As mulheres sabem há décadas que envelhecer naturalmente é visto como inaceitável: as mais velhas são menos retratadas na tela em comparação com as mais jovens.
Além disso, mulheres maduras são frequentemente elogiadas por sua aparência não apresentar sinais da idade.
Recentemente, no entanto, há uma tendência de que parecer envelhecer de forma não natural, ou “muito cedo”, também é visto como um fracasso, soando como um lembrete sobre os padrões de beleza impossíveis.
Millie Bobby Brown: envelhecimento e expectativas irreais da mídia
No início de março, a atriz Millie Bobby Brown, de 21 anos, reclamou de “bullying” por parte de jornalistas, depois que matérias e comentários nas redes sociais a acusaram de parecer velha demais para sua idade.

Tendo despontado como uma estrela infantil, Brown tem uma imagem diferente da que tinha no início da carreira, o que causou reações negativas.
A resposta do público sobre o fato de Brown ter tido a audácia de crescer e envelhecer além da adolescência revela como a sociedade exige que as mulheres não sejam apenas jovens, mas que pareçam assim para sempre.
A mídia social e a pressão por juventude permanente
Minha pesquisa acadêmica tem se concentrado em analisar como as mulheres representam a feminilidade (e navegam pelo envelhecimento) nas mídias sociais. Está claro que a questão de “como e quando as mulheres podem envelhecer?” tornou-se uma questão ainda mais complexa na era digital.
As mídias sociais viraram a porta de entrada para a indústria antienvelhecimento, com influenciadores atuando como outdoors vivos para tratamentos estéticos.
Muitas das mulheres com quem conversei destacaram como procedimentos como o Botox se tornaram populares em aplicativos como o Instagram, especialmente para as mais jovens.
Algumas delas ficam felizes em discutir seus “ajustes”, admitindo que fizeram Botox e preenchimento, enquanto outras expressaram surpresa com a idade precoce em que as pessoas buscavam esses tratamentos.
“Estou impressionada como são tão jovens e estão fazendo Botox aos 20 anos. É bastante chocante”, disse uma entrevistada.
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Envelhecimento online
Mesmo para mulheres que não estejam passando por procedimentos invasivos, os padrões sobre idade implícitos nas mídias sociais levaram a tendências de cuidados com a aparência cada vez mais detalhados e intensos.
O “BeautyTok” [categoria de vídeos de beleza da plataforma TikTok] mostra como isso tem acontecido.
Por meio da tendência de “alta manutenção para baixa manutenção”, as mulheres fazem vários tratamentos demoradas e frequentemente caros que diminuem seu tempo diário de cuidados com a beleza.
Da mesma forma, o “morning shed” [quando os cuidados com a pele são mais elaborados à noite para a rotina da manhã se tornar mais prática] mostra mulheres removendo vários produtos de beleza que aplicaram para dormir.
Entre esses produtos, geralmente havia algum relacionado ao antienvelhecimento, como fitas para o queixo ou fitas antirrugas.
Muitas das mulheres envolvidas nessas atividades estão na faixa dos 20 anos, antes de qualquer sinal visível de envelhecimento aparecer.
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Críticas ao envelhecimento feminino são uma tendência
Atualmente, ao invés de tentar reverter o envelhecimento feminino, há na mídia uma tendência de prevenção, embora os médicos contestem a eficácia de medidas preventivas.
Algumas mulheres afirmam que esses hábitos são uma forma de autocuidado que proporciona alegria e um senso de rotina, e talvez até mesmo uma forma de companheirismo.
Hesito em rejeitar isso, pois os interesses das mulheres já são amplamente criticados e frequentemente descritos como banais. Mas não se pode ignorar que as pressões impostas pelos padrões de beleza podem ter efeitos prejudiciais sobre a saúde mental.
Atualmente, mais de 1 milhão de pessoas no Reino Unido sofre de dismorfia corporal. Essas pressões não existem na mesma extensão para os homens, que são amplamente encorajados a envelhecer naturalmente, tornando-se “raposas prateadas”.
No entanto, a dismorfia corporal está aumentando para os homens jovens, embora possa se manifestar de forma diferente. As pressões da cultura antienvelhecimento podem ter sido exacerbadas pelo aumento da cultura de trabalho em casa e pelo crescimento do uso do Zoom.
Esses fenômenos deram às pessoas a chance de olhar para seus próprios rostos por horas. A IA e outras ferramentas de edição habilitadas pela tecnologia também aumentam essas expectativas.
Ela dão a qualquer um a capacidade de alterar drasticamente seu rosto ou remover sinais de envelhecimento apenas com um toque na tela.
Muitas das pessoas que entrevistei observaram como algumas tendências de beleza e filtros online estão mudando o que é considerado bonito, um fenômeno que foi denominado “rosto do Instagram” .
Uma das entrevistadas disse:
“Agora todo mundo está fazendo a mesma coisa. Todos parecem exatamente iguais, como robôs.”
Quando as mulheres jovens devem envelhecer?
As mídias sociais permitem uma cultura de comentários, onde qualquer pessoa pode falar sobre sua aparência física. Muitas vezes isso replica as duras críticas do jornalismo sensacionalista.
No TikTok, “quantos anos eu pareço ter?” é uma tendência cruel que surgiu em 2024, com mulheres fazendo essa pergunta a milhares de estranhos na internet.
Isso geralmente resulta em pessoas de 30 anos sendo informadas de que parecem ter 50, ou mulheres jovens perguntando como reverter os efeitos do envelhecimento (completamente natural e padrão).
Nos últimos meses, várias celebridades um pouco mais velhas têm se parecido estranhamente com suas versões mais jovens, como Lindsay Lohan e Christina Aguilera.
A internet respondeu de forma muito positiva, pedindo detalhes de seus cirurgiões e fazendo especulações sobre o preço do procedimento.
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Envelhecimento feminino na mídia e os padrões de beleza
Simultaneamente, celebridades receberam críticas por seus rostos com excesso de preenchimento, aparência chamada de “pillow face” [quando o procedimento fica artificial e desproporcional, lembrando a um travesseiro].
A tendência revela um desejo de que o procedimento fique “imperceptível”. Isso é confirmado por cirurgiões plásticos e “especialistas” que postam seus próprios vídeos opinando, explicando e criticando o trabalho que eles acham que as celebridades fizeram.
Geralmente, são aquelas com dinheiro de sobra que conseguem fazer um procedimento estético “bom” (que fique indetectável). No entanto, descobri que a falta de dinheiro não impede as jovens com quem conversei de se envolverem nessas práticas.
Algumas até se endividaram, seja por meio de cartões de crédito ou planos de pagamento, na tentativa de atingir esses visuais sem idade Esses investimentos aumentam à medida que as mulheres envelhecem.
É permitido envelhecer na era digital?
Se o envelhecimento feminino muito cedo não é permitido pela mídia, e envelhecer muito devagar também é suspeito, o que as jovens de hoje devem fazer?
Como a era digital desempenha um papel cada vez maior na produção da feminilidade ideal, a mensagem é muito clara para todas as mulheres, e não apenas as que estão na faixa dos 20 anos.
O recado é para que não envelheçam visivelmente, nunca. Essas pressões são duras, mas como podemos combater isso?
Aceitando o envelhecimento natural e permitindo que as mulheres envelheçam de suas próprias maneiras. Fazer isso coletivamente seria um ato radical e desafiador de empoderamento feminino.
Este artigo foi publicado originalmente no portal acadêmico The Conversation e é republicado aqui sob licença Creative Commons.
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