Londres – Após quatro meses desaparecido em circunstâncias misteriosas e mantido incomunicável, o jornalista de TV e YouTuber Imran Riaz Khan, do Paquistão, foi libertado nesta segunda-feira, segundo informou a polícia de Sialkot e seu advogado, que postou uma foto no Twitter/X. 

O jornalista não tem parentesco com o líder político de oposição Imran Khan, mas defendeu-o publicamente e se tornou um dos alvos da repressão aos protestos pela sua prisão, em maio. 

O advogado Mian Ali Ashfaq disse que a demora em conseguir a liberdade do jornalista deveu-se ao judiciário fraco e à constituição ineficaz do Paquistão 

Jornalista desaparecido junto com chefe do canal 

Imran Riaz Khan é âncora do programa BOL News e tem mais de 5 milhões de seguidores no Twitter/X.  Ele foi detido ao mesmo tempo em que Sami Abraham, apresentador e presidente do canal, que retornou para casa dias depois. 

O jornalista tentava deixar o país depois de compartilhar uma mensagem de vídeo dizendo que o espaço para fazer seu trabalho estava diminuindo no Paquistão e que estava saindo para poder continuar. 

O seu advogado disse à imprensa que o argumento para a prisão de Khan foi a portaria de Manutenção da Ordem Pública (PMO), segundo a qual as autoridades podem prender uma pessoa e prolongar o período de tal detenção por um período não superior a seis meses de cada vez.

Começou então uma batalha que teve o pai do jornalista, Muhammad Riaz, como um dos protagonistas. 

A saga jurídica para libertar o jornalista 

O advogado relatou que Khan foi levado para a delegacia de polícia de Cantt após sua prisão e mais tarde para a prisão de Sialkot.

Em 15 de maio, um oficial disse em um tribunal que Khan havia sido libertado depois de assinar um compromisso. Mas desde então o jornalista ficou desaparecido. 

O inspetor geral da polícia de Punjab afirmou que Riaz foi “solto” e levado em uma van policial, solicitada por agentes do estado. Segundo a transcrição consultada pelo Repórteres Sem Fronteiras (RSF), as autoridades negaram saber do paradeiro do jornalista:

“Perguntamos à polícia em todo o Paquistão. Ninguém está com Imran Riaz (…). Imran Riaz Khan não era procurado. Porém, ‘agências’ pediram por uma van policial. Os motivos pelos quais eles pediram uma van policial, [a corte] pode convocar as agências e perguntar.”

O pai do jornalista fez uma denúncia de sequestro na polícia de Sialkot, apontando com responsáveis “pessoas não identificadas” e policiais. Ele também fez um requerimento ao  Tribunal Superior de Lahore para a recuperação de seu filho.

Nesta segunda-feira, a polícia de Sialkot publicou um comunicado no Twitter dizendo que Imran Riaz Khan estava seguro e com sua família. 

Em seguida, o advogado publicou a foto, em que o jornalista aparece com uma longa barba branca, diferente de sua imagem anterior. 

Imran Riaz Khan, jornalista (divulgação BOL)

A soltura foi um alívio, pois o silêncio prolongado a respeito do paradeiro do jornalista despertou medo de que ele tivesse sido assassinado, segundo a organização Repórteres Sem Fronteiras. 

Paquistão é um dos países mais perigosos para jornalistas

O Paquistão é frequentemente criticado por entidades de defesa da liberdade de imprensa por  prender jornalistas como tentativa de censura e intimidação, sobretudo após a detenção por quatro dias do ex-premiê e líder de oposição, Imran Khan, em 9 de maio.

Atualmente, o país ocupa o 150º lugar no ranking Global Press Freedom Index, índice de liberdade de imprensa em 180 países. 

Segundo a Repórteres Sem Fronteiras, responsável pela elaboração do índice, o país é um dos mais perigosos do mundo para jornalistas, com três a quatro assassinatos impunes por ano.

“Qualquer jornalista que ultrapassar os limites ditados pelo Inter-Services Public Relations (ISPR) – uma ramificação da agência de inteligência – está sujeito a ser alvo de vigilância, sequestros e detenções nas prisões do estado.”

A RSF afirma que os militares do Paquistão  atuam como um “estado dentro do estado”, frequentemente acusados de ter usado suas várias agências de inteligência e seus agentes para sequestrar jornalistas e até mesmo torturá-los enquanto estavam detidos.

Outros jornalistas presos ou desaparecidos recentemente 

O alvo anterior mais recente foi Gohar Wazir, um jornalista cujo sequestro em 19 de abril foi condenado pela RSF na época.

Repetidamente espancado e recebendo choques elétricos durante as 30 horas em que foi mantido, Wazir disse que foi liberado apenas depois de concordar em gravar um vídeo apoiando os militares paquistaneses.

A organização comparou a situação do âncora da BOL News à de Arshad Sharif, um âncora daARY News, que também apoia o ex-primeiro-ministro.

Temendo o sequestro, Sharif fugiu do Paquistão em agosto de 2022 e encontrou refúgio no Quênia, sendo morto por dois tiros disparados a curta distância em um subúrbio de Nairóbi em 23 de outubro. As evidências coletadas pela RSF apontam para a responsabilidade paquistanesa.

Na semana passada, agentes da Agência Federal de Investigação prenderam um âncora de TV baseado em Islamabad, Khalid Jamil, conhecido por criticar as autoridades, sob a acusação de espalhar informações falsas sobre instituições estatais nas redes sociais.

Nova lei permite multa e prisão de jornalistas

Após a prisão do ex-premiê paquistanês em 9 de maio, houve forte repressão à imprensa, com agressão e detenção de repórteres, incêndio a carros de reportagem e — no mais grave dos casos — o incêndio da Rádio Paquistão.

A Assembleia Nacional do Paquistão aprovou uma lei de “Desacato ao Parlamento”, que pode ser usada para punir oponentes do governo e jornalistas independentes.

Criticada por organizações de direitos humanos e de defesa da liberdade de imprensa, a lei permite que o parlamento local prescreva aos infratores até seis meses de prisão ou multa de 1 milhão de rúpias paquistanesas (equivalente a R$ 17 mil), sem necessidade de processo judicial ou investigações policiais.