Londres – O ataque militar dos Estados Unidos contra instalações nucleares do Irã na madrugada deste domingo (22) foi justificado pelo temor de o conflito com Israel escalar para uma guerra nuclear – mas para os cientistas que atualizam o Relógio do Juízo Final anualmente, esse risco não é novidade e os EUA são parte dele.

Em janeiro, ao mover os ponteiros para apenas 89 segundos antes da meia-noite, eles citaram diretamente o Irã, os EUA e outras potências nucleares como ameaças ativas à sobrevivência global.

Em seu comunicado explicando o motivo da hora, o Bulletin of the Atomic Scientists foi claro: o programa nuclear do Irã era motivo de “profunda preocupação”, e os EUA já não podiam ser vistos como uma voz de cautela ou de moderação nuclear.  

Relógio do Juízo Final nasceu do medo de outra guerra nuclear 

Criado em 1947 por cientistas preocupados com a proliferação nuclear, o Relógio do Juízo Final (ou Doomsday Clock) é um símbolo visual que expressa o quanto a humanidade está perto de uma catástrofe criada por ela própria. 

Ele é ajustado anualmente e considera três grandes ameaças globais: guerra nuclear, crise climática e avanços tecnológicos descontrolados.

Quanto mais perto da meia-noite, maior é o risco percebido de colapso da civilização. E em 2025, ele chegou ao ponto mais perto desde a sua criação. 

O Irã no radar do Relógio do Juízo Final 2025  

Na análise sobre os riscos nucleares da edição deste ano, divulgada em janeiro, os cientistas alertaram para a ameaça à estabilidade regional representada pelo acúmulo de urânio altamente enriquecido próximo ao grau militar no Irã, e a possibilidade de uma ruptura com o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP). 

O boletim observou que ainda que desde abril de 2024, Israel e o Irã já estavam realizando ataques diretos de mísseis e drones, e havia preocupações de que as instalações nucleares pudessem ser alvo de ataques – como o que acabou de ser feito pelos EUA -, o que poderia agravar rapidamente a crise. 

Os cientistas advertiam que, caso o Irã avançasse em direção à bomba, haveria risco de uma corrida armamentista no Oriente Médio, pressionando países como Arábia Saudita e Turquia a desenvolverem seus próprios arsenais.

O documento cita uma declaração do diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica, Rafael Mariano Grossi, informando que a AIEA havia “perdido a continuidade do conhecimento” no que diz respeito a equipamentos e materiais importantes no programa nuclear do Irã.

Grossi também disse que estava buscando conversas com o novo presidente do Irã, Masoud Pezeshkian, que se ofereceu para abrir novas negociações nucleares com os Estados Unidos e os seus parceiros em troca do levantamento das sanções que paralisaram a economia do país.

Doomsday Clock 2025: os EUA também sob alerta nuclear

Embora o Irã tenha sido apontado como um foco de risco, os Estados Unidos — que lideraram o ataque desta madrugada sob argumento de evitar o risco de uma guerra nuclear— também foram criticados na análise. 

O país que hoje se apresenta como força de contenção dos riscos oferecidos pelo Irã é, na verdade, também uma parte central do problema nuclear global identificado pelo Relógio do Juízo Final 2025.

O Bulletin destacou que os EUA, ao lado de Rússia e China, continuam modernizando seus arsenais nucleares, desenvolvendo novas ogivas, submarinos estratégicos e tecnologias militares avançadas.

“Há muito tempo um motor no esforço para prevenir o uso de armas nucleares, reduzir os riscos nucleares e buscar reduções de arsenal nuclear, os Estados Unidos embarcaram na modernização nuclear mais cara do mundo, e os resultados das eleições de 2024 sugerem que os Estados Unidos prosseguirão um programa de investimento nuclear mais rápido e expansivo.”

O relatório previu que os Estados Unidos poderiam expandir seus esforços nucleares para incluir mais opções, atuar de forma mais ousada para alcançar seus objetivos de segurança e dissuasão, e evitar esforços comprovados para reduzir os perigos nucleares.

“Os Estados Unidos são agora parceiros de pleno direito numa corrida armamentista nuclear mundial”, diz o documento. 

Ataque ao Irã em 2025 confirma os alertas do Doomsday Clock

O ataque com bombas bunker e mísseis às instalações de Fordow, Natanz e Isfahan não surpreende os que acompanham os relatórios do Bulletin.

Ele representa, na prática, a materialização de um cenário que os cientistas já consideravam provável: o aumento do risco nuclear provocado tanto pela proliferação quanto pela deterioração da diplomacia internacional.

O boletim de janeiro também apontava o uso militar de inteligência artificial, a intensificação da guerra na Ucrânia e o fracasso global em conter as mudanças climáticas como sinais de um mundo à beira do colapso.

A mensagem dos cientistas foi clara: os líderes mundiais — especialmente dos Estados Unidos, China e Rússia — deveriam agir com urgência para reduzir as tensões e restabelecer acordos internacionais de segurança.