Londres – A compra do Twitter por Elon Musk não causou uma debandada de usuários provocando riscos imediatos para o futuro da empresa, como alguns chegaram a apostar – embora celebridades tenham feito barulho ao sair em protesto contra o risco de aumento na desinformação a partir do relaxamento da moderação e volta de notórios teóricos da conspiração.
No entanto, efeitos do terremoto Musk começam a se fazer sentir.
Pesquisas recentes do Pew Research Center e do Tow Center constataram respectivamente o desencanto de jornalistas e do público com o “novo Twitter”.
Futuro do Twitter: jornalistas tuitando menos
O Tow Center, que faz parte da Columbia Graduate School of Journalism, entrevistou 4 mil jornalistas de 19 veículos de imprensa dos EUA, e quantificou postagens feitas entre 1º de junho de 2022 e 30 de janeiro de 2023.
O resultado mostrou que o número médio de tweets diários caiu 3%. Pode não parecer muito, mas as quedas mais acentuadas aconteceram entre profissionais de veículos mais relevantes e confiáveis.
Apenas 10 entrevistados desativaram suas contas. Em uma entrevista para a revista Columbia Journalism Review, Darren Linvill, pesquisador e professor de mídia social da Clemson University, observou que não é tão fácil deixar a plataforma, onde profissionais de imprensa construíram redes poderosas de contato e influência.
Linvill fez uma distinção sobre deixar o Twitter e deixar ‘mesmo’ o Twitter.
“Poucas pessoas farão o encerramento dramático de suas contas, mas haverá mais pessoas que lentamente pararão de usar a plataforma”, apostou.
Foi o que a pesquisa constatou. Os que mais desaceleraram no Twitter foram os que trabalham no New York Times (6%), seguidos pelos do Los Angeles Times (5%) e os da rede pública NPR (20%).
Por outro lado, o estudo mostrou que o ambiente de vale-tudo criado por Musk estimulou profissionais que trabalham em veículos de extrema-direita a usar mais o Twitter.
Profissionais da Fox News, que tuitavam em média 3,9 vezes por dia, passaram a postar 4,4 vezes diariamente.
Entre os do RedState o aumento foi de 27%, passando de 12,8 para 16,3 tweets por dia. O campeão foi o Washington Times, cujos profissionais postaram 31% mais no Twitter.
A tendência não surpreende, visto que Elon Musk abriu os braços para figuras nocivas como o influenciador misógino britânico Andrew Tate, que está em prisão domiciliar enquanto promotores seguem com investigações sobre crimes de tráfico humano, estupro e formação de quadrilha para explorar mulheres sexualmente.
A conta está ativa, com postagens que atingem quase 1 milhão de visualizações promovendo ódio a mulheres, misticismo e promessas de ganhar dinheiro fácil.
Um exemplo de jornalista muito à vontade nesse novo Twitter é Tucker Carlson, ex-estrela da Fox News, que foi demitido depois que a emissora teve que fazer um acordo de US$ 787 milhões com a empresa de urnas eletrônicas Dominion, que a processava por difamação.
Duas semanas depois de ser dispensado, Carlson anunciou que vai se estabelecer profissionalmente no Twitter, em vez de aceitar convites de outras redes de extrema direita.
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Não é difícil imaginar o motivo. Ele sabe que no Twitter sob Musk não será incomodado quando vociferar contra vacinas para a covid ou sugerir que as eleições que deram a vitória a Joe Biden foram fraudadas.
Alguns jornalistas optaram por redes alternativas, como a Mastodon, que não decolaram. Outros decidiram transformar suas contas em privadas, como o próprio reitor da escola de jornalismo de Columbia, Jelani Cobb.
O número dos que deixaram a plataforma ou passaram a tuitar menos não é suficiente para quebrar o Twitter.
Mas é suficiente para confirmar a tese de que a rede social mais importante para o jornalismo em vários países, sobretudo nos EUA, perde na qualidade e na confiabilidade do conteúdo.
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Em outra pesquisa, desencanto do público com o Twitter
Saindo do mundo do jornalismo, usuários comuns também demonstram não estar tão à vontade nesse novo Twitter, segundo pesquisa do Pew Research Center feita em março.
Seis em cada dez americanos que usaram o Twitter nos últimos 12 meses dizem que fizeram uma pausa na plataforma por algum tempo.
Os pesquisadores também indagaram sobre a intenção de continuar no Twitter nos próximos 12 meses, constatando um comportamento parecido com o dos jornalistas.
Setenta por cento dos usuários Republicanos disseram estar propensos ou extremamente propensos a continuar na plataforma. Entre os Democratas, a taxa cai para 53%.
O lançamento da candidatura de Ron DeSantis no Twitter deve servir para aprofundar ainda mais essas diferenças partidárias na plataforma, afetando a pluralidade de opiniões.
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