A comunidade internacional precisa se posicionar para exigir do governo de Cuba o fim da perseguição a jornalistas, defensores dos direitos humanos e demais cidadãos contrários ao regime de Miguel Díaz-Canel.

É o que pede uma carta aberta da Coalición por la Libertad de Asociación, que reúne 21 organizações civis latino-americanas, divulgada ao mesmo tempo em que o Supremo Tribunal do país condenou (na quarta-feira, 16) 128 cubanos que participaram dos protestos de julho do ano passado. 

O documento é assinado por profissionais de imprensa de diversos países da América Central e do Sul, incluindo do Brasil, e ex-integrantes da Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

Além de jornalistas, Cuba censura cidadãos comuns

Em julho do ano passado, Cuba registrou a maior onda de protestos no país desde os anos 1990, quando houve a queda da União Soviética.

Na ocasião, os cubanos foram às ruas protestar contra a carência de alimentos e da falta de vacinas contra a covid-19. O país manteve a pandemia sob controle no primeiro ano, mas viveu um período de agravamento no segundo semestre de 2021.

As manifestações terminaram com dezenas de jornalistas e ativistas presos. Um mês depois, o governo publicou novos regulamentos sobre o uso das redes sociais e da internet, considerando atos de incitação popular “que alteram a ordem pública” um crime.

Na série de condenações anunciada nesta quarta-feira, foram aplicadas penas de 6 a 10 anos de prisão aos manifestantes.  

Críticos apontaram que o objetivo do governo de Miguel Díaz-Canel era reprimir a dissidência política, uma vez que as redes foram grande veículo de mobilização para protestos que tomaram o país.

Quase um ano depois das manifestações, a carta da Coalición por la Libertad de Asociación sinaliza que pouco mudou no país com relação à liberdade de expressão dos cidadãos cubanos.

Por isso, a Coalición por la Libertad de Asociación pede ações dos demais países para assegurar as liberdades individuais em Cuba:

“A comunidade internacional [precisa] adotar medidas concretas medidas exigindo que o governo cubano ponha fim à repressão, prisões arbitrárias e perseguições sistemáticas contra jornalistas independentes, ativistas de direitos humanos, usuários de redes sociais e cidadãos em geral que exigem mudanças nas normas vigentes no exercício de seus direitos à liberdade de expressão, além dos direitos de reunião, manifestação e associação para fins lícitos e pacíficos estabelecidos na Constituição cubana aprovada em 2019″.

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Criada em fevereiro de 2021, a coalizão foi formada com o objetivo de exigir de forma coordenada o reconhecimento do direito à liberdade de associação em países onde há severas restrições. O trabalho concentrou-se inicialmente na América Latina e no Caribe.

O documento aberto denuncia que o Estado cubano restringe severamente os direitos à liberdade de expressão, associação, reunião e movimento espontâneo da população.

Trecho de relatório sobre a liberdade de expressão em Cuba publicado pela Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da CIDH, em 2018, diz:

“Durante décadas, o Estado cubano organizou a máquina institucional para silenciar vozes fora do regime, reprimir jornalistas independentes, bem como artistas ou cidadãos que buscam se organizar para articular suas demandas. Durante todo esse tempo, o Estado manteve o monopólio dos meios de comunicação social.”

Protestos pioraram repressão em Cuba

Na carta, a Coalición por la Libertad de Asociación também denuncia que a repressão contra os cubanos opositores do governo se intensificou depois das manifestações de julho de 2021.

Relatório da CIDH, em fevereiro, revelou que mais de 700 pessoas ainda estavam presas em Cuba por participação nos protestos.

A CIDH indicou que, segundo informações oficiais de 24 de janeiro, a Procuradoria-Geral de Cuba registrou um total de 790 pessoas acusadas de “atos de vandalismo, que atacaram autoridades, pessoas e bens, além de graves distúrbios de ordem.”

Além disso, sanções de até 30 anos de prisão seriam impostas dependendo da gravidade dos fatos, alertou a entidade.

As prisões, no entanto, não cessaram após os protestos e cubanos ainda são presos por posições contrárias à ditadura do país.

A coalizão instou que o governo  libertasse imediatamente o jornalista independente Lázaro Yuri Valle Roca e o youtuber Yoandi Montiel (conhecido como “El Gato de Cuba”), que estão detidos arbitrariamente há vários meses pelo crime de desacato por exercerem seus direitos à liberdade de expressão.

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“De fato, as autoridades aumentaram as restrições com base em novas regulamentações sobre telecomunicações, buscando reforçar a censura à informação e ampliar o controle oficial”, diz o documento.

Na prática, as novas leis para as mídias sociais instauradas após os protestos de 2021 criminalizaram o ato de compartilhar informações “falsas” e “ofensivas” na internet e ampliaram os poderes das autoridades para restringir a liberdade de expressão no ciberespaço, denuncia a coalizão.

“Os regulamentos não definem os termos ‘informação falsa’ ou outros como ‘segurança coletiva, bem-estar geral e moralidade pública’, mas buscam claramente fortalecer o controle governamental sobre o conteúdo das redes sociais.”

Censura em Cuba ameaça jornalistas independentes

O documento divulgado pela Coalición por la Libertad de Asociación também aponta que o  provedor estatal cubano de serviços de internet, ETECSA, bloqueia conteúdos e impede o acesso a alguns blogs e plataformas de notícias críticas ao governo.

“As autoridades visam jornalistas críticos, ativistas pacíficos e dissidentes políticos por meio de intimidação, assédio, vigilância física e digital, prisões arbitrárias, buscas domiciliares e confisco de equipamentos. Em muitas ocasiões, jornalistas, ativistas e dissidentes são forçados ao exílio.”

Em novo movimento para aumentar a repressão no país, a coalizão aponta que, em janeiro, o Supremo Tribunal de Cuba apresentou um projeto de lei que modificará o Código Penal para proibir os cidadãos cubanos de receberem fundos estrangeiros sob pena de até 10 anos de prisão.

A medida permitirá às autoridades amordaçar a imprensa independente que depende desse tipo de financiamento para realizar suas atividades.

Em meio a todas essas ameaças às liberdades individuais dos cidadãos de Cuba, a Coalición por la Libertad de Asociación pede solidariedade internacional das demais nações para pressionar o governo de Miguel Díaz-Canel a ceder na censura e repressão ao povo.

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