A Suprema Corte de Hong Kong revogou por unanimidade a condenação da jornalista e cinegrafista Choy Yuk-Ling, mais conhecida como Bao Choy, por duas acusações de “falso testemunho” relacionadas ao acesso de informações públicas para uma reportagem.

Em uma nota oficial nesta segunda-feira (5), a corte declarou que a condenação inicial — que multava a repórter em 6.000 HK$ (R$ 3,7 mil) — representava uma “injustiça grave e substancial”.

A decisão da corte foi recebida como uma pequena vitória para a imprensa independente e tradicional na região, que desde 2019, quando eclodiram os protestos pró-democracia, vive sob censura e repressão.

Condenada por ‘abusar’ de dados públicos de Hong Kong

Em 2021, Choy investigava registros públicos de propriedade de veículos para um documentário que produzia para o canal público Radio Television Hong Kong.

A jornalista vasculhou registros governamentais de carros suspeitos de transportar armas e agressores para o “linchamento de Yuen Long”, em julho de 2019.

Neste episódio, um grupo vinculado à máfia local reprimiu, com paus e bastões, manifestantes que protestavam contra uma nova lei de extradição aprovada por Carrie Lam, na época chefe do executivo do território. 

A condenação ocorreu em abril de 2021, sob o argumento de que Choy teria abusado das leis de trânsito de Hong Kong, ao procurar os dados de forma supostamente inapropriada.

Pela acusação, a repórter teria abusado dos registros públicos, consultáveis apenas sob o pretexto de “compras de carros”, “assuntos legais” ou “outros assuntos ligados a transporte e tráfego”.  Mesmo ela tendo escolhido a terceira opção, o governo acusou Choy de “falso testemunho”.

Em novembro de 2022, a defesa tentou uma apelação, recusada pela justiça de Hong Kong sob acusações de “abusos arbitrários”. O caso foi então levado para a Suprema Corte.

A Corte aceitou por unanimidade o argumento da defesa de Choy, declarando que a opção “outros assuntos ligados a transporte e tráfego” não devia excluir “jornalismo de excelência.”

A jornalista falou diante do tribunal após o veredito, agradecendo aos que a apoiaram e salientando que não é apenas um caso pessoal, e sim uma questão de liberdade de imprensa. 

 

Condenação é pequena vitória em cenário preocupante

Em nota, a Federação Internacional de Jornalistas (IFJ) aponta que a revogação da condenação de Bao Choy é uma “vitória rara” para a liberdade de imprensa em Hong Kong:

“Bao Choy nunca deveria ter sido condenada por suas investigações, e sua tenacidade em superar as acusações iniciais são admiráveis.

O IFJ acolhe a decisão da corte, mas também insiste que autoridades respeitem as determinações da Lei Básica de Hong Kong que garantem liberdade de imprensa para evitar casos legais similares contra profissionais da mídia.”

Beh Lih Yi, coordenador do Comitê para Proteção de Jornalistas (CPJ) na Ásia, elogiou a decisão da Suprema Corte, sem deixar de tecer críticas à perseguição local:

“Já passou da hora do governo de Hong Kong de parar de perseguir a mídia e largar todas as acusações criminais contra jornalistas por seus trabalhos.

A liberdade de imprensa é garantida por constituição em Hong Kong. Nenhum jornalista deveria ser acusado criminalmente, muito menos condenado, por sua reportagem.”

Dentre os casos recentes de violações da liberdade de imprensa está o encarceramento dos editores Chung Pui-kuen e Patrick Lam, do site de notícias Stand News, e o julgamento para prisão perpétua do magnata Jimmy Lai, fundador do jornal pró-democracia Apple Daily.

Atualmente, Hong Kong ocupa a 140ª posição no índice de liberdade de imprensa da Repórteres Sem Fronteiras, tendo ido de “um bastião da liberdade de imprensa” para “um espaço que silencia vozes independentes”.