A mĆ”quina de censura do governo da China para calar opositores nĆ£o inclui apenas perseguiĆ§Ć£o aos que publicam notĆcias desfavorĆ”veis ou crĆticas ao governo, mas tambĆ©m os que usam apelidos para se referir ao presidente Xi Jinping nas redes sociais.
Um documento interno obtido pelo portal China Digital Times, sediado nos EUA, enumera mais de 500 palavras ou expressƵes a serem monitoradas e combatidas, como “CoronaXi”, “Adolf Xitler” e “Mr. Shit Pit”. Nem a comparaĆ§Ć£o do lĆder com o simpĆ”tico Ursinho Pooh escapou da lista negra.
O arquivo de 143 pƔginas consolida mais de dois meses de anƔlises feitas a partir de postagens na Xiaohongshu, rede social chinesa semelhante ao Instagram.
Pandemia reforƧou censura na China
O documento acessado pelo China Digital Times foi elaborado por moderadores de conteĆŗdo da Xiaohongshu para uso interno. Segundo o jornal, a plataforma tem mais de 200 milhƵes de usuĆ”rios ativos mensalmente.
Os moderadores fazem buscas na rede social analisando e classificando publicaƧƵes, imagens e vĆdeos conforme seu potencial de sensibilidade para o governo chinĆŖs. O material Ć© usado como base para aƧƵes de censura.
A anĆ”lise do relatĆ³rio vazado foi feita entre 21 de fevereiro e 6 de maio de 2020 — os primeiros meses da pandemia de covid-19, que colocaram a China em destaque mundial.
Nos mais de dois meses analisados, o departamento de censura da Xiaohongshu descobriu um total de 271 tĆ³picos de opiniĆ£o pĆŗblica relacionados a Xi Jinping e acrescentou 564 palavras sensĆveis Ć lista de proibiƧƵes.
Algumas referem-se a aspectos criticados da vida na China e na longa permanĆŖncia do lĆder no poder, como”burocracia” “LĆder ao longo da vida” ou “Imperador Xi”
Entre os apelidos que incomodam Jinping estĆ£o “Rei Letal da China”, “Big Brother Xi”, “Playboy”, “Presidente bestial”, “Ursinho Pooh” e “Voz do Pooh”.
As comparaƧƵes com o personagem do desenho animado comeƧaram quando Xi visitou os EUA em 2013.
Uma imagem dele e do entĆ£o presidente Barack Obama caminhando juntos estimulou comparaƧƵes com Winnie ā um Xi corpulento ā caminhando com TigrĆ£o, um Obama magricela.
Depois de alguns anos, a brincadeira perdeu a graƧa para o lĆder da China.
Segundo o site KnowYourMeme, em 2017 um usuĆ”rio chinĆŖs do Twitter postou vĆ”rias capturas de tela das mĆdias sociais chinesas indicando que os memes comparando Xi Jinping ao Ursinho Pooh estavam sendo removidas da internet no paĆs.
VĆ”rios meios de comunicaĆ§Ć£o ocidentais contaram a histĆ³ria, relatando que menƧƵes ao Ursinho Pooh foram censuradas na rede social chinesa Weibo.
E que uma coleĆ§Ć£o de GIFs animados do Ursinho Pooh se qualquer relaĆ§Ć£o com o meme havia sido removida da plataforma WeChat, provavelmente para evitar novas criaƧƵes.
Sobrou atĆ© para a Disney. Em 2018, uma adaptaĆ§Ć£o da franquia Ursinho Pooh foi banida na China.
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AlĆ©m de acompanhar conteĆŗdos crĆticos ou em tom de brincadeira postados por usuĆ”rios, os moderadores tambĆ©m monitoram as notĆcias e tentam impedir que informaƧƵes incĆ“modas para o regime de Xi Jinping de se espalharem na rede.
O departamento de censura da Xiaohongshu definiu 10 tipos de “incidentes de opiniĆ£o pĆŗblica” relacionados a notĆcias com potencial nocivo, segundo o China Digital Times, incluindo “incidentes sociais que podem causar agitaĆ§Ć£o polĆtica e social e pĆ“r em perigo a seguranƧa nacional” e “preocupaƧƵes dos chineses sobre membros do Partido Comunista e agĆŖncias governamentais”.
