Londres – Mais de 13% dos 550 jornalistas e profissionais de imprensa presos atualmente no mundo são mulheres, uma proporção que dobrou nos últimos cinco anos, segundo a organização de liberdade de imprensa Repórteres Sem Fronteiras (RSF). 

No Dia Internacional da Mulher, a entidade voltou a pedir a libertação imediata e incondicional das jornalistas presas em todo o mundo, e fez um alerta sobre o desaparecimento de mulheres na mídia afegã, depois de dois anos de perseguições que levaram muitas ao exílio ou a desistir da profissão. 

Segundo a RSF, ao mesmo tempo em que mais mulheres estão fazendo reportagens arriscadas, incluindo em zonas de guerra, e se tornam mais visíveis publicamente, tornam-se também mais propensas a serem vítimas de perseguição.

Há mulheres jornalistas presas em 14 países. A China encabeça a lista, com 21 profissionais encarceradas. Depois aparecem Irã (12), Bielorrúsia (10), Vietnã (4) e Turquia (4).

Mulheres jornalistas cobrindo crises e guerras 

“Mulheres jornalistas pagaram o preço por estarem na linha de frente em crises recentes”, salienta a ONG.

Das 12 profissionais atualmente detidas no Irã, 11 foram presas após os protestos sobre a morte da estudante curda Mahsa Amini sob custódia policial.

Duas das mulheres jornalistas que mais fizeram para chamar a atenção do público para o caso – Nilufar Hamedi , ao ir para o hospital onde a jovem esteve em coma, e Elahe Mohammadi , ao cobrir o seu funeral – são acusadas de “propaganda contra o sistema” e “conspirar para agir contra a segurança nacional – acusações que podem levar à pena de morte.

Em Mianmar, Htet Htet Khine, uma freelancer detida na notória prisão de Insein em Yangon desde agosto de 2021, foi condenada duas vezes a três anos de prisão com trabalhos forçados sob a acusação de “incitar ódio e violência contra as forças armadas” por denunciar a violência que cometeram após o golpe militar em fevereiro de 2021.

Na Bielorrússia – que em 2021 se destacou como país que mantinha mais mulheres jornalistas (17) do que homens (15) – nove ainda estão detidas por cobrir protestos não autorizados, sujeitas a longas sentenças e sem atendimento médico.

A organização destacou o caso de Katsiaryna Bakhvalava (também conhecida como Katsiaryna Andreyeva ), condenada a  dez anos e três meses de prisão por filmar um protesto contra o presidente Aleksander Lukashenko na “Praça das Mudanças” de Minsk em novembro de 2020.

“Ela começou a perder a visão, mas nada está sendo feito,  enquanto sua colega Ksenia Lutskina , que cumpre pena de oito anos, tem problemas de asma e um tumor cerebral que não está sendo tratado”, protesta a Repórteres Sem Fronteiras. 

No Vietnã, Pham Doan Trung, que recebeu o Prêmio RSF de Impacto em 2019, foi transferida para uma prisão a 1 mil quilômetros de distância da capital, Hanói. Segundo a RSF, o objetivo foi evitar reportagens sobre seu estado de saúde, que seria crítico.

Ela cumpre pena de nove anos de prisão sob acusação de “propaganda contra o Estado”.

Mulheres detidas na China são submetidas a condições que incluem negação de atendimento médico e maus-tratos, segundo a organização.

Huang Xueqin (Sophia Huang), uma jornalista famosa por seu envolvimento no movimento #MeToo na China, sofre de dores lancinantes na cintura após ser maltratada e até torturada, conforme relatos. 

De suas celas, algumas mulheres jornalistas conseguem relatar o que elas e seus companheiros de detenção estão tendo que suportar.

“Nos últimos dias, vários presidiários […] deram relatos chocantes de como foram agredidos”, escreveu o iraniano Narges Mohammadi , laureado com a RSF Press Freedom em 2022 , em uma carta aberta publicada em 24 de dezembro de 2022.

Um mês antes disso, em um livro intitulado White Torture , ela descreveu outra forma de tortura praticada em prisões, envolvendo privação sensorial durante confinamento prolongado e total em solitária, sem acesso à luz natural.

No Afeganistão, mulheres jornalistas foram ‘apagadas’ 

O cenário da mídia no Afeganistão ficou irreconhecível em menos de dois anos. Metade dos 526 meios de comunicação que existiam até meados de 2021 tiveram que fechar.

Das 2,3 mil mulheres jornalistas registradas antes de 15 de agosto de 2021, quando o Talibã tomou o poder, menos de 200 ainda estão trabalhando, segundo a Repórteres Sem Fronteiras.

Quase todas as mulheres jornalistas (90%) tiveram que deixar seus empregos e algumas fugiram do país, embora não se saiba exatamente quantas conseguiram fugir.

“As que ainda trabalham são obrigadas a aceitar condições cada vez mais draconianas, senão impossíveis”, protesta a RSF.

O Talibã recentemente proibiu mulheres jornalistas de entrevistar homens e de participar de coletivas de imprensa em algumas províncias. Da mesma forma, elas são proibidas de apresentar programas de rádio ou TV junto com colegas do sexo masculino, ou de receber convidados do sexo masculino.

O Ministério Talibã para a Promoção da Virtude e Repressão ao Vício também impôs um código de vestimenta rígido. Quando as mulheres jornalistas estão diante das câmeras, elas devem estar cobertas da cabeça aos pés e apenas seus olhos podem ser vistos.

Quando a medida foi adotada, colegas homens apresentaram telejornais usando máscaras, em sinal de solidariedade. 

Mesmo quando não são presas, mulheres jornalistas pagam um preço alto para fazer o trabalho de informar a sociedade. Pesquisas mostram que elas sofrem mais assédio e agressões online e nas reportagens de campo. 

O aumento de jornalistas cobrindo guerras e conflitos está se refletindo no número de profissionais que perdem a vida a serviço. Em 2021, 10 morreram durante coberturas ou como resultado do seu trabalho, em agressões e ataques diretos.