A Turquia tem um novo nome, que foi aceito pela ONU (Nações Unidas) após pedido formal do governo enviado nesta semana à organização. Desde 31 de maio o país se chama oficialmente Türkiye, nomenclatura já usada e conhecida pelos turcos, mas que deverá ser adotada também por outras nações daqui para a frente.
A mudança é parte de uma campanha de rebranding proposta pelo presidente Recep Tayyip Erdogan em dezembro do ano passado. Rebranding é uma estratégia de marketing usada por empresas que querem se associar a alguma imagem diferente ou se afastar de crises.
No caso da Turquia, o motivo da mudança explicado pela emissora estatal TRT foi o fato de que em inglês, o nome “Turkey” significa peru, ave tradicional nas mesas ocidentais em festas de fim de ano, como o Natal e a Ação de Graças.
Novo nome da Turquia é estratégia de rebranding de Erdogan
O incômodo não é apenas a associação com o peru de Natal. Segundo o Cambridge English Dictionary, a palavra remete também a “algo falho” ou “uma pessoa estúpida ou tola”, afirmou a TRT.
Depois da ONU, outros órgãos internacionais serão solicitados a fazer a mudança para o novo nome da Turquia. Em português, a nomenclatura não deve mudar, já que o foco era desassociar o país da palavra em inglês.
O Peru sofre de problema semelhante em português, com o mesmo nome da ave. Mas talvez não esteja tão preocupado com isso, porque em outros idiomas mais usados em comunicações internacionais a palavra não tem o mesmo sentido.
A emissora TRG passou a usar a grafia “Türkiye” logo após que Erdogan lançou a campanha de rebranding. Apesar de o novo nome já ser usado pela maioria dos turcos, a BBC destacou que é comum muitos usarem a versão ocidental para se referir ao país.
“Türkiye é a melhor representação e expressão da cultura, civilização e valores do povo turco”, disse Erdogan em dezembro ao anunciar a decisão de trocar o nome.
A ONU disse que trocou o nome da Turquia em inglês assim que recebeu o pedido enviado por Ancara, mas a formalização aconteceu no dia 31 de maio.
No Twitter, o ministro das Relações Exteriores, Mevlüt Çavuşoğlu, compartilhou o momento da assinatura do documento para as Nações Unidas, aproveitando para passar uma mensagem nacionalista.
“O processo que iniciamos sob a liderança do nosso presidente Erdogan para aumentar o valor da marca do nosso país está chegando ao fim.
Com a carta que enviei hoje ao secretário-geral da ONU, estamos registrando o nome do nosso país em línguas estrangeiras na ONU como ‘Türkiye’.”
Ülkemizin marka değerini yükseltmek için Sayın Cumhurbaşkanımız @RTErdogan liderliğinde başlattığımız süreç nihayete eriyor.
BM Genel Sekreteri'ne bugün gönderdiğim mektupla ülkemizin BM nezdinde yabancı dillerdeki adını da "Türkiye" olarak tescil ediyoruz.
Hayırlı olsun! 🇹🇷 pic.twitter.com/Zd9UIv2eVy
— Mevlüt Çavuşoğlu (@MevlutCavusoglu) May 31, 2022
Como parte do rebranding de Erdogan, a frase “Made in Türkiye” estará presente em todos os produtos exportados. Em janeiro, uma campanha de turismo com o slogan “Hello Türkiye” já tinha sido lançada.
A mudança de nome teve reação mista dos turcos. Enquanto muitos funcionários do governo apoiam a troca, outros dizem que é uma distração ineficaz, já que o presidente se prepara para as eleições do ano que vem em meio a uma crise econômica.
Embora inusitada, a troca de nome de países não é tão incomum. Em 2020, a Holanda (em inglês, Netherlands) abandonou de vez o uso de “Holland” interna e externamente.
Antes disso, a Macedônia virou República da Macedônia do Norte, em 2019. No ano anterior, a Suazilândia, na África, virou Essuatíni.
Na História antiga, a Pérsia virou o Irã. Sião, hoje é a Tailândia; e a Rodésia mudou de nome para Zimbábue.
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Novo nome e velhas práticas contra a imprensa na Turquia
Enquanto o presidente Recep Tayyip Erdogan usa táticas modernas de marketing para criar um novo nome para a Turquia, práticas antigas ainda são usadas contra a imprensa do país.
Na semana passada, um novo projeto de lei foi apresentado no parlamento turco para punir a disseminação de “fake news” com até três anos de prisão — à semelhança do que já acontece com os profissionais de mídia na Rússia.
O partido governista AKP e o partido nacionalista MHP são os responsáveis pela proposta, que quer criminalizar a propagação de “informações enganosas que podem prejudicar a segurança da Turquia” em plataformas digitais.
Qualquer pessoa que distribua “informações falsas” sobre a segurança interna e externa, ordem pública e bem-estar da Turquia pode ser acusado de instigar “preocupação, medo e pânico” na sociedade, de acordo com o texto acessado pela Bloomberg News.
Se a informação for fornecida ou distribuída por alguém que tentou esconder sua identidade ou por uma empresa, a pena pode ser acrescida em 1 ano e meio a 4 anos e meio de prisão.
O sindicato dos jornalistas da Turquia criticou a legislação proposta e pediu sua retirada imediata:
“O projeto de lei aumentará a censura sistemática e a autocensura na Turquia, em vez de combater a desinformação.”
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Enquanto países ao redor do mundo estão introduzindo leis para combater a desinformação, não está claro como isso será definido na Turquia, disse Ozgur Ogret, representante da Turquia do Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) à Bloomberg.
O projeto restringiria “as liberdades de imprensa já problemáticas na Turquia”, acrescentou.
Nos últimos anos, o governo turco já apertou o cerco sobre o conteúdo online e as plataformas digitais, ao mesmo tempo em que restringiu anúncios oficiais e em meios de comunicação ligados à oposição.
O Índice Mundial de Liberdade de Imprensa da organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) classificou a Turquia em 149º lugar entre 180 nações, dizendo que 90% da mídia nacional está sob controle do governo.
A RSF acusou Erdogan de “intensificar os ataques a jornalistas para desviar a atenção de problemas econômicos” e outros antes das eleições de 2023.
O presidente turco também ameaçou repetidamente fechar algumas mídias sociais, citando o que ele considerava ataques pessoais contra ele e sua família.
Erdogan é um crítico feroz das plataformas de mídia social, consideradas por ele “uma ameaça à democracia” e “um problema de segurança nacional”.
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