Londres – O Brasil é o país com mais alto índice de credibilidade nas notícias na América Latina, revelou hoje o Instituto Reuters para Estudos de Jornalismo de Oxford, que apresentou em Londres a edição 2024 de seu relatório anual Digital News Report. 

O índice do Brasil (43%) é maior do que a média global (40%) e superior ou equivalente ao de nações como Alemanha, Suíça, Bélgica, Japão e Reino Unido.

O dado reflete notícias recebidas por qualquer fonte – do acesso direto a um veículo de comunicação a informações factuais que chegam por meio de redes sociais ou aplicativos de mensagem, produzidos por organizações de mídia ou canais independentes. No Brasil, as grandes organizações de mídia são mais confiáveis aos olhos do público, segundo o estudo.

Ao mesmo tempo, o Instituto Reuters constatou mais uma vez a extensão do fenômeno chamado “fadiga de notícias”, que este ano alcançou seu recorde: 39% dos entrevistados no mundo dizem que evitam notícias frequentemente ou às vezes, superando em três pontos o resultado do ano passado.

O Brasil é um dos que registrou maior aumento. 

Relatório mede credibilidade das notícias, acesso e outras tendências globais 

O Digital News Report é considerado o mais abrangente e aprofundado retrato do comportamento do público em relação às suas fontes de informação online – do jornalismo tradicional às redes sociais, examinando a situação de países em seis continentes, por meio de pesquisas realizadas pelo instituto britânico YouGov. 

Os autores assinalam que os resultados do relatório refletem o que as pessoas dizem, e não necessariamente o que fazem. 

Mas é uma importante referência para a indústria de mídia e para quem se interessa pelo papel do. jornalismo na sociedade e na democracia, apontando a percepção do público sobre temas como o papel das mídias sociais no ecossistema de informação, o uso inteligência artificial no jornalismo, a luta contra a  desinformação e a disposição de pagar para se informar. 

Credibilidade nas notícias está menor do que antes da pandemia

Dentre essas questões, medir a confiança do público nas notícias é importante porque um dos grandes desafios do jornalismo nos últimos anos tem sido manter a credibilidade diante do avanço das fake news e  de movimentos para desacreditar a imprensa tradicional, ao lado de outras barreiras como a sustentabilidade financeira das empresas jornalísticas e a disputa com influenciadores nas redes sociais, que se tornaram fontes primárias de informação sobretudo para os jovens. 

Para ilustrar o crescimento da importância de influenciadores, o estudo ressalta a quantidade expressiva de citações dos nomes de Lionel Messi, Taylor Swift e dos Kardashians como fontes de informação, embora eles não tratem de assuntos noticiosos em suas redes sociais. 

A confiança no noticiário manteve-se estável ao longo do último ano no mundo, com taxa de 40%, mas ainda está quatro pontos abaixo do índice atingido durante  a pandemia do coronavírus, de acordo com o relatório. 

A Finlândia continua a ser o país com os níveis mais elevados de confiança global (69%), enquanto na Grécia (23%) e na Hungria (23%) foram verificados os níveis mais baixos. 

O Brasil ficou em 15º entre os 47 países pesquisados, mas registra queda de 19 pontos em relação a 2015, quando o cenário midiático era bem diferente do de hoje, sem o impacto das redes sociais.  

Gráfico sobre credibilidade das notícias na opinião dos brasileiros

O Instituto alerta que as baixas pontuações em alguns outros países, como EUA (32%), Argentina (30%) e França (31%), podem estar parcialmente ligadas a elevados níveis de polarização e a debates divisivos sobre política e cultura.

O que forma a credibilidade? 

Nic Newman, pesquisador do Instituto e autor principal do relatório, salienta que as percepções não dizem respeito apenas à produção jornalística em si, sendo influenciadas também por fatores políticos e sociais, incluindo a polarização. 

A pesquisa aprofundou pela primeira vez este ano o entendimento dos fatores que proporcionam credibilidade nas notícias, e identificou quatro: padrões elevados, abordagem transparente, falta de preconceitos e representação justa.  

Nic Newman explicou que as principais respostas estão fortemente interligadas e são consistentes entre países, idades e pontos de vista políticos:

Nic Newman (foto: divulgação)

“Uma abordagem excessivamente negativa ou crítica, que é muito discutida pelos políticos quando criticam os meios de comunicação, é vista como a razão menos importante da nossa lista, sugerindo que o público ainda espera que os jornalistas façam perguntas difíceis.”

