O assédio digital contra jornalistas enfraquece a segurança dos profissionais e mina a confiança do público na mídia. É o que mostra o estudo “Quebrando o silêncio sobre o assédio online contra jornalistas”, da EFJ (Federação Europeia de Jornalistas).
De acordo com o novo relatório, 60% dos entrevistados acreditam que houve um aumento nos ataques online contra jornalistas, o que é significativo sendo uma região com mais países democráticos e leis protegendo a imprensa do que em outras áreas do mundo.
Diferentemente das ameaças tradicionais, como prisões e leis de censura, o assédio online não é praticado apenas por governos, mas também por outros agentes da sociedade, e é particularmente forte na Europa devido ao crescimento do extremismo de direita.
Mulheres são as que mais sofrem assédio online
A pesquisa revela ainda que as mulheres são as maiores afetadas. Os dados mostram que 73% das mulheres jornalistas já enfrentaram assédio online.
Ao mesmo tempo, 40% acham que este tipo de violência é subnotificada, uma vez que costuma ser normalizada ou interpretada como parte do trabalho jornalístico.
Entre os incidentes de assédio digital relatados estão ameaças de morte, insultos, campanhas difamatórias ou comentários depreciativos – que podem ser de natureza misógina ou sexual.
A pesquisa foi feita pela jornalista e conselheira de políticas de tecnologia Elodie Vialle. Ela se baseou em entrevistas com 23 representantes de sindicatos, que por sua vez coletaram informações de seus associados, membros da rede da EFJ, espalhados por 44 países da Europa.
Vialle também conduziu entrevistas adicionais, além de consultar profissionais de mídias sociais, especialistas jurídicos, grupos da sociedade civil e organizações de apoio a jornalistas.
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O que é o assédio digital
Segundo a definição da EFJ, “o assédio online refere-se ao ataque generalizado ou grave a jornalistas por meios digitais”.
A organização explica que o ataque vai desde intimidação e ameaças a roubo de identidade, campanhas de difamação e desinformação coordenada.
A EFJ explica ainda que o assédio online pode assumir múltiplas formas e servir a diferentes propósitos, “mas o objetivo é frequentemente o mesmo: silenciar, desacreditar ou manipular a opinião pública, minando a credibilidade e a segurança dos jornalistas.”
A presidente da EFJ, Maja Sever, relembra que o assédio online não acontece em um mundo paralelo e não desaparece quando o computador é desligado.
“Por trás de cada ameaça, existe uma pessoa real cuja vida, segurança e dignidade foram prejudicadas. Devemos nos unir para apoiar e proteger jornalistas das consequências pessoais e profissionais do assédio online.”
Novas táticas e tendências
O estudo mostra que o assédio digital contra jornalistas acontece de diversas maneiras, entre elas, novas táticas de ataques vem sendo observadas.
O spoofing e o cybersquatting são duas formas por meio das quais assediadores fingem ser jornalistas clonando seus perfis ou sites confiáveis. Assim, eles enganam o público para espalhar propaganda e desinformação, ou até para aplicar golpes financeiros.
“Essas táticas abrangem fotos, vozes ou vídeos alterados, às vezes deepfakes gerados por IA, bem como sites e artigos falsos que imitam veículos de notícias legítimos ou jornalistas profissionais”, explica o relatório.
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Assédio têm viés de gênero
A violência contra as mulheres jornalistas é amplamente percebida: 87% das pessoas responderam que as mulheres de suas organizações já foram alvo de ataques e 17% mencionaram ataques contra minorias de gênero.
O assédio pode vir por meio de discurso de ódio (relatado por 82% das pessoas), insultos (78%), ameaças de estupro (40%) ou outras formas de violência de gênero (65%).
“Jornalistas mulheres e pessoas de minorias são alvos de forma desproporcional, enfrentando campanhas sistemáticas de abuso sexista e racista que levam colegas à autocensura, ao afastamento das redes sociais ou até mesmo ao abandono do jornalismo”, relata Elena Tarifa, presidente do Grupo de Especialistas em Gênero e Diversidade (Gendeg) da EFJ.
“Proteger os mais vulneráveis significa defender a liberdade de imprensa e garantir que todas as vozes sejam ouvidas sem medo.”
Uma outra nuance da violência de gênero contra jornalistas é a criação de vídeos deepfake de pornografia, nos quais por meio do uso de inteligência artificial, rostos de jornalistas são colocados em conteúdos explícitos.
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Mecanismos de segurança e recomendações
O relatório da EFJ nota que mecanismos de proteção para jornalistas já existem na maioria dos países europeus. No entanto, seu funcionamento ainda deixa a desejar.
Na visão da organização, quase todos os atores envolvidos ainda precisam melhorar a maneira como implementam a proteção, além de que muitos mecanismos de segurança não consideram as especificidades dos ataques online.
Assim, a EFJ fez recomendações individualizadas voltadas para organizações de jornalistas, veículos de imprensa, redes sociais, governos, a Comissão Europeia e o Conselho da Europa, que incluem mais rigor na moderação, treinamento, leis mais severas e apoio individual aos afetados.
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