Londres – O jornalista russo ganhador do Prêmio Nobel da Paz Dmitry Muratov deixará temporariamente seu cargo de editor-chefe do Novaya Gazeta para se dedicar à tentativa de reverter nos tribunais o rótulo de “agente estrangeiro”, recebido do Ministério da Justiça da Rússia na última sexta-feira.
A informação foi anunciada no site do Novaya Gazeta Europa, criado depois que a versão russa do jornal, que tinha mais de 30 anos de existência e uma história de críticas pesadas ao regime de Vladimir Putin, foi obrigada a fechar e perdeu a licença de operação.
“Muratov está em forte desacordo com a decisão do Ministério da Justiça e entrará com uma ação judicial”, disse em nota o Novaya Gazeta, anunciando que o atual editor-chefe adjunto, Sergey Sokolov, se tornaria editor-chefe interino.
Restrições financeiras e profissionais a russos ‘agentes estrangeiros’
O termo “agente estrangeiro” pode ser aplicado a qualquer pessoa que o governo russo decida estar sujeita a “influência estrangeira”. Os agentes estrangeiros têm diversas restrições financeiras e profissionais impostas às suas atividades.
Eles são obrigados sinalizar essa condição em qualquer conteúdo que publicarem, até mesmo postagens nas redes sociais. Também precisam apresentar ao governo declarações financeiras e relatórios sobre suas atividades a cada seis meses e passar por auditorias anuais.
O Ministério da Justiça justificou a sua decisão dizendo que Muratov tinha “utilizado meios de comunicação estrangeiros para promover opiniões que visam formar uma atitude negativa em relação à política interna e externa da Rússia”.
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Reagindo à notícia de que Muratov tinha sido nomeado “agente estrangeiro”, o presidente da Fundação Nobel, Berit Reiss-Andersen, disse: “triste que as autoridades russas estejam tentando silenciá-lo. As acusações contra ele têm motivação política”.
No dia seguinte à inclusão de Muratov e outros seis russos, incluindo dois jornalistas, na lista de agentes estrangeiros, a Fundação Nobel “desconvidou” representantes russos, iranianos e bielorrussos para participar da cerimônia de entrega do prêmio deste ano.
Em 2022 eles não haviam sido convidados. Este ano os convites foram emitidos, mas estão sendo retirados.
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Perseguições ao jornal independente russo
Fundado em 1993 com ajuda do ex-presidente da União Soviética Mikhail Gorbachov, o Novaya Gazeta parou de atualizar o seu site e de imprimir novas edições em março do ano passado devido à censura que a Rússia intensificou após o início da invasão da Ucrânia.
Grande parte da equipe da Novaya Gazeta posteriormente deixou a Rússia e estabeleceu a Novaya Gazeta Europe na Letônia, com apoio de um fundo europeu para jornalismo no exílio.
O restante da equipe do jornal na Rússia começou a atualizar o site do Novaya Gazeta logo depois, o que levou o órgão de fiscalização da mídia do país, Roskomnadzor, a rescindir a licença de mídia e bloquear o acesso ao seu site na Rússia.
Muratov não deixou a Rússia. Em fevereiro de 2023, o jornal perdeu a licença de operação após um processo apoiado em alegações de falhas burocráticas.
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