Fadiga de notícias: um problema global 

Uma das tendências que tira o sono de jornalistas, empresas jornalísticas e acadêmicos que estudam o setor  é o comportamento de evitar as notícias, não importando a fonte.

Este ano esse índice alcançou seu recorde, segundo o Instituto Reuters: 39% dos entrevistados dizem que o fazem frequentemente ou às vezes, um aumento de três pontos em relação ao ano passado. 

As eleições aumentaram o interesse pelas notícias em alguns países, incluindo os Estados Unidos (+3), mas a tendência geral permanece descendente.

Nesse aspecto, a notícia não é boa para o Brasil. O país é destacado como um dos que registrou maior aumento, junto com Espanha, Alemanha e Finlândia – que é a nação onde o público diz confiar mais nas notícias. 

Em 2023, 41% dos entrevistados pelo Instituto Reuters no Brasil disseram evitar se informar. Este ano o percentual cresceu para 47%. 

Mas o Brasil nem é o pior caso desse problema que atinge o mundo inteiro. Na Argentina, 77% do público declarou em 2017 ter interesse em notícias, taxa que despencou para 45% este ano. No Reino Unido, a queda em relação a 2015 foi quase a metade.

A proporção dos que dizem que se sentem “sobrecarregados” pela quantidade de notícias, mesmo que não as evitem, cresceu substancialmente (11 pontos percentuais) desde 2019, quando o Instituto Reuters começou a medir esse sentimento.

Celular, principal meio de acesso a notícias 

O relatório mede também como as pessoas acessam notícias online. No Brasil, 82% dos entrevistados disseram se informar pelo celular, e 51% pelo computador, bem à frente dos tablets, com apenas 30%, como mostra o gráfico do relatório. 

Na avaliação sobre meios de acessar notícias, o online domina no Brasil, com 74%.  Mídias sociais e TVs aparecem quase empatados, com 50% e 51% respectivamente.

O uso de veículos impressos segue estacionado desde a pandemia no Brasil, com 11% dos entrevistados na pesquisa declarando se informar por eles. 

É uma taxa bem mais baixa do que países com realidades diferentes como Peru (27%), Índia (40%, África do Sul (25%) e Japão (21%). 

Desinformação e credibilidade nas notícias 

A preocupação com o que é real e o que é falso na Internet quando se trata de notícias online aumentou 3 pontos percentuais no último ano, com cerca de seis em cada dez (59%) entrevisados afirmando estarem preocupados.

O número é consideravelmente mais elevado na África do Sul (81%) e nos Estados Unidos (72%). 

As preocupações sobre como identificar a credibilidade das notícias em plataformas online são maiores no TikTok e Twitter /X quando comparadas com outras redes sociais, de acordo com o Instituto Reuters. 

Ambas as plataformas acolheram desinformação ou conspirações em torno de histórias como a guerra em Gaza e a saúde de Kate Middleton, princesa de Gales, bem como a proliferação de vídeos deepfake, apontou o estudo. 

Veja outros destaques do relatório 

  • Em todos os países pesquisados, apenas 22% identificaram websites ou aplicativos de notícias como a sua principal fonte de notícias online – uma queda de 10 pontos em relação a 2018.
  • O público permanece cauteloso quanto ao uso da IA ​​na produção de notícias, especialmente para conteúdo sobre temas como política e noticiário 
  • Há mais aceitação ​​em tarefas operacionais, como transcrição e tradução, e grandes reservas quanto à substituição de jornalistas pela IA generativa. 

  • O acesso a notícias pelo Facebook caiu 4 pontos percentuais na média dos países pesquisados. 
  • A utilização das plataformas para obter notícias online está fragmentada, com seis redes atingindo pelo menos 10% dos entrevistados, em comparação com apenas duas há uma década. Na média global, o YouTube é usado para notícias por quase um terço (31%) dos participantes do estudo; o WhatsApp por cerca de um quinto (21%), enquanto o TikTok (13%) ultrapassou o Twitter / X  (10%) pela primeira vez
  • Vídeos curtos de notícias são acessados ​​por dois terços (66%) dos entrevistados a cada semana, com formatos mais longos atraindo cerca de metade deles (51%). 

O relatório completo pode ser visto aqui.