Um júri federal do estado do Texas (EUA) condenou um homem a 15 meses de prisão federal após considerá-lo culpado de uma fraude relacionada à Covid-19 nas redes sociais, em um caso que mostra que punições para essa conduta são possíveis, mas nem sempre atingem os poderosos.
Christopher Charles Perez, de 40 anos, foi detido em 2020 por ter postado no Facebook mensagens em que dizia que tinha pagado um primo com Covid-19 para lamber os produtos em mercearias da cidade de San Antonio. Segundo ele alega, a intenção era afastar as pessoas desses locais e incentivar o distanciamento social.
O caso aconteceu em abril de 2020, quando o mundo estava assombrado com a ameaça da Covid-19 e as incertezas tomavam conta da sociedade.
Um ano e meio depois, no dia 4/10, Perez foi considerado culpado de duas acusações de violação de uma lei federal que trata como crime a prática de fraude envolvendo armas biológicas, sujeito até a prisão perpétua se o ato resultar em morte.
Ele admitiu que toda a ameaça contida no post foi uma farsa, e que ele jamais pagou alguém para infectar propositalmente produtos à venda em mercados de San Antonio.
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Perez, aparentemente um “cidadão comum” americano, foi preso depois que seu post chegou a um setor do FBI ligado à repressão ao terrorismo nos EUA. Além da prisão, o texano ainda terá de pagar uma multa de US$ 1.000 (R$ 5.400).
“Tentar assustar as pessoas com a ameaça de espalhar doenças perigosas não é brincadeira”, disse a procuradora Ashley C. Hoff, de acordo com documentos judiciais. “Este escritório leva a sério ameaças de prejudicar a comunidade e irá processá-los em toda a extensão da lei.”
Dois pesos, duas medidas?
Casos de fake news e desinformação durante a pandemia foram corriqueiros e muitas vezes protagonizados por pessoas de destaque, como políticos e jornalistas — mas punições de rigor semelhante ao caso do Texas, são raros.
O exemplo do jornalista Alex Berenson, ex-repórter do New York Times que acabou banido do Twitter por disseminar desinformação sobre a Covid-19, mostra como possivelmente muitos nomes conhecidos podem ter cometido o mesmo crime atribuído a Perez, e em escala bem maior.
No perfil de Berenson havia uma mensagem fixada contra a obrigatoriedade de vacinação, afirmando que as vacinas contra a Covid-19 são “na melhor das hipóteses um terapêutico com janela limitada de eficácia”
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Um porta-voz do Twitter confirmou que a conta de Berenson foi permanentemente suspensa por “violações repetidas de regras de desinformação sobre a Covid-19”. O jornalista ameaçou processar a rede social.
Fox News, fonte de desinformação sobre a Covid
Tucker Carlson, estrela da Fox News, apontada no começo desta semana pela ex-chefe de imprensa de Trump na Casa Branca como “TV estatal” do governo, também acusado de disseminar desinformação sobre a Covid-19, se ofereceu para financiar a defesa de Berenson.
Em uma entrevista em setembro, o apresentador admitiu que “tenta não mentir na TV”. Com a ajuda do âncora Dave Rubin, Carlson criticava profissionais da rede rival CNN, vistos pelos dois como “defensores do sistema” a todo custo.
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Os EUA ainda tiveram o registro de mortes por Covid-19 de jornalistas abertamente negacionistas, que se dedicaram a combater medidas de prevenção e isolamento social. Os casos não foram tratados como fake news, e as organizações de mídia não sofreram punições por deixarem âncoras irem contra a medidas recomendadas pelas autoridades sanitárias.
No contexto mundial, o Brasil ocupa uma triste liderança, sendo o país do mundo com o maior número de jornalistas mortos pelo coronavírus.
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12 fontes de desinformação
Muitos americanos não foram tratados com o mesmo rigor aplicado ao texano.
Uma pesquisa do Center for Countering Digital Hate publicada em março, apontou 12 nomes que seriam responsáveis por 65% do conteúdo antivacina disseminado no Facebook e no Twitter entre fevereiro e março de 2021.
O grupo, formado por médicos, empresários ligados à venda de produtos alternativos de saúde, influenciadores e políticos, mantinha perfis online com campanhas ostensivas contra a vacinação e obrigatoriedade do uso de máscaras, por exemplo, mesmo após um ano de pandemia e os números de mortes causados pela Covid-19.
Um dos expoentes apontados na “lista dos 12” é Robert F. Kennedy Jr., sobrinho do ex-presidente dos EUA John F. Kennedy. Ele foi banido do Instagram em fevereiro por suas postagens de cunho negacionista.
A ONG presidida por Kennedy, Children’s Health Defense, também teve posts bloqueados, mas ele não enfrenta processos na Justiça, ao contrário — tentou processar o Facebook.
QAnon avança
As mesmas redes sociais usadas por Charles Perez para seu apelo desesperado viraram terreno fértil para a proliferação de teorias conspiratórias, que de acordo com as entidades que monitoram desinformação, não têm sido combatidas com a energia necessária e com a tecnologia possível.
Apesar de esforços de moderação, o ambiente dá espaço a movimentos como o QAnon, que nos Estados Unidos continua seguido por 17% da população.
Isto sem considerar que há casos de redes sociais criadas com o intuito de publicar opiniões e teses negacionistas, como o Gettr, plataforma considerada “versão trumpista” do Twitter.
O ex-presidente chegou tentar criar uma espécie de rede social própria, mas a ideia morreu um mês depois por falta de audiência.
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Punições e exclusões de conteúdo vêm sendo uma das reações de plataformas como o YouTube contra a desinformação.
No entanto, ações judiciais, como no caso do Texas, ainda não ocorrem com grandes disseminadores na mesma medida e rigor do caso aplicado ao cidadão comum.
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