Londres – “A transição da mídia analógica para a digital trouxe mais oportunidades para a criação e acesso a conteúdo local, mas não levou automaticamente ao consumo de conteúdos mais diversos”.  

Quem afirma é o jornalista e pesquisador Luis Albornoz, que assina o capítulo “Diversidade de Vozes na Mídia” do relatório Re/Shaping Policies For Creativity 2022, da Unesco. 

O documento analisa os avanços na implementação dos preceitos estabelecidos na Convenção de 2005 para a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, incluindo as mídias de entretenimento e de notícas. 

O que é diversidade na mídia 

A Unesco define diversidade cultural como uma “característica essencial da humanidade”, “elemento das políticas de desenvolvimento nacionais e internacionais”. 

E estabelece que a mídia precisa representar uma variedade de grupos sociais, incluindo mulheres, diferentes etnias e religiões, imigrantes, pessoas com deficiência, maiores de 50 anos e indivíduos LGBTQIA+. 

“A discriminação na mídia pode assumir muitas facetas, como preconceito na representação e também ausência ou sub-representação de certos grupos”, diz Luis Albernoz em sua análise. 

Ele aponta soluções para uma mídia mais inclusiva, como a diversidade de fontes, a redução de conglomerados controlados por grandes oligopólios, equipes menos homogêneas e conteúdos mais diversos em formato, origem demográfica e pontos de vista. 

O pesquisador, que leciona na Universidade de Madri, salienta que apesar de o debate sobre inclusão na força de trabalho ter se tornado popular porque ela seria “boa para os negócios”, a desigualdade na mídia permanece. 

O relatório da Unesco pode ser visto aqui

Por que diversidade na mídia importa para a sociedade?

Programas de inclusão em grandes organizações de mídia foram acelerados pelos movimentos Black Lives Matter e #MeTooPorém, a inclusão de todos os grupos recomendados pela Unesco não é fácil.

A começar pelo comando das redações. 

Para muitos estudiosos, diversidade faz diferença para quem vê suas chances de ascensão profissionais limitadas e também para quem consome notícias. E os líderes são a pedra fundamental. 

Em um estudo sobre o papel dos editores intitulado Out of Shadows (Fora das Sombras), o jornalista Andrew Duffy, professor da Universidade de Singapura, conceitua o profissional que lidera uma redação como “o marcador de controle de qualidade que legitima o jornalismo profissional e o diferencia de outros tipos de mídia, como informes governamentais, jornalismo cidadão, blogs e comunicados corporativos”. 

Duffy observa que o editor é o elemento de transição entre quatro universos com valores distintos: o público, a organização de mídia, o jornalismo como prática e a sociedade. 

O autor é uma das referências do Instituto Reuters para Estudos de Jornalismo em seus monitoramentos anuais de diversidade de gênero e de raça nas principais redações de cinco países, um deles o Brasil. 

Uma das métricas do acompanhamento da diversidade no comando da mídia é o tamanho da audiência que se informa por canais em que o líder principal da redação é uma mulher ou uma pessoa não branca. 

O Reuters cita Andrew Duffy para sustentar a importância tanto prática quanto simbólica de quem lidera a produção do noticiário: 

“Os editores principais são figuras essenciais na liderança e direção das redações. Eles tomam decisões importantes todos os dias, e suas experiências pessoais podem influenciar essas decisões”. 

O raciocínio se estende a toda a equipe de uma redação – do repórter que escolhe quem vai entrevistar para uma matéria sobre um crime na comunidade ao fotojornalista que faz o registro para ilustrá-la e ao diagramador que decide o corte. 

Um exemplo recente aconteceu com a ativista ambiental ugandense Vanessa Nakate, cortada de uma foto pela agência de notícias AP feita durante o fórum de Davos em 2020.

Ficaram na imagem apenas as ativistas brancas que a acompanhavam nos debates. 

Experiências pessoais e visões de mundo estão por trás de cada uma dessas pequenas (ou grandes) decisões, capazes de incluir ou excluir aos olhos do público.