“As opiniƵes pĆŗblicas sĆ£o divididas em duas categorias: ordens de censura emitidas pelo governo e ‘opiniĆ£o pĆŗblica interna’, que Ć© a autocensura ativa da Xiaohongshu”, diz o jornal.
No relatĆ³rio, os “registros de opiniĆ£o pĆŗblica” foram monitorados por mais de duas semanas em maio de 2020. Moderadores sinalizaram quais notĆcias poderiam chamar mais a atenĆ§Ć£o e gerar engajamento dos usuĆ”rios na plataforma.
Em seguida, eles destacaram manualmente palavras-chave para o algoritmo detectar assuntos relacionados com mais eficƔcia no futuro.
Nesse perĆodo analisado, uma mĆ©dia de 30 “eventos potencialmente perigosos” foram relatados por dia e receberam instruƧƵes diretas dos gerentes da rede social sobre quais medidas tomar.
Um exemplo Ć© sobre reportagens de um professor chinĆŖs que molestou mais de 20 alunos do sexo masculino em uma dĆ©cada.
Entre as orientaƧƵes, os moderadores foram solicitados a “prestar atenĆ§Ć£o Ć disseminaĆ§Ć£o do conceito de homossexualidade” e evitar associaƧƵes com outros “incidentes recentes de agressĆ£o sexual de menores.”
āEu nunca tinha ouvido falar de uma coisa dessas quando estava trabalhando no Weibo, em 2011. NĆ³s apenas recebĆamos pedidos e excluĆmos [conteĆŗdos solicitados], em vez de fazer previsƵes baseadas em tĆ³picos sensĆveisā, disse o ex-moderador de conteĆŗdo Eric Liu, em entrevista ao site americano Vice esta semana.
Liu agora trabalha como analista do China Digital Times. “Ć um passo adicional fora do processo regular de censura [do governo chinĆŖs]”, acrescentou.
A lista completa (em chinĆŖs) pode ser acessada neste link.
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China usa cidadĆ£os para atacar jornalistas
A China Ć© um notĆ³rio censor da mĆdia do paĆs. O governo supervisiona praticamente todo o conteĆŗdo publicado em qualquer meio de comunicaĆ§Ć£o.
No Ćŗltimo Ćndice Global de Liberdade de Imprensa divulgado pela organizaĆ§Ć£o RepĆ³rteres sem Fronteiras (RSF), o paĆs foi classificado em 175Āŗ lugar na avaliaĆ§Ć£o de 180 paĆses.
O aumento da censura no paĆs jĆ” tinha sido relacionado ao inĆcio da pandemia de coronavĆrus em outro relatĆ³rio recente do ComitĆŖ para a ProteĆ§Ć£o dos Jornalistas (CPJ).
Segundo o Ć³rgĆ£o relatou em junho, jornalistas estrangeiros ou atĆ© mesmo de ascendĆŖncia chinesa comeƧaram a ser atacados de forma coordenada online Ć medida que a China se tornou mais sensĆvel Ć sua imagem no exterior em meio a acusaƧƵes de que lidou mal com a covid-19.
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Como parte dessa nova tĆ”tica, veĆculos estatais e cidadĆ£os populares na rede social Weibo postam os nomes e as fotos de jornalistas estrangeiros que ādivulgam e atacam a Chinaā, chamando sua cobertura de ātendenciosaā ou ādesonestaā e fazendo ameaƧas.
Os ataques nĆ£o acontecem apenas em redes chinesas.
Uma anĆ”lise dos pesquisadores Danielle Cave e Albert Zhang, do Australian Strategic Policy Institute (ASPI) afirma que uma campanha de ataques a jornalistas mulheres que trabalham em veĆculos ocidentais estĆ” sendo conduzida por meio de uma rede de contas no Twitter chamada de āSpamouflageā, ligada ao estado chinĆŖs.
Os ataques foram admitidos pelo Twitter, que informou ter suspendido mais de 400 contas por violaĆ§Ć£o de polĆticas. O governo chinĆŖs negou envolvimento com as contas.
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