Londres –Com o fim de 2021 se aproximando, as principais entidades de defesa da liberdade de imprensa internacionais fecharam na última semana as estatísticas de jornalistas assasinados e presos em todo o mundo.
Embora elas adotem critérios diferentes, a conclusão é de que mais profissionais de imprensa encontram-se atrás das grades neste momento em comparação a dezembro do ano passado, enquanto menos perderam a vida devido ao seu trabalho em 2021. Mas ainda assim o número de perdas é alto, variando entre 46 e 77, dependendo da metodologia.
O consenso entre as instituições é que a China continua como a maior carcereira de jornalistas. México e Afeganistão destacam-se em várias contagens como nações com mais mortes violentas, mostrando que um país cujo poder foi tomado à força por um grupo extremista pode ser tão mortal para a liberdade de imprensa quanto um regime democrático assolado pela ação de facções criminosas.
Os critérios adotados pelas organizações
A forma de contabilizar profissionais e imprensa mortos e encarcerados varia. Algumas organizações internacionais listam unicamente os casos em que autoridades comprovaram a motivação do crime, enquanto outras somam os episódios em que evidências apontam para associação com o trabalho de reportagem, mesmo que ainda sem indiciamento formal ou punição de autores.
Outra diferença é quanto ao critério de inclusão.
As listas podem conter apenas repórteres e fotógrafos que trabalham em organizações de mídia tradicionais, ou ser ampliada para abranger jornalistas cidadãos (como blogueiros e donos de canais no YouTube) e profissionais que auxiliam os jornalistas, como tradutores e os chamados “fixers”.
Eles são jornalistas principalmente locais em regiões de conflito, remotas ou com idiomas não dominados pela maioria dos repórteres, encarregados de fazer apurações, conseguir autorizações e estabelecer conexão entre o correspondente e entrevistados ou informantes.
O Brasil não aparece entre as nações com mais representantes da mídia mortos ou presos em 2021, mas figura entre os principais onde perseguições jurídicas e ameaças se intensificaram.
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Números não incluem jornalistas mortos por coronavírus
A contagem de perdas na imprensa em 2021 não inclui os profissionais vítimas do coronavírus.
Segundo a PEC Emblem Campaign, organização com sede em Genebra que vem acompanhando a situação desde o início da pandemia, até o momento são 1.924 em 92 países.
O Brasil registra o maior número de fatalidades (293). Em seguida aparecem Índia, Peru, México e Colômbia.
Alguns contraíram o vírus no trabalho, mas nem todas as mortes são diretamente relacionadas ao trabalho. Em alguns casos eram profissionais que não estavam na linha de frente e podem ter se contaminado em outras atividades.
A entidade contabiliza também as fatalidades de jornalistas por outras causas, que pelas suas contas totalizam 77 no ano, em 28 nações.
No registro da PEC, o Afeganistão concentra o maior número de mortes, um total de 12, vindo em seguida o México com 10, e depois Paquistão (7), India (6), Filipinas (4), Iêmen (4) e Congo (3).
Repórteres Sem Fronteiras: 46 jornalistas assassinados em 2021
Já a Repórteres Sem Fronteiras, com sede na França e responsável pelo publicação de um índice anual de liberdade de imprensa cobrindo 180 países, contou 46 profissionais de imprensa assassinados em 2021.
A entidade afirma em seu relatório deste ano que inclui os que tiveram a morte comprovadamente resultante do trabalho, seja como alvo de ataques em represália a denúncias ou durante coberturas de guerras e conflitos. São registrados ainda na lista da RSF jornalistas cidadãos e profissionais de apoio ao trabalho da imprensa.
Embora a quantidade de jornalistas assassinados em 2021 segundo a RSF esteja no seu nível mais baixo em 20 anos, ela ainda representa média de quase uma perda por semana.
México e Afeganistão, os países mais mortíferos para a imprensa
O número total pode variar entre as duas entidades, mas ambas estão de acordo que México e Afeganistão foram os locais mais mortais para a imprensa em 2021.
Segundo a RSF, foram sete jornalistas assassinados no México e seis no Afeganistão em 2021.
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O drama vem de longe. Nos últimos cinco anos, as duas nações foram os que mais registraram perdas de profissionais de imprensa.
Iêmen e Índia compartilham o terceiro lugar, com quatro jornalistas assassinados em cada país em 2021. Os casos se acumulam.
Em novembro, Rasha Abdullah al-Harazi, de 27 anos, e o bebê que esperava foram vítimas de uma bomba colocada no carro de seu marido, o também jornalista Mahoud-Atmi, no Iêmen. A suspeita é de que o crime tenha sido praticado rebeldes Houthi apoiados pelo Irã, mas nenhum grupo reivindicou autoria.
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Dos que perderam a vida este ano, 65% foram vítimas de ataques diretos, enquanto os demais sucumbiram durante coberturas, segundo apurou a organização.
Também o Centro de Proteção a Jornalistas, baseado os Estados Unidos, aponta o México como “o país mais mortífero para os jornalistas no hemisfério ocidental”.
A entidade considera três assassinatos comprovadamente associados ao trabalho de reportagem e lista outros seis homicídios ainda sob investigação.
