Após uma saga com episódios quase cinematográficos que incluíram o desvio de um voo comercial e um pouso forçado em Minsk para sua captura e meses de incomunicabilidade, o jornalista da Bielorrússia Raman Pratasevich acabou condenado a oito anos de prisão. 

A condenação no país “mais perigoso para a imprensa na Europa até a invasão da Rússia na Ucrânia” segundo levantamento da organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF), confirma a tendência da Bielorrússia de “contínua perseguição aos meios de comunicação independentes e seus repórteres”.

Ela aconteceu no Dia Mundial da LIberdade de Imprensa (3 de maio), quando foi divulgada a nova edição do Índice Global de Liberdade de Imprensa da RSF listando o país em 157º lugar. 

Condenação mostra “desprezo” à imprensa livre

Pratasevich atuava como editor do Belarus Golovnogo Mozga e foi co-fundador do  Nexta, um canal do Telegram que ganhou notoriedade com a cobertura dos protestos contra a reeleição de Aleksander Lukashenko em 2020.

Sua namorada, a também editora do Nexta, Sofia Sapega, foi presa junto.

Ela viria a pedir perdão para Aleksander Lukashenko, após ser condenada a 6 anos de prisão em maio do ano passado, por “incitar a inimizade social e a discórdia”.

Junto com Pratasevich, receberam sentenças à revelia outros dois profissionais, os jornalistas Stsypan Putsila e Yan Rudzik, também membros do Belarus Golovnogo Mozga.

Ambos estão atualmente exilados e suas penas são, respectivamente, de 20 e 19 anos de prisão. 

A condenação de Pratasevich e a ironia da data escolhida geraram declarações oficiais divulgadas por organizações de defesa da liberdade de imprensa. 

Para Gulnoza Said, representante do Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) na Europa e coordenadora do programa da Ásia Central, as condenações nessa data específica “são mais uma demonstração sombria do profundo desprezo das autoridades bielorrussas por uma imprensa livre”.

As autoridades devem retirar imediatamente todas as acusações contra os três jornalistas e libertar Pratasevich e todos os outros membros da imprensa detidos em retaliação por seu trabalho.

Sob Pratasevich pesam as acusações de organização de protestos em massa, apelos públicos para a tomada do poder pelo povo, atos de terrorismo, calúnias e insultos contra o presidente Aleksandr Lukashenko, e liderança de uma formação extremista.

Segundo Jeanne Cavelier, chefe da mesa da RSF na Europa Oriental e Ásia Central, “o governo do presidente Lukashenko escolheu o dia 3 de maio, Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, para esta demonstração de desprezo pelos direitos dos jornalistas.”

A dura sentença imposta a Raman Pratasevich completa a assustadora sequência de eventos que começaram quando as autoridades bielorrussas desviaram sua fuga e o detiveram.

Estamos indignados com este julgamento iníquo e exigimos a sua libertação e a libertação dos outros 33 jornalistas presos na Bielorrússia.

De acordo com a promotoria, Pratasevich “cumpriu os termos do acordo de cooperação, então receberá menos (anos de prisão) do que poderia” – numa clara comparação à pena dos colegas que se escondem no exterior.

Ele  permanecerá em prisão domicilar até que a decisão entre em vigor. Seu presídio deverá ser de “segurança máxima”, conforme divulgado por veículos de imprensa do Leste Europeu.

Clima de tensão geral para jornalistas bielorrussos

Em março deste ano, outras duas jornalistas, que atuavam no maior portal do país, Tut.By, também receberam condenações. 

As  sentenças de 12 anos de cárcere para Maryna Zolatava e Lyudmila Chekina confirmam uma tendência do governo Lukashenko: o país está entre os principais carcereiros de jornalistas no globo.

No ano anterior, a repórter de televisão Ksenia Lutskina recebeu uma pena de oito anos de prisão. Detida desde 2020, a jornalista tem um tumor cerebral e trabalhava na TV estatal quando foi acusada de conspiração.

Segundo a RSF, atualmente a Bielorrússia mantém detidos 34 jornalistas e outros três profissionais de mídia.