Londres – Em meio a tantas restrições à liberdade de imprensa na Ásia, veio do Paquistão uma boa notícia: o Senado do país aprovou uma nova lei de proteção a jornalistas e profissionais de mídia, destinada a garantir segurança, privacidade, sigilo das fontes e independência no exercício das funções profissionais.

O projeto de lei foi proposto pela Ministra dos Direitos Humanos, Shireen Mazari, em maio. Depois de aprovado pela Assembleia Nacional, foi referendado pela câmara alta do Parlamento no dia 19 de novembro.

A iniciativa segue na contramão de vários países vizinhos. Em outubro deste ano, a China anunciou um veto a investimentos privados na mídia de notícias, depois de divulgar uma série de proibições ligadas à prática do jornalismo, entre elas a das transmissões ao vivo por veículos privados. Restrições também sufocam a imprensa em Mianmar, Singapura e Índia. 

Suspensão das redes sociais 

No entanto, o Paquistão também foi tem sido criticado por atos que procuraram sufocar o direito de livre expressão. Em maio passado, o governo suspendeu temporariamente o acesso da população às mídias sociais. 

O objetivo alegado foi o de restabelecer a ordem e evitar conflitos durante as orações do dia, depois de vários dias de protestos violentos contra a prisão de Saad Rizvi, líder do partido islâmico e de ultradireita Tehreek-i-Labbaik Paquistão (TLP).

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Nova lei de mídia não agradou a todos 

A Ministra Federal dos Direitos Humanos classificou  a ‘Lei de Proteção de Jornalistas e Profissionais da Mídia’ uma conquista histórica do atual governo, pois incluiu contribuições de todos os principais órgãos de imprensa e jornalistas experientes. 

Falando em uma conferência sobre segurança de dados no ambiente digital no país, ela destacou que “o direito à privacidade é um direito humano fundamental, mas precisa ser equilibrado com outros direitos concorrentes”.

Apesar de ser vista por muitos como um avanço, a nova lei de mídia do Paquistão não agradou a todos. Alguns membros da oposição, mesmo sendo a favor do projeto de lei, reclamaram que o governo e o presidente do Senado, Sadiq Sanjrani, não o enviaram para avaliação e contribuições de outros partidos políticos e da comunidade jornalística, como afirmou a ministra. 

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Embora seja uma lei que beneficia a prática jornalística, o artigo 6 vem preocupando as entidades profissionais.

Ele diz que jornalistas e trabalhadores da mídia não devem “produzir material que possa incitar discriminação, hostilidade ou violência, bem como a mídia não deve se envolver na divulgação de material conhecido por tais indivíduo ser falso.”

E afirma que o descumprimento das obrigações resultará em ação judicial “de acordo com as leis pertinentes”.

O secretário-geral da União de Jornalistas, Nasir Zaidi, afirmou que a cláusula poderia ser usada por qualquer governo para incriminar jornalistas e deveria ter sido emendada.  

“Essas são linhas tênues que sempre são colocadas em tais leis que podem ser usadas contra qualquer indivíduo ou organização”, disse em um comunicado. 

Federação de Jornalistas pede participação 

Para a Federação Internacional dos Jornalistas (IFJ), a participação é necessária para salvaguardar os direitos dos profissionais no Paquistão e a remuneração justa.

“A IFJ demanda que o governo do Paquistão abra espaço para o pluralismo e o diálogo com as comunidades de jornalistas para garantir que este projeto cumpra sua promessa plena. O verdadeiro trabalho começa agora.”

A PFUJ afirmou ter pressionado ministros para que estabeleçam o mais rápido possível uma comissão independente que assegure a segurança física e o pagamento regular de jornalistas em todo o país, “para que a comunidade jornalística possa realizar seus deveres profissionais com responsabilidades e desempenhar seu papel no desenvolvimento do país e da indústria da mídia. 

Desigualdade de gênero

Segundo a IFJ, mesmo com a preocupação do Paquistão em proteger os direitos das mulheres e de profissionais de mídia, jornalistas mulheres continuam a ser negligenciadas e subestimadas.

No país, as leis e políticas relativas ao trabalho não conseguem garantir a provisão de direitos básicos para as mulheres jornalistas, como banheiros separados no local de trabalho, licença maternidade e creche.

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A Federação afirma ainda que elas também enfrentam discriminação em  salários e colocações. Os homens tendem a obter cargos de tomada de decisão, enquanto as mulheres ficam com empregos menos importantes.  

Liberdade de imprensa na Ásia

Ainda assim, o Paquistão pode ser considerado progressista perto de outros vizinhos. O país abrigou muitos profissionais de imprensa que fugiram da perseguição do Talibã depois que o grupo extremista tomou o comando do país.

A nação asiática que mais restringe a liberdade de imprensa sem estar em conflito (como Iêmen, Mianmar ou o Afeganistão) é de longe a China.

Além do veto a investimentos privados na mídia de notícias, o país já havia expulsado jornalistas estrangeiros, banido transmissões da BBC e pressionado o LinkedIn a suspender perfis de profissionais de mídia, fazendo a plataforma deixar o país.

Em seguida, o Yahoo também deixou a China. 

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Classificado em 177º lugar entre 180 países no Índice de Liberdade de Imprensa Mundial da RSF de 2021, publicado em abril, a China é a nação que mais prende jornalistas, com pelo menos 122 detidos.

Em Miamnar, uma anistia a presos políticos anunciada pela junta militar responsável pelo golpe no País, que governa desde fevereiro, beneficiou 13 jornalistas e profissionais que trabalham na mídia, mas muitos seguiram presos. 

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No início de novembro, a junta libertou o jornalista americano Danny Fenster e o entregou às autoridades de seu país,  depois de mantê-lo por mais de cinco meses na prisão de Insein. Sua libertação se deu três dias depois de ele ter sido condenado a 11 anos de prisão por um tribunal militar.

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