Londres – A situação da BBC só piora desde a última sexta-feira (7), quando explodiu a denúncia de que um de seus mais importantes apresentadores teria pago a uma pessoa menor de idade para receber fotos pornográficas, feita pelo tabloide The Sun. 

O nome dos envolvidos não foi revelado, dando margem a especulações incessantes nas redes sociais sobre quem seria o apresentador – e celebridades como Jeremy Vine e Gary Lineker tiveram que ir a público para se dissociar do caso. 

Embora se defenda dizendo que não pode informar o nome do apresentador em respeito à lei de privacidade, a BBC está sendo criticada pela sua condução do caso, antes e depois da publicação da notícia – pela imprensa, por analistas e por autoridades do governo. 

“A BBC precisa colocar sua “casa em ordem” ou então pode haver “vítimas colaterais”, disse o Secretário Nacional de Justiça, Alex Chalk, em entrevista ao programa matutino da BBC nesta segunda-feira. 

Entenda o caso das fotos do apresentador 

  • A mãe de uma pessoa jovem usuária de drogas procurou o jornal The Sun para denunciar que um apresentador da BBC pagava por fotos de nu explícito há três anos, prática que começou quando a vítima tinha 17 anos, configurando crime sob as leis britânicas. 
  • Os pagamentos ultrapassam 35 mil libras (RS$ 220 mil). Um deles foi de 5 mil libras. 
  • Ela disse ter notificado a BBC em 19 de maio, pedindo para que a rede intercedesse e o apresentador interrompesse os pagamentos, que estavam financiando o vício em crack e destruindo a vida da vítima. 
  • O apresentador continuou no ar, motivando a mãe a denunciar ao jornal. 
  • No fim de semana, novas alegações foram publicadas: a de que os pagamentos continuaram depois que a rede foi informada, um deles feito em junho, e a de que o apresentador ligou para a vítima desesperado, com pressão para a mãe parasse com as denúncias. 
  • O apresentador também teria enviado fotos de nu explícito, algumas tiradas dentro do local de trabalho.

O que fez a BBC 

Ainda que existam restrições legais quanto à privacidade de pessoas denunciadas até que autoridades formalizem indiciamento ou revelem nomes de envolvidos, a BBC está sendo fortemente criticada por informações pouco detalhadas ou inconsistentes sobre seus atos desde que tomou conhecimento do caso. 

Em uma nota oficial divulgada na sexta-feira, a rede confirmou que havia sido notificada pela família em maio; que levava qualquer alegação a série e que tinha processos internos “robustos” para lidar proativamente com tais alegações”. 

Mas seguiu sugerindo que não levou as denúncias adiante porque não recebeu informações suficientes por parte da família ou teria tido dificuldades em entrar em contato: 

“Se não obtivermos resposta às nossas tentativas ou não recebermos mais nenhum contato, isso pode limitar nossa capacidade de progredir, mas isso não significa que nossas investigações param.

“Se, a qualquer momento, novas informações vierem à tona ou forem fornecidas – inclusive por meio de jornais -, isso será feito de maneira apropriada, de acordo com os processos internos”.

No domingo, em outra nota, a BBC insistiu na tese de que não tinha todas as informações reveladas pelo tabloide The Sun: 

Novas alegações foram feitas na quinta-feira de natureza diferente e, além de nossas próprias investigações, também estivemos em contato com autoridades externas, de acordo com nossos protocolos.”

A rede referiu-se à polícia, que apenas no domingo foi notificada sobre o caso. Mas não foi uma denúncia formal.

Um encontro de representantes da BBC com a Scotland Yard (polícia metropolitana de Londres) é esperado para a segunda-feira. 

As principais críticas e questionamentos são: 

  • Por que o apresentador só foi tirado do ar (inicialmente sem suspensão formal) e depois suspenso após a notícia publicada e não no momento em que houve uma denúncia? 
  • Ele continuou recebendo salário – pago pelo contribuinte, já que a emissora é pública?
  • Como foi (se houve) a investigação interna, e quais as evidências de que a família se recusou a cooperar? 
  • O Departamento de RH foi informado? A direção-geral foi informada? Quem tinha as informações e pode ser apontado como responsável por não ter aprofundado o caso? 
  • Considerando que havia uma vida em risco, a BBC deveria ter notificado a polícia sobre a denúncia e deixado a investigação ser feita de forma independente e profissional?

No domingo, a mãe da vítima reagiu à sugestão de que não teriam cooperado, sustentando ao The Sun que ninguém da rede entrou em contato depois da denúncia inicial. 

Segundo o jornal, na noite de sábado, a família entregou um dossiê de provas ao investigador principal da emissora, o ex-policial Jeff Brown.

O setor de mídia do país é fiscalizado pela agência reguladora Ofcom e pelo próprio gabinete, por meio da Secretaria de Mídia, Cultura e Esportes. 

No domingo, a secretária Lucy Frazier emitiu um comunicado dizendo que havia falado com o diretor-geral da BBC, Tim Davie, expressando a preocupação com o caso e dizendo que seria informada sobre o andamento das investigações. 

Enquanto isso, as especulações sobre o nome do apresentador continuam, com novas possibilidades aparecendo nas redes sociais depois de os “acusados” postarem evidências de que não foram afastados do trabalho. 

A mídia britânica – incluindo o próprio jornalismo da BBC  – acompanha cada passo e dá destaque à crise, com reportagens ao vivo diante da sede da emissora e comentaristas analisando a situação. 

O fantasma de Jimmy Savile, um pedófilo que durante décadas abusou de crianças que participavam de seus programas, é outro tema recorrente nas redes sociais, com sugestões de que a BBC novamente não levou as denúncias a sério o suficiente, como no caso célebre. 

A conduta da BBC em casos envolvendo estrelas de seu elenco não se resumem a denúncias de cunho sexual, como a atual, a de Savile e a do apresentador de rádio Tim Westwood, acusado de abuso contra jovens aspirantes ao estrelato que participavam de seus programas. 

A investigação ainda está em curso para levantar os fatos e o que a direção da BBC sabia sobre o que ocorreu. 

Uma grande mancha na história de mais de 100 anos de bom jornalismo da rede é a entrevista célebre da princesa Diana ao programa Panorama, em 1995. 

O repórter Martin Bashir utilizou extratos bancários falsos para convencer a princesa de que ela estava sendo espionada pelo Palácio de Buckingham.

Apenas 25 anos após a entrevista ele foi demitido da rede, depois que o caso foi revivido em um documentário comprovando que a história foi encoberta.