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COP28: Relatório analisa Brasil em Dubai, jornalismo climático, ativismo e percepções sobre o clima

Londres –  Um novo relatório sobre a COP28 analisou os acontecimentos em torno conferência do clima da ONU, a passagem do Brasil por Dubai e os principais desafios da luta do clima, como a engajamento do público, os instrumentos para pressionar autoridades e empresas a agirem para conter o aquecimento global e as preocupações da sociedade com o futuro do planeta, a chamada ansiedade climática

Como ONGs avaliaram a participação do Brasil na COP28?A imprensa está sendo alarmista demais? O que é o jornalismo de soluções e como ele pode ajudar? Greta ainda mobiliza? Atacar monumentos funciona? A cultura pode ser instrumento de informação e mobilização em prol da luta contra as mudanças climáticas? 

Na edição especial, jornalistas brasileiros analisam as repercussões da COP28 e como seus governos estão tratando a emergência do clima em cinco países (Argentina, EUA, Itália, Reino Unido e Suécia). Especialistas refletem sobre o papel da jornalismo e da cultura para acelerar transformações. E pesquisas mostram como a imprensa está – ou não está – cobrindo o tema, como os jovens escolhem onde trabalhar pautados pela sustentabilidade do empregador e as dificuldades das PMEs para demonstrarem seus resultados.

Participação do Brasil na COP28 

Cláudio Ângelo, jornalista e diretor da rede ambiental Observatório do Clima, resumiu a presença brasileira em Dubai:

“O Brasil foi construtivo, mas não conseguiu evitar que a passagem da delegação pela COP fosse contaminada pelos delírios petroleiros dentro de casa. O país foi cobrado, e justamente, por tentar fazer juras de amor à Greta no exterior e ao Al Ghais [Secretário-Geral da OPEP] dentro de casa.”

Ele se referia à decisão do país de aderir como observador à OPEP (Organização dos Países Produtores de Petróleo) e ao leilão de áreas de exploração em locais ambientalmente sensíveis, apelidado por críticos de “leilão do fim do mundo”.

Três dias depois da abertura da conferência, o Brasil foi agraciado com o prêmio “Fóssil do Dia”

A mídia internacional refletiu a decepção. “Tentativa de Lula de se firmar como líder do clima na COP28 minada pelo movimento com a Opep”, escreveu o The Guardian.“Lula é criticado pelos planos de petróleo nas cúpula da ONU, uma reviravolta após o status de herói ano passado”, disse a AP.

Especialistas analisaram também o acordo dos combustíveis fósseis firmado na COP28, que ficou aquém do esperado por organizações climáticas e cientistas. 

Jornalistas brasileiros analisam presença de seus países na COP28 e ações pelo clima 

A luta climática enfrenta em todo o mundo o dilema entre a necessidade de reduzir o aquecimento global e os interesses econômicos, tanto das empresas como as que produzem combustíveis fósseis quanto dos governos preocupados com desenvolvimento e empregos. 

Jornalistas brasileiros que analisaram a COP28 repercutiram esse dilema. 

Na Argentina, o novo presidente, Javier Milei, é descrito pela correspondente Márcia Carmo como um negacionista climático. Ele não foi à COP, e mandou um representante nos últimos dias da conferência em Dubai, que aconteceu no ano em que o país enfrentou a mais severa seca de sua história. 

Mas a culpa pode não ser somente dos políticos. Manuel Jaramillo, diretor da ONG ambiental Fundação Vida, faz uma autocrítica sobre a habilidade das organizações não-governamentais em engajarem o púbico, já que o meio ambiente ficou de fora dos debates eleitorais. 

A Suécia, país da ativista Greta Thunberg, também é analisada no relatório sobre a COP28. Greta não foi a Dubai, assim como as principais organizações ambientais da Súecia, como relatou a correspondente brasileira Claudia Walllin. 

Uma das principais razões foi a decisão do país anfitrião de nomear o sultão Ahmed Al Jaber, CEO da Companhia Nacional de Petróleo de Abu Dhabi, uma das maiores petrolíferas mundiais, para o papel de presidente da conferência.

Al Jaber aumentou a controvérsia em torno de sua liderança durante a conferência, após a divulgação de uma conversa com ambientalistas em que disse não haver fundamento científico para apoiar a eliminação dos combustíveis fósseis. 

A jornalista faz um panorama do retrocesso das políticas ambientais da Suécia, país sediou a primeira COP da história e era modelo em clima, mas vem cortando investimentos e mudando a rota com base em demandas econômicas e políticas. 

Nem Greta salva: a jovem ativista já é uma adulta e é questionada em seu próprio país. 

Enquanto isso, o Papa Francisco tenta mobilizar fiéis e pessoas influenciadas por suas opiniões, convocando o mundo a uma “conversão climática”. Francisco não foi à COP28 em Dubai por motivos de saúde. Ele seria o primeiro Papa a participar de uma cúpula do clima da ONU. 

Mas no dia em que deveria falar em Dubai, o pontífice usou sua conta no Twitter/X para cobrar dos estrategistas o foco no bem comum e na juventude, e não nos interesses de “certos países e negócios”, mostrando “nobreza na política”.

