Londres – Um aumento de dois pontos percentuais de um ano para outro nรฃo รฉ nada diante do desafio da diversidade de gรชnero que continua a ser enfrentado pela imprensa em 2024, apenas 24% das redaรงรตes em 12 paรญses sรฃo comandadas por mulheres, segundo o Instituto Reuters de Estudos de Jornalismo de Oxford. Eram 22% em marรงo do ano passado.
Elas tambรฉm sรฃo minoria entre os jornalistas presos, de acordo com a Repรณrteres Sem Fronteiras.
Mas foram agraciadas com cinco das nove penas de prisรฃo mais longas aplicadas a profissionais de imprensa em 2023 e 2024.
Diversidade no jornalismo, um problema global
O levantamento anual feito pelo Instituto Reuters de Estudos de Jornalismo em Oxford sobre a diversidade de gรชnero nas chefias รฉ um retrato abrangente da situaรงรฃo em 240 empresas jornalรญsticas de cinco continentes, selecionadas entre as 10 maiores online e 10 maiores offline.
O Brasil registrou um avanรงo: o percentual era de 7% em 2022 e subiu para 23% este ano. Mas ainda abaixo da mรฉdia global – e para quem jรก entrou em uma redaรงรฃo no Brasil, muito abaixo do percentual de mulheres jornalistas em atividade.
Essa รฉ uma das incoerรชncias apontadas pelos pesquisadores do Reuters, nรฃo apenas no Brasil. Embora menos de um quarto dos 174 principais editores dos 240 veรญculos pesquisados (alguns lideram mais de um veรญculo do mesmo grupo) sejam mulheres, a mรฉdia de participaรงรฃo delas na forรงa de trabalho รฉ de 40%.
Se serve de consolo, o Brasil nรฃo รฉ um dos piores. No Japรฃo, nรฃo hรก sequer uma grande redaรงรฃo liderada por uma jornalista.
Na outra ponta estรฃo os EUA, com 43% de participaรงรฃo. ร o รบnico paรญs entre os 12 analisados onde hรก proporcionalmente mais mulheres nas chefias do que o conjunto de profissionais empregados nas redaรงรตes.
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Falta de diversidade no jornalismo nรฃo reflete desigualdades do paรญs
O estudo do Reuters procurou uma correlaรงรฃo entre igualdade de gรชnero na sociedade e percentual de mulheres na chefia de redaรงรตes, e nรฃo encontrou, a exemplo dos anos anteriores. Paรญses com bons resultados no รndice de Desigualdade de Gรชnero das Naรงรตes Unidas (UN GII) tรชm relativamente poucas mulheres entre os principais editores.
Faz diferenรงa? Segundo o Reuters e muitos outros pesquisadores, sim. Assim como outras desigualdades na forรงa de trabalho, o desequilรญbrio de gรชnero pode reforรงar percepรงรตes erradas que acabam se refletindo na cobertura.
Mesmo para quem discorda dessa tese, hรก o aspecto da oportunidade profissional. Serรก mesmo que nรฃo existem mais mulheres capacitadas a chefiar redaรงรตes? Ou a prioridade estรก sendo dada a homens na hora da escolha, levando em conta outros aspectos que nรฃo a capacitaรงรฃo?
ร o que parece estar acontecendo, a despeito de todas as campanhas por inclusรฃo de gรชnero. O Reuters constatou que 15% das empresas jornalรญsticas pesquisadas mudaram suas chefias principais em 2023 e inรญcio de 2024 (os dados foram apurados em fevereiro), mas 76% delas perderam a chance de se tornarem mais inclusivas, nomeando homens e nรฃo mulheres para o cargo principal.
Prisรตes mais longas para mulheres pelo mundo
Embora as mulheres representem apenas 12,7% do total de jornalistas presos no mundo atualmente (69 mulheres e 474 homens), elas tรชm sido castigadas com sentenรงas severas.
O levantamento da Repรณrteres Sem Fronteiras aponta que 55% das penas mais longas foram aplicadas a mulheres – nรบmero recorde nos รบltimos cinco anos.
A Bielorrรบssia lidera este triste ranking. Maryna Zolatava, Liudmila Chekina e Valeriya Kastsiuhova receberam sentenรงas entre 10 e 12 anos de cadeia.
As iranianas Elahe Mohammadi e Niloofar Hamedi, que cobriram a morte da jovem curda Mahsa Amini, foram condenadas a 12 e 13 anos. Em Mianmar, a documentarista Shin Daewe pegou prisรฃo perpรฉtua.
Nesse caso, o lamento nรฃo รฉ por igualdade – ninguรฉm espera que mais homens recebam penas longas e sim que jornalistas nรฃo recebam qualquer pena de prisรฃo pelo seu trabalho. A questรฃo vai alรฉm do debate sobre diversidade no jornalismo.
Mas รฉ preocupante observar a vulnerabilidade das jornalistas mulheres que desafiaram a censura em seus paรญses e estรฃo pagando um preรงo alto por isso. Nรฃo deveria ser este o resultado de ganhar notoriedade na carreira.
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