Londres – O Paquistão, que inicialmente acolheu dissidentes e jornalistas críticos do Talibã após a retomada do poder pelo grupo no Afeganistão, em 2021, está sob pressão internacional para rever a decisão de deportar em massa afegãos que não possuem documentos de permanência no país.
O Ministério do Interior deu prazo até 1º de novembro para que milhares deles deixem o Paquistão, incluindo mais de 200 jornalistas, segundo a organização de liberdade de imprensa Repórteres Sem Fronteiras (RSF).
“Enviar estes jornalistas de volta ao Afeganistão colocaria as suas vidas em perigo”, afirma a RSF, instando as autoridades paquistanesas a deixá-los permanecer e a garantir a sua segurança.
O jornalismo independente foi praticamente dizimado no Afeganistão nesses dois anos de controle do país pelo Talibã, que reassumiu o poder em agosto de 2021.
Um balanço feito pela Federação Internacional de Jornalistas (IFJ, na sigla em inglês), apontou que a crise econômica e o medo provocaram o desaparecimento em massa de veículos de imprensa. O número de profissionais caiu 40%. Dos que continuaram na atividade, apenas 15% são mulheres.
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Dificuldades no Paquistão começaram antes da ordem de deportação
Na época da tomada do poder pelo Talibã, jornalistas emigraram em massa para o Paquistão, alguns contando com apoio de organizações de liberdade de imprensa para se instalar e fazer pedidos de residência.
Mas depois de alguns meses vários começaram a enfrentar dificuldades.
Em julho deste ano, a Federação Internacional de Jornalistas relatou que Mohammad Tahir, repórter da TV One, foi detido em Islamabad por não ter um visto válido e libertado mediante pagamento do que foi interpretado como um resgate após sequestro.
Agora, os profissionais de imprensa estão entre cerca de 2 milhões de afegãos obrigados a deixar o país pelo governo paquistanês, e podem sofrer represálias ao serem deportados do Paquistão por seu trabalho e postura crítica ao regime Talibã.
Na semana passada, o Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos pede às autoridades paquistanesas que suspendam os regressos forçados de cidadãos afegãos antes que seja “tarde demais para evitar uma catástrofe de direitos humanos”.
Segundo a Repórteres Sem Fronteiras, que conversou com alguns desses jornalistas, eles estão sendo submetidos a assédio e extorsão por parte de agentes da polícia paquistanesa, a detenções arbitrárias, a pressões sobre os proprietários para os expulsarem de imóveis alugados e a procedimentos intermináveis de pedido de visto.
A RSF afirma que a deportação seria “uma violação flagrante do direito internacional e completamente inaceitável”, pois esses jornalistas, alguns tendo publicado informações sensíveis, “foram frequentemente alvo de ameaças e procuraram refúgio no Paquistão para salvar as suas vidas”.
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O que dizem os jornalistas ameaçados de serem deportados
“Um regresso forçado ao Afeganistão equivaleria a mandar-nos para o matadouro ”, disse uma jornalista afegã que fugiu para o Paquistão em setembro de 2022 e que pediu para não ser identificado por razões de segurança.
Atuando como “fixer” (jornalista local que apoia equipes de reportagens estrangeiras) no Afeganistão para muitos meios de comunicação internacionais, ela fugiu depois de ser ameaçada pelas autoridades talibãs devido a reportagens transmitidas por um dos canais de televisão estrangeiros para o qual trabalhava .
Embora tenha uma autorização de residência temporária, ele vem sendo assediada pela polícia paquistanesa e teme ser expulsa.
“Estou sendo processada no meu país sob a acusação de espionagem para meios de comunicação estrangeiros, sabotagem e propaganda negativa, bem como de apoio aos direitos das mulheres. A morte me espera lá .”
Outro jornalista, que também pediu anonimato, disse à RSF que teve de fugir para o Paquistão em julho de 2022, depois de reportagens envolvendo violência talibã, especialmente contra mulheres.
Ele foi avisado no último minuto de que um grupo armado ligado ao governo talibã planejava matá-lo
“ Tive de deixar o meu país para continuar vivo.
Depois de sair, o regime prendeu vários membros da minha família. Se eu voltar para lá, correrei o risco de morrer .”
Um terceiro jornalista relatou que foi preso e torturado duas vezes no Afeganistão depois de Cabul ter caído nas mãos dos talibãs em agosto de 2021.
“Em janeiro de 2022, os meus antigos torturadores localizaram a minha nova casa e me feriram gravemente na cabeça e no pescoço.”
Ele finalmente conseguiu escapar para o Paquistão em março de 2022, depois de passar várias semanas escondido. Mas agora ele está traumatizado.
“ Se a polícia paquistanesa me deportar, a minha vida correrá grande perigo ”, disse ele.
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‘Pressão insuportável’ em solo paquistanês
Um jornalista radicado no norte do Afeganistão que fugiu para o Paquistão em junho de 2022 depois de ser ameaçado e preso diversas vezes em conexão com seu trabalho para um canal de TV estrangeiro disse à RSF que já havia sido vítima do assédio crescente de afegãos indocumentados um ano depois de chegada.
Funcionários da inteligência paquistanesa o detiveram por cinco horas e revistaram seu telefone e e-mails.
“Minha existência diária está se tornando cada vez mais insuportável”, disse ele à RSF.
Segundo a organização, o profissional “já não se atreve a sair de casa”, seus dois filhos não podem ir à escola, a sua mulher apresenta sinais crescentes de stress psicológico. O proprietário do prédio onde vivem disse-lhes recentemente que teriam que sair.
O jornalista fez um apelo a outros países:
“ Imploro aos países que são conhecidos por acolher refugiados que forneçam a sua ajuda agora àqueles de nós que estão em perigo.
Peço-lhes que tomem medidas e nos salvem. No meu país, corro o risco de ser morto. Falta pouco tempo para que comece a expulsão real dos afegãos sem documentos de permanência.”
Em um relatório recente, a Repórteres Sem Fronteiras apontou o Afeganistão como um dos países com mais jornalistas exilados no mundo.
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