Pela contagem do CPJ, em 2021 foram 24 os crimes tendo jornalistas como alvo e comprovadamente em associação com seu trabalho.
Mas o número sobe para 42 quando são somados os que o centro considera não haver ainda confirmação sobre os motivos, chegando dessa forma perto da contagem da RSF.
O acompanhamento do CPJ é feito desde 1992, e mostra que 2007 foi o ano mais fatal para a mídia, com 112 jornalistas assassinados, incluindo casos confirmados e não confirmados e perdas de profissionais de apoio.
E a proporção de assassinatos em comparação a mortes acidentais durante coberturas em 2021 foi de 80%, maior do que a apontada pela Repórteres Sem Fronteiras, demonstrando o aumento dos ataques direcionados.
A instituição salienta que tanto em regimes democráticos como autoritários, o ciclo de impunidade permanece, “mandando o recado inquietante de que os perpetradores não serão responsabilizados”.
Federação Internacional de Jornalistas listou 45 mortes
A Federação Internacional de Jornalistas (IFJ), que reúne sindicatos de profissionais de imprensa em todo o mundo e no Brasil é representada pela Fenaj (Federação Nacional de Jornalistas) também divulgou seu balanço de jornalistas assassinados, apontando 45 perdas em 2021.
Segundo a IFJ, 365 profissionais de imprensa estavam atrás das grades até o dia 10 de dezembro, quando o levantamento foi publicado. Do total, 83 foram presos este ano, enquanto os demais estão na cadeia há mais tempo.
Recorde de jornalistas presos em 2021
O CPJ e a RSF também estão de acordo ao afirmar que 2021 termina batendo recorde de jornalistas aprisionados, ainda que utilizando metodologias diferentes.
Para o primeiro, o total é de 293, “resultado da a agitação política e a repressão da imprensa refletindo a crescente intolerância por reportagens independentes em todo o mundo”.
A Repórteres Sem Fronteiras registra 488 casos, incluindo 60 mulheres. O número é 20% maior do que em 2020, e o mais alto desde que a RSF começou a acompanhar a situação, em 1995.
Além dos jornalistas presos, outros 65 são mantidos reféns, segundo a ONG.
Todas as organizações apontam a China como a nação que mais prende profissionais de imprensa. As perseguições ao jornalismo agravaram-se este ano, com o governo investindo contra jornalistas locais correspondentes estrangeiros baseados no país, assim como também vem fazendo a Rússia.
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O CPJ documentou 50 profissionais atrás das grades no país asiático, que se prepara para receber os Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim, em fevereiro de 2022.
Em seguida está Mianmar (26), que prendeu dezenas de repórteres em uma onda de repressão após o golpe militar de 1º de fevereiro; depois Egito (25), Vietnã (23) e Belarus (19).
No dia 10 de dezembro, um fotógrafo tornou-se o primeiro profissional de imprensa a morrer sob custódia do governo em Mianmar, depois de ser capturado quando documentava protestos no Dia Internacional dos Direitos Humanos.
O Centro ressalta que pela primeira vez seu censo inclui jornalistas aprisionados em Hong Kong, como o fundador do jornal Apple Daily, Jimmy Lai. O veículo foi fechado depois de perseguições incluindo batidas policiais e ações fiscais, e ele já sofreu várias condenações.
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O CPJ observa que na Etiópia, a escalada da guerra civil provocou novas restrições à imprensa, fazendo o país ocupar o posto de segundo maior carcereiro de jornalistas na África subsaariana, depois da Eritreia.
Também para a RSF o avanço das violações à liberdade de imprensa está diretamente associado aos regimes autoritários.
“O número extremamente alto de jornalistas em detenção arbitrária é obra de três regimes ditatoriais”, disse o secretário-geral da RSF, Christophe Deloire, referindo-se à China, Mianmar e Belarus.
Para ele, a situação é “um reflexo do reforço do poder ditatorial em todo o mundo, do acúmulo de crises e da falta de escrúpulos por parte desses regimes”.
“E também pode ser o resultado de novas relações geopolíticas de poder, nas quais os regimes autoritários não estão sendo pressionados o suficiente para conter a repressão”, afirmou.
Relatório detalhado de violações da liberdade de imprensa
Entre todas as entidades que acompanham as ameaças à liberdade de imprensa, a Repórteres Sem Fronteiras é a que faz a análise mais detalhada, com um relatório destacando os casos mais notórios e descrevendo as perseguições sofridas por profissionais em vários países.
Na semana em que o estudo deste ano foi divulgado, o fundador do Wikileaks, Julian Assange, teve a sentença que impedia sua extradição para os EUA a fim de responder a processos por espionagem anulada pela Suprema Corte britânica.
Três dias depois da publicação do relatório, uma das mencionadas no levantamento, a vietnamita Pham Doan Trang, foi condenada a nove anos de prisão por ameaça ao regime.
Aos 43 anos, a jornalista e ativista havia sido premiada em 2019 pela RSF por sua luta pela liberdade de imprensa.
A sentença revoltou as entidades e teve reação até do Departamento de Estado Americano, que emitiu uma nota de repúdio ao governo do Vietnã.
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