Londres – A Federação Internacional de Jornalistas (IFJ) classificou de “violação brutal da liberdade de imprensa” o caso da jornalista investigativa Ariane Lavrilleux , presa nesta terça-feira (19) em Marselha por se recusar a revelar fontes de reportagens sobre operações militares do governo da França no Egito. 

Lavrilleux é colaboradora da RFI (Radio France Internationale) e trabalha para o site investigativo Disclosure, onde as denúncias fora publicadas.Sua casa foi alvo de uma batida feita por agentes da Direção de Segurança Interna (DGSI), acompanhados de um juiz, às 6h da manhã.

Depois de mais de 10 horas de revista e interrogatório, ela foi colocada sob custódia“no âmbito de uma investigação sobre o comprometimento de segredos de defesa nacional e a revelação de informações que poderiam levar à identificação de um agente protegido”. 

Jornalista foi presa por série de reportagens sobre operações da França no Egito 

A série de reportagens que deu origem à investigação revelou que as forças de segurança egípcias usaram informações fornecidas pelos militares franceses para supostamente matar civis suspeitos de contrabando na fronteira com a Líbia entre 2016 e 2018.

As matérias, publicadas em 2021, foram baseadas em centenas de documentos confidenciais vazados, alegando que a França forneceu inteligência às autoridades egípcias como parte da “Operação Sirli”, que teria sido criada para alimentar o Egito com informações sobre movimentos de militantes na região fronteiriça. 

O Ministério das Forças Armadas de França apresentou uma queixa por “violação do segredo de defesa nacional”, dando origem a um processo no Ministério Público de Paris, aberto em julho do ano passado, que resultou na prisão. 

Ariane Lavrilleux, jornalista francesa, foi presa por matérias sobre segredos militares da França
Ariane Lavrilleux (perfil Twitter)

A notícia de que Ariane Lavrilleux havia sido presa foi anunciada pelo site Disclose via Twitter /X. A nota afirma que “o ataque inaceitável teve como objetivo identificar as fontes que permitiram revelar a operação militar Sirli, levada a cabo pela França no Egito em nome da ditadura”. 

O site, que não tem fins lucrativos, afirmou também que as informações confidenciais reveladas são de interesse público.

“Elas lançam luz sobre o debate público a respeito da realidade nas relações da França com as ditaduras e lançam e sobre as armas fabricadas no nosso país e utilizadas contra populações civis.”

Protestos contra a prisão 

A prisão da jornalista provocou reação imediata das principais organizações de liberdade de imprensa, e uma manifestação diante do prédio da polícia de Marselha, para onde Ariane Lavrilleux foi levada. 

Manifestação contra prisão de jornalista investigativa francesa em Marselha
Foto: Presse-Papiers via Twitter

“O governo francês, que acaba de alterar escandalosamente o projeto de regulamento europeu para legalizar a espionagem de jornalistas, é um sinal de uma política hostil à imprensa e ao direito dos cidadãos de acesso à informação. Exigimos a libertação imediata de Ariane Lavrilleux e o cancelamento de quaisquer acusações contra ela”, disse o secretário-geral da EFJ, Ricardo Gutiérrez, na terça-feira.

Katia Roux, da Anistia Internacional,  afirmou que “colocar sob custódia policial um jornalista por fazer o seu trabalho, além de revelar informações de interesse público, pode ser visto como uma ameaça à liberdade de imprensa e à confidencialidade das fontes.”

A preocupação com o precedente sobre a confidencialidade de fontes, base do jornalismo investigativo, também foi levantada pela Repórteres Sem Fronteiras. 

“A RSF condena a detenção da jornalista e as buscas em sua casa e equipamentos [de trabalho] como parte de uma investigação que compromete a segurança nacional. Tememos que as ações do serviço de inteligência DGSI prejudiquem o sigilo das fontes.”

O caso mais notório de prisão por revelação de segredos militares é o de Julian Assange. O fundador do site Wikileaks, que divulgou documentos sobre a ação dos EUA nas guerras do Irã e Iraque, é processado pelo país e pode pegar 175 anos de cadeia.