, entretenimento e estilo de vida”, disseram Bruce Dixon e Hozefa Lokhandwala ao anunciar a falência.
“Este processo de venda acelerado supervisionado pelo tribunal fortalecerá a empresa e a posicionará para um crescimento de longo prazo, protegendo assim o tipo de jornalismo autêntico e a criação de conteúdo que a tornaram tão confiável para os jovens e um parceiro tão valioso para marcas, agências e plataformas”
Os CEOs afirmaram que “terão agora uma estrutura de capital simplificada e a capacidade de operar sem as responsabilidades herdadas que sobrecarregam os negócios”.
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Estrutura complexa levou à falência da Vice Media
Em uma reportagem publicada no Motherboard, site de tecnologia da Vice, o editor Jason Koebler descreveu esse “peso”, lembrando que a empresa recebeu grandes aportes que permitiram a expansão, mas ganhou junto uma lista de investidores esperando retorno sobre os seus investimentos.
Ele destacou a empresa de private equity TPG, que deu à empresa US$ 450 milhões em 2017 para ampliar a TV Vice e expandir internacionalmente, além dos investimentos recebidos da A&E Networks, Disney e Fox.
Na avaliação de Koebler, esses investimentos levaram a uma estrutura corporativa altamente complexa e a uma série de dívidas que Frank Pometti, da consultoria AlixPartners, nomeado Diretor de Reestruturação da Vice, disse que acabou resultando na falência da empresa .
O editor citou um trecho do processo de falência, em que Pometti explica as dificuldades:
“A Vice contava com financiamento externo, levantando dívidas e capital próprio para alimentar seu rápido crescimento e financiar despesas em certas partes de seus negócios.
Embora esses esforços de arrecadação de fundos tenham ajudado a financiar o crescimento, eles acabaram levando a empresa a ser sobrecarregada por uma estrutura de capital altamente alavancada e atipicamente complexa.”
A lista de dívidas tem nomes e cifras de peso:
- US$ 20 milhões aos fundadores da Pulse Films, adquirida em 2022
- US$ 10 milhões à empresa de consultoria de tecnologia WiPro
- US$ 3,8 milhões à CNN, por serviços de produção de terceiros
- Pelo menos US$ 6 milhões ao Antenna Group, que distribui conteúdo da Vice em partes da Europa
- US$ 539.732 à empresa de energia ConEdison
Há ainda débitos com fornecedores como Workday, Adobe, Ranker, Getty Images, Amazon Web Services, Piano Software, Salesforce, Wolftech, Asana e Oracle.
A crise na mídia digital nativa
Fundada em 1994 a partir de uma revista alternativa em Montreal, a Vice não é a única queridinha do mundo das novas mídias digitais que desafiaram o jornalismo tradicional inovando em formato e conteúdo e acabaram em dificuldades.
No início deste ano, a Vox demitiu 130 pessoas, representando 7% da equipe. Em abril, a Insider demitiu parte de sua equipe e o BuzzFeed fechou a área de notícias.
As crises têm motivos diferentes. Jonah Peretti, CEO do BuzzFeed, reclamou das plataformas digitais, afirmando que investiu demais na marca por “amor ao seu trabalho e missão”, mas que as Big Techs não estavam dispostas a ajudá-lo a sobreviver.
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