Londres – A nove meses de sediar a próxima COP, a conferência do clima da ONU, o Azerbaijão vive uma escalada de repressão ao jornalismo independente e se tornou alvo de protestos de entidades de liberdade de imprensa e de direitos humanos nas últimas semanas.
Em audiências nos dias 14 e 15 de março, os Tribunal Distrital de Khatai, na capital, Baku, prorrogou por três meses a detenção do diretor do veículo de notícias anticorrupção Abzas Media, Ulvi Hasanli, da editora-chefe, Sevinj Vagifgizi, e do gerente de projetos Mahammad Kekalov, segundo o Comitê de Proteção a Jornalistas (CPJ).
A pressão sobre o Abzas Media – conhecido por investigar alegações de corrupção entre altos funcionários do Estado – começou em novembro, quando a polícia invadiu a redação e acusou funcionários de trazerem ilegalmente dinheiro de doadores ocidentais para o Azerbaijão.
Nas últimas semanas, os tribunais também haviam prorrogado as detenções de outros três jornalistas do veículo, Hafiz Baba, Elnara Gasimova e Nargiz Absalamova, capturados entre dezembro e janeiro.
Se forem considerados culpados, os seis jornalistas, todos acusados de conspiração para contrabando de moeda, poderão pegar até oito anos de prisão, nos termos do artigo 206.3.2 do código penal do Azerbaijão, de acordo com o CPJ.
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Repressão é reação do presidente do Azerbaijão a denúncias, diz Abzas Media
O Abzas Media disse que a operação faz parte da pressão do presidente Ilham Aliyev sobre o meio de comunicação em reação a “uma série de investigações sobre os crimes de corrupção do presidente e de funcionários por ele nomeados”.
As notícias continuaram a ser publicadas por uma nova equipe baseada na Europa, com apoio do Forbidden Stories , um grupo com sede em Paris que tenta continuar o trabalho de jornalistas presos.
Além dos seis integrantes do Abzas Media, há outros quatro profissionais de imprensa presos no Azerbaijão, em meio a um declínio nas relações entre o país e o Ocidente a despeito de ter sido aceito pela ONU para sediar uma das mais importantes conferências internacionais.
Invasão de TVs que denunciam corrupção no Azerbaijão
No início de março, a polícia invadiu o escritório da Toplum TV, deteve preventivamente 10 profissionais, e um tribunal ordenou que o fundador Alasgar Mammadli e o editor Mushfig Jabbar ficassem presos durante quatro meses, enquanto prosseguem as investigações sobre acusações de contrabando de moeda.
A polícia afirma ter encontrado 3.200 euros no apartamento de Jabbar, 3.100 euros no apartamento de Ismayilov e 2.700 euros na casa de Elmir Abbasov, gerente de mídias sociais, que não ficou preso. Os acusados afirmaram que a polícia “plantou” o dinheiro em suas casas.
Após as invasões, as contas do YouTube e Instagram da Toplum TV foram hackeadas e todo o seu conteúdo excluído. O canal da plataforma no YouTube contava com 3.500 vídeos.
O diretor da emissora Kanal 13, Aziz Orujov, e o repórter Shamo Eminov estão presos desde novembro e dezembro, respectivamente, pelas mesmas acusações.
A Toplum TV divulgou comunicado dizendo que o ocorrido estava relacionado às suas atividades profissionais e avaliou como um ataque à mídia independente. Muitas organizações locais e internacionais consideraram os detidos como presos políticos e apelaram às autoridades para que os libertassem imediatamente.
“A decisão de prolongar o encarceramento da equipe do Abzas Media ilustra a firme determinação das autoridades em censurar os seus melhores e mais brilhantes repórteres, prendendo-os”, disse Gulnoza Said, coordenador do Comitê de Proteção a Jornalistas para a Europa Central e Ásia
“As autoridades no Azerbaijão devem retirar imediatamente todas as acusações contra a equipe do Abzas Media, libertar todos os jornalistas presos injustamente e acabar com a repressão à imprensa independente”, disse.
Azerbaijão no índice de liberdade de imprensa
O Azerbaijão figura em 151º entre 180 nações no Global Press Freedom Index da organização Repórteres Sem Fronteiras. O Brasil está em 92º lugar.
Segundo a organização, o presidente Aliyev “eliminou qualquer aparência de pluralismo e desde 2014 tem procurado impiedosamente silenciar quaisquer críticos restantes”. A situação piorou em novembro, justamente um mês antes de a controvertida escolha do país para sediar a COP28, por ser uma nação sem liberdade e grande produtora de combustíveis fósseis.
No primeiro grupo de trabalho anunciado não havia mulheres, e o país teve que voltar atrás, mudando a composição. Apesar de seu histórico de violação dos direitos humanos, o Azerbaijão tem conseguido sediar grandes eventos como a COP e uma etapa do campeonato mundial de Fórmula 1.
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