Londres – O Google seguiu os passos da Meta e também anunciou que removerá todos os links para notícias canadenses sob o argumento de que a regulamentação que obriga remuneração das empresas jornalísticas pelo uso do conteúdo nas duas plataformas digitais é “impraticável”. 

Um dia após o projeto ser aprovado no Parlamento canadense, há uma semana, a holding do Facebook havia feito o mesmo. 

Na Austrália, primeiro país a regulamentar o pagamento, a Meta chegou a banir notícias no Facebook às vésperas da aprovação da lei, mas depois de conversas com o governo que resultaram em flexibilização de alguns termos, a paz foi selada e as notícias continuaram. 

Sem abertura para negociar regulamentação, dizem plataformas 

No Canadá a situação parece mais crítica, pois a lei já foi aprovada, em um formato que as plataformas não concordam: pagamento obrigatório ao usar links e ausência de teto para a compensação a ser paga às empresas jornalísticas. 

E no entendimento do Google e da Meta, não há sinais de que propostas feitas pelos representantes das plataformas em conversas recentes com o governo serão incorporadas na fase de implantação da regulamentação, que levará seis meses. 

A partir da entrada em vigor, se nada mudar, usuários do Facebook não poderão postar links de noticias produzidas por veículos de imprensa canadenses, que também não vão aparecer nas buscas do Google ou na seleção do Discover. 

Em um post no blog, o presidente de Assuntos Globais do Google, Kent Walker, afirmou que o governo não deu motivos para acreditar que o processo regulatório será capaz de resolver “questões estruturais” da legislação. 

“O governo do Canadá promulgou uma nova lei chamada Bill C-18 (Online News Act), exigindo que duas empresas paguem para simplesmente mostrar links para notícias, algo que todo mundo faz de graça.

A decisão sem precedentes de colocar um preço nos links (o chamado “imposto de link”) cria incerteza para nossos produtos e nos expõe a responsabilidades financeiras ilimitadas simplesmente por facilitar o acesso dos canadenses às notícias de empresas jornalísticas do Canadá.”

A remoção de links valerá para o buscador Google, para o Discover e para o Google News Showcase, espaço onde notícias são exibidas como resultado de acordos com os editores (mais de 150 no Canadá). 

Walker se disse “decepcionado por ter que chegar a esse ponto”, tentando demonstrar a contribuição do Google para a indústria de notícias. 

Segundo o executivo, no ano passado foram feitos links para publicações de notícias canadenses mais de 3,6 bilhões de vezes, “ajudando os editores a ganhar dinheiro com anúncios e novas assinaturas”, salienta.

Esse tráfego de referência de links foi avaliado em 250 milhões de dólares canadenses.

A discórdia entre plataformas, empresas jornalísticas e governos que tentam regulamentar as plataformas é justamente sobre quem ganha mais com os links – os produtores do conteúdo ou as Big Techs, que faturam com a exibição de propaganda no conteúdo. 

Um estudo do Parlamento canadense sustenta que as empresas jornalísticas podem receber até 329 milhões de dólares canadenses (US$ 248 milhões) por ano das plataformas digitais.

A migração das receitas de propaganda para as plataformas é apontada como motivo para uma crise na indústria do jornalismo, resultando em fechamento de títulos e encolhimento de redações. A compensação, que também já foi implantada no Itália, tem como objetivo reparar esse dano. 

O primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau, deu sinais de que as conversas não seriam fáceis. Antes da aprovação da lei, ele reagiu à ameaça da Meta de remover os links de notícias: 

“O fato de esses gigantes da internet preferirem cortar o acesso dos canadenses às notícias locais do que pagar sua parte justa é um problema real, e agora eles estão recorrendo a táticas de intimidação para tentar conseguir o que querem. Não vai funcionar.”

O que Google e Meta tentaram (e ainda tentam) é um mecanismo que poderia na avaliação das plataformas “desbloquear mais recursos financeiros para o jornalismo canadense”. 

Segundo o executivo, em uma reunião na semana passada as plataformas “pediram clareza” sobre as expectativas financeiras “por simplesmente dar link para notícias”, bem como um caminho específico e viável para isenção [de pagamento]  “com base em nossos programas para apoiar notícias e nossos acordos comerciais com editores”.

O Google disse que endossa também um modelo alternativo de fundo independente para o jornalismo canadense apoiado por ambas as plataformas e pelo governo. 

Mas ressalta que a decisão de remover os links está sendo anunciada porque não houve sinalização de que as ideias seriam aceitas, o que poderá “dificultar o alcance [do trabalho] de jornalistas e reduzir o valioso tráfego gratuito da Web para editores canadenses”.

Um dos principais jornais canadenses, o Globe and Mail, informou ao Parlamento que 30% de seu tráfego vem das plataformas digitais.  

As plataformas e alguns especialistas acreditam que embora o projeto tenha boas intenções, pode acabar resultando em impacto negativo para as empresas jornalísticas caso um ponto de equilíbrio não seja encontrado. 

Outro temor levantado é o da desinformação, uma vez que haverá menos conteúdo produzido por fontes confiáveis. 

Pagamento em outros países 

A briga entre plataformas e indústria de jornalismo começou na Austrália em 2012 e se alastrou por vários países, como resultados e acordos diferentes. 

Em março de 2022 o Google anunciou um acordo com uma aliança de jornais franceses oito meses depois de receber uma multa de 500 milhões de euros. 

Em maio do mesmo ano, após a França vencer a queda de braço, foi firmado um acordo entre o Google e mais de 300 empresas jornalísticas na Europa em linha com a lei de mídia da UE. Entre os países beneficiados estavam Alemanha, Hungria, Holanda, Irlanda, Áustria e também a França. 

Na Itália,  a agência reguladora do setor de telecomunicações publicou em fevereiro passado uma norma determinando critérios para a remuneração das empresas jornalísticas pelo uso do conteúdo, de forma a recompensa-las “com justiça”.