Londres – Depois de desafiar por pelo menos três vezes a narrativa oficial do governo de Vladimir Putin sobre a guerra, a jornalista Marina Ovsyannikova entrou na lista de procurados do Ministério da Justiça russo nesta segunda-feira (3) por ter fugido da prisão domiciliar a que estava submetida desde 11 de agosto, depois de condenada por propagar “fake news” sobre o exército russo.
A jornalista ficou conhecida em todo o mundo em março por ter invadido um estúdio da TV estatal da qual era uma das editoras com um cartaz protestando contra as fake news disseminadas na mídia controlada pelo governo.
Ela passou três meses na Alemanha trabalhando para o jornal Die Welt, retornou à Rússia supostamente para participar de uma audiência de custódia dos filhos e fez uma manifestação solitária diante do Kremlin, motivo de sua condenação.
Emissora controlada pelo governo anunciou sumiço da jornalista
A notícia sobre o desaparecimento de Marina Ovsyannikova com a filha de 11 anos foi dada no sábado pela emissora estatal Russia Today (RT), que entrevistou o ex-marido da jornalista, Igor Ovsyannikov. A prisão vai até 9 de outubro. Na segunda-feira, ela entrou na lista de procurados.
Na entrevista à RT, Ovsyannikov afirma não saber o paradeiro de sua filha. Segundo ele, a ex-mulher sequestrou a menina. A criança teria parado de ir à escola e “responde confusamente a perguntas” disse à RT.
Ele observou que elas não poderiam sair legalmente do país, pois a menina não tem passaporte estrangeiro nem autorização paterna para viajar ao exterior.
Veja a história da jornalista que desafiou Putin
Apesar de ter se manifestado diversas vezes dentro da Rússia contra Putin, Marina Ovsyannikova não é uma unanimidade na mídia como outros jornalistas dissidentes, a começar pelo detentor do Nobel da Paz, Dmitry Muratov.
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Ela fez uma longa carreira na TV estatal e seu ex-marido também. Vivia uma vida de privilégios, reservada aos que se alinham ao governo russo, até o dia 14 de março.
A posição combativa aproveitando um espaço na censurada mídia estatal russa destoa do passado de Ovsyannikova. Ela nasceu em 1978 em Odessa, cidade portuária ucraniana ameaçada de ataque, e cresceu no sul da Rússia.
Na escola de jornalismo da Universidade de Kuban, estudou com Margarita Simonyan, a editora-chefe de um dos principais órgãos da mídia estatal russa, a RT (Russia Television).
Depois da invasão do estúdio, a editora da RT negou ser amiga da jornalista que furou o bloqueio da censura estatal, embora tenha admitido que a recomendou para uma vaga.
Marina Ovsyannikova tinha outros laços pessoais com a rede estatal: Igor Ovsyannikov, seu ex-marido, era diretor da RT.
Nas redes sociais a atividade da jornalista era bem diferentes dos atos de protesto. No Instagram ela se se apresentava como mãe feliz, dona de cães golden retrievers e amante de fitness e de natação em mar aberto.
Posts antigos revelam que ela tinha uma vida glamurosa, exibindo roupas caras, jóias e viagens possíveis com um bom salário de funcionária graduada da mídia estatal da Rússia.
Tudo mudou quando a então editora do telejornal noturno Vremya, do canal estatal Channel One, invadiu o estúdio quando programa era transmitido ao vivo no dia 14 de março com um cartaz dizendo: “Pare a guerra. Não acredite em propaganda. Eles estão mentindo para você” em russo.
A jornalista passou por um longo interrogatório, foi acusada de ser espião britânica mas não foi presa. Mudou-se para a Alemanha e foi contratada pelo jornal Die Welt, onde fez reportagens criticando seu país.
Em uma delas, escreveu: “os russos têm medo”.
No início de julho, ela anunciou o que seria o fim de um contrato de três meses e retornou à Rússia sob a alegação de precisava participar de uma audiência de custódia dos filhos.
Mas a passagem pela Alemanha foi marcada por controvérsias, com protestos contra o Die Welt por tê-la contratado devido ao seu longo histórico de trabalho em uma emissora controlada pelo governo russo.
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Assim que voltou à Rússia, a jornalista continuou a desafiar o governo. No dia 13 de julho ela gravou um vídeo em apoio ao político da oposição Ilya Yashin, que está detido em prisão preventiva por supostamente espalhar informações falsas sobre os militares russos.
Dois dias depois, fez um protesto silencioso diante do Kremlin, transmitido em suas redes sociais, exibindo um cartaz que dizia: “Putin é um assassino. Seus soldados são fascistas”.
Por causa dele, ela foi condenada a cumprir prisão domiciliar e a pagar uma multa, recebidas com indignação.
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“As acusações são absolutamente absurdas. É como se me acusassem de atear fogo no Mar Cáspio ou espalhar varíola”, disse.
O objetivo do julgamento é intimidar todas as pessoas que se opõem à guerra na Federação Russa.”
Ela descreveu a Rússia como um país agressor, dizendo: “O início desta guerra é o maior crime do nosso governo”.
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