• O que aconteceu: Uma pesquisa global revelou que 92% dos entrevistados relataram sofrer violência online por atuarem como ativistas ambientais.
  • As plataformas mais citadas pelos agressores foram X, Facebook e WhatsApp, as duas últimas de propriedade da Meta, que responde pela maioria das denúncias ignoradas.

Violência online contra ativistas ambientais, relatada por mais de 9 em cada 10 dos participantes de um estudo da Global Witness, é favorecida pela negligência sistemática das plataformas digitais como Meta e X diante de ameaças e abusos, diz a organização. 

Violência online contra ativistas ambientais é ignorada por plataformas

A organização Global Witness divulgou nesta semana um relatório inédito com base em 204 entrevistas com ativistas ambientais de diferentes países, revelando um cenário alarmante de abusos digitais contra os que lutam pela defesa do clima

A pesquisa mostra que a violência online não apenas é amplamente disseminada, como também se transforma em ameaças reais fora da internet — com intimidações, prisões e agressões físicas sendo relatadas com frequência por quem atua na defesa do clima e dos territórios.

Segundo a organização, os abusos online incluem desde comentários ofensivos e assédio sistemático até ameaças de morte e campanhas de difamação.

As redes sociais se tornaram uma ferramenta essencial para ativistas ambientais denunciarem violações de direitos e articularem protestos, mas a falta de proteção adequada nos ambientes digitais tem imposto riscos crescentes à integridade física e mental desses defensores.

Omissão das plataformas amplia risco fora das redes

Entre os ativistas que disseram ter sofrido violência física, 75% afirmaram que os ataques online contribuíram direta ou parcialmente para essas agressões.

Segundo o relatório, 82% das vítimas de violência digital disseram ter sido atacadas em pelo menos uma das plataformas pertencentes à Meta: Facebook, Instagram ou WhatsApp. A rede X (ex-Twitter) também foi frequentemente citada.

Apesar disso, apenas 12% dos entrevistados disseram estar satisfeitos com as respostas das plataformas ao denunciarem os abusos.

O relatório aponta falhas graves na moderação de conteúdo e destaca que, em algumas regiões, como África, América Latina e Sudeste Asiático, a resposta das empresas é ainda mais limitada.

Essa disparidade, segundo a Global Witness, compromete ainda mais os ativistas que atuam em contextos de maior risco social e político.

Depoimentos revelam impactos psicológicos e abandono do ativismo

O relatório inclui uma série de depoimentos detalhados que ilustram o impacto humano dessas agressões.

Em um dos casos mais dramáticos, um padre jesuíta da Alemanha relatou ter abandonado o ativismo climático após ser alvo de uma campanha de ódio com milhares de mensagens em X e TikTok, incluindo ameaças de morte e alegações falsas ligadas à sua fé religiosa.

Ele afirma que os ataques online provocaram medo constante, perda de apoio institucional e sofrimento emocional intenso.

Mulheres ativistas relatam ser especialmente visadas. Em diversas entrevistas, defensoras relataram receber mensagens com conteúdo sexualizado, ameaças de estupro e insultos misóginos.

Muitas disseram temer sair de casa, evitar publicações em tempo real e esconder suas identidades em protestos para não serem alvo de perseguição. A violência de gênero online, segundo o relatório, é usada como estratégia para intimidar e silenciar as lideranças femininas no ativismo climático.

Além das agressões diretas, muitos ativistas relatam prejuízos à reputação, perseguição jurídica e estigmatização pública. Vários afirmaram que familiares também foram alvo de ameaças ou falsas acusações.

Casos de vigilância ilegal, acesso indevido a contas e campanhas de desinformação com impulsionamento pago foram registrados em diferentes regiões do mundo.

Um dos exemplos dessa prática é a ativista ambiental Greta Thumberg, alvo de ataques de todos os tipos pelas redes sociais, criticando suas posições e sua condição de saúde. 

Desinformação e campanhas coordenadas na América Latina

Na América Latina, os ataques online muitas vezes envolvem desinformação sistemática.

A engenheira florestal Lucilia, do Peru, que atua na defesa da Amazônia, relatou à Global Witness uma campanha coordenada que envolveu acusações falsas de lavagem de dinheiro, veiculadas em redes como Facebook, TikTok e YouTube.

Mesmo após a desmentida por autoridades nacionais e internacionais, os conteúdos não foram retirados pelas plataformas. A ativista recebeu medidas de proteção do governo peruano, mas os ataques persistem.

Outro caso citado é o de um defensor colombiano que denunciou o uso de verbas de publicidade para impulsionar ataques e narrativas falsas em redes sociais.

As mensagens patrocinadas buscavam deslegitimar sua atuação e manipular a opinião pública, criando um ambiente de hostilidade e ameaças reais contra ele e sua comunidade.

O defensor afirma que a campanha incluiu mentiras sobre supostas alianças com organizações criminosas e manipulação de dados financeiros.

Modelo de negócios das redes favorece conteúdo abusivo

O estudo aponta que o próprio modelo de negócio das redes sociais contribui para a propagação dos ataques. Os algoritmos priorizam conteúdos que geram maior engajamento, como postagens polarizadoras, discursos de ódio e fake news.

Isso favorece o alcance de ameaças e campanhas de difamação contra ativistas, enquanto a moderação é insuficiente ou ineficaz. Plataformas como X e Meta, segundo a Global Witness, lucram com a permanência dos usuários em ambientes altamente polarizados, mesmo que isso implique em riscos graves à segurança de seus usuários.

O relatório critica a substituição de mecanismos de checagem profissional por modelos comunitários, como o “Community Notes” adotado por X e previsto pela Meta.

Segundo a organização, essas mudanças reduzem a capacidade das plataformas de reagir a narrativas maliciosas, dificultando a remoção de conteúdos prejudiciais mesmo após denúncias e comprovações. Além disso, a anonimidade dos usuários e a facilidade de criação de contas falsas agravam o cenário.

Recomendações incluem transparência e reforço na moderação

Ao final do relatório, a Global Witness pede que plataformas como Meta e X revejam seus algoritmos e sistemas de segurança.

As recomendações incluem a ampliação das equipes de moderação, com remuneração justa e apoio psicológico, além da possibilidade de formação sindical dos moderadores.

Outro ponto importante é a abertura para auditorias externas e publicação dos resultados das ações implementadas. A organização sugere ainda que as plataformas sejam obrigadas a investir proporcionalmente em segurança nos países onde operam, com foco especial nas regiões mais afetadas.

Segundo o relatório, as empresas têm capacidade técnica e financeira para implementar soluções mais eficazes, mas escolhem priorizar a lógica de lucro imediato.

A falta de responsabilização permite que os abusos persistam, tornando os ambientes digitais inseguros para defensores dos direitos humanos e do meio ambiente.

A organização conclui que proteger ativistas é também proteger a democracia, o meio ambiente e o direito à informação. Se plataformas não forem responsabilizadas, os abusos tendem a crescer, silenciando vozes fundamentais na luta contra a emergência climática.

Clique aqui para baixar a íntegra do relatório.