 A correspondente brasileira Fernanda Massarotto conversou com um dos principais vaticanistas do país, o jornalista Iacopo Scaramuzzi, do jornal La Repubblica. Ele analisa no relatório a extensão da influência de Francisco nas questões ambientais à luz de suas manifestações em torno da COP28. 

A jornalista mostra também as opiniões divididas em relação a atos de ativismo climático que causam transtornos e atingem monumentos. 

O Reino Unido é outro país que experimenta as contradições entre desenvolvimento e preservação do planeta expostas nesta COP28, como mostra outra análise do relatório. 

O Rei Charles, conhecido pela sua defesa do meio ambiente desde jovem, foi escolhido pela ONU para fazer o discurso de abertura da COP28 em Dubai. Em um dos trechos, disse que estaria “rezando” para que os líderes encontrassem soluções para a crise do clima. 

Na plateia estava Rishi Sunak, o primeiro-ministro britânico que semanas antes da conferência adiou várias medidas para reduzir as emissões, que tinham sido assumidas na COP26, em Glasgow. 

Algumas dessas medidas têm se mostrado impopulares por afetarem o bolso da população, como as zonas de Londres onde carros mais antigos e poluentes pagam uma taxa para circular, relatou a jornalista brasileira Luciana Gurgel. O projeto ULEZ é controvertido e em pelo menos uma eleição regional, definiu o resultado a favor de um candidato que nao o apoia. 

Já nos EUA, segundo país com maior volume de emissões do mundo e altamente dependente dos automóveis movidos a combustíveis fósseis, tema central desta COP28, o presidente resolveu não ir a Dubai. 

A correspondente brasileira Eloá Orazem disse que o motivo foi “agenda”. Mas em um dos dias da COP, Biden e sua mulher, Jill, protagonizaram a inauguração da árvore de Natal da Casa Branca, um compromisso de menor impacto para o mundo do que o aquecimento global. 

A jornalista analisa no relatório sobre a COP28 um movimento preocupante que cresce nos EUA: o anti-ESG. Grandes investidores pressionam as empresas a deixarem de lado os compromissos da sigla (Environmental, Social and Governance), incluindo medidas para reduzir impacto ambiental ou colaborar com a redução do aquecimento e preservação da natureza, devido aos lucros. 

Ela conversou com três especialistas que avaliam o movimento e o quanto ele pode mudar os rumos das empresas, com consequências para a sociedade. 

Especialistas analisam jornalismo, mobilização e cultura 

Um estudo da Universidade de Yale que faz parte do relatório sobre a COP28 analisa que os brasileiros estão entre os que mais se preocupam com os danos das mudanças climáticas às gerações futuras e entre os que mais acham que o tema deve ser uma prioridade do governo.

O dado mais preocupante do estudo é o de que quatro em cada dez dos entrevistados nem conhecem o termo “mudanças climáticas”.

Isso demonstra como a comunicação continua a ser essencial nesse esforço global, dependendo cada vez mais do papel  de jornalistas, comunicadores corporativos, organizações de mídia, influenciadores das redes sociais, ONGs, celebridades, autoridades e lideranças governamentais.

Mas as dificuldades para a ação do jornalismo ambiental persistem. Outra pesquisa apresentada no relatório aponta as barreiras para a cobertura ambiental na América Latina, como equipes reduzidas e falta de treinamento dos profissionais em jornalismo científico.

Na COP27, 62% das 229 notícias ambientais latino-americanas pesquisadas tinham sido distribuídas por uma agência de notícias europeia.

Marina Amaral, co-fundadora da Agência Pública, faz uma análise sobre o papel da mídia digital nesse cenário. Do tempo em que os jornalistas que cobriam Amazônia eram descritos pelos grandes jornais como aqueles que tinha se embrenhado no “Brasil profundo”, Marina exalta a importância do advento da mídia digital para colocar os índios e a Amazônia para na pauta do país.

A cobertura jornalística da Amazônia, dos conflitos no campo, e do colapso ecológico só passou a ser feita de forma sistemática no país depois do surgimento da mídia digital.

Não é coincidência que as organizações pioneiras nesse campo, como a Repórter Brasil e a Agência Pública, fundada em 2011, estejam também entre as primeiras a investigar esses temas.

Duas entrevistas publicadas no especial discutem o tom correto para abordar a emergência climática. De um lado, a diplomata costarriquenha Christiana Figueres, aclamada como arquiteta do acordo de Paris, pede maior equilíbrio entre a indignação e o otimismo.

Do outro lado, Erika Bjerström, uma das principais jornalistas ambientais da Suécia, diz que não é papel da imprensa manter a audiência de bom humor de maneira falsa.

Nesse contexto há o caminho do meio, representado pelo jornalismo de soluções, que aborda temas como as mudanças climáticas mostrando sua gravidade junto com respostas ao problema.

Mas o jornalismo não é o único instrumento. De Londres, a jornalista brasileira Yula Rocha, gerente de comunicação da organização People’s Palace Projects, destaca o uso das manifestações culturais como instrumento de conscientização na luta contra as mudanças climáticas, que foi um legado deixado pela COP28.

A ideia é usar a emoção de quem consome cultura para refletir sobre a causa, agir e cobrar ações, fazendo com que as manifestações artísticas ligadas à causa atuem como ferramenta de transformação das mentes.


 

Leia aqui a edição completa

 

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