Londres – A intolerância a críticas negativas sobre um de seus espetáculos custou o emprego e talvez a carreira a um premiado diretor de balé alemão, Marco Goecke, que no último sábado (11)  esfregou fezes de cachorro no rosto da jornalista Wiebke Hüster, do jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung. 

Nesta quinta-feira, a diretora da Ópera Estadual de Hanover, Laura Berman, anunciou que Goerke estava deixando o posto “de comum acordo”.

A situação do diretor do balé de Hanover foi agravada por suas reações posteriores. Inicialmente ele não se desculpou pela agressão.

Depois de três dias,  publicou um texto no Instagram pedindo desculpas, mas tentando se justificar utilizando como argumento o fato de matérias negativas serem destrutivas para a arte. 

No comunicado, o artista admitiu que o ato foi  “absolutamente inaceitável”, mas disse ter agido  “no calor do momento” e sob efeito de “tensão nervosa” resultante de duas estreias, pedindo compreensão: 

“Peço desculpas por ter explodido, mas também peço certa compreensão pelo menos sobre as razões pelas quais isso aconteceu”. 

Fezes eram de cachorro do diretor de balé

As fezes usadas para agredir a jornalista eram do cachorro do diretor de balé, Gustav, um personagem que circula com ele em eventos e aparece em vários posts publicados em redes sociais. 

Em uma entrevista à TV NDR, ele explicou o ato como reação aos vários anos em que a jornalista “jogou’m…’ nele”.

Mesmo com desculpas pela metade e a demissão, a controvérsia ainda não acabou, pois a forma como o encerramento do contrato de trabalho foi anunciado também foi criticada pelo Frankfurter Allgemeine. 

O jornal levantou dúvidas sobre se o diretor de balé iria receber uma indenização depois da agressão a jornalista com fezes de cachorro, o que o teatro não informou.

E registrou na reportagem sobre a demissão que a Ópera não descartou cooperações futuras com Goecke, tendo anunciado reprises de trabalhos anteriores do profissional para a próxima temporada. 

Wiebke Hüster é uma respeitada crítica de arte, que antes de ser jornalista foi bailarina profissional. Os dois não se conheciam pessoalmente.

No sábado, durante o intervalo da estreia do balé Glaube – Liebe – Hoffnung (algo como ‘Fé – Amor – Esperança’, em tradução livre), o coreógrafo abordou-a para tomar reclamar sobre uma crítica negativa a um espetáculo anterior. 

Hüster havia escrito que ‘In the Dutch Mountains’ (Nas montanhas holandesas), era “aborrecido e entediante”, “desfocado e distraído”. 

Para o diretor, essas críticas são prejudiciais aos artistas, afastando o público. Mas o jornal onde a crítica trabalha discorda, assim como organizações de defesa da liberdade de imprensa. 

Liberdade de imprensa 

A Associação Alemã de Jornalistas  interpretou o ataque ao crítico do “Frankfurter Allgemeine Zeitung” (FAZ), Wiebke Hüster, como um ataque à liberdade de imprensa. 

Em entrevista à NDR, Hüster relatou que o diretor se interpôs em seu caminho no foyer do teatro caminho, mas ela achou que ele tinha o direito de abordá-la, mesmo estando chateado com opiniões negativas sobre ‘In the Dutch Mountains’.

A jornalista disse que estava tranquila, porque não se sentia culpada pelo que havia escrito. “Embora a crítica fosse negativa, não era pessoal, nem injusta, nem exagerada, irônica ou cínica”.

Goecke perguntou “o que ela queria, afinal”, e a jornalista disse ter respondido que era uma crítica de arte e estava trabalhando. Ele respondeu então que ela deveria ser banida da casa de espetáculos porque sempre critica negativamente. 

Wiebke Hüster disse ter replicado afirmando que o texto que escrevera sobre não era pessoal, e sim sobre o trabalho, mas ele reclamou que assinantes cancelaram ingressos para a temporada por causa da crítica. Em seguida, o diretor tirou um saquinho com fezes do bolso e esfregou do lado direito do rosto da jornalista. 

Ela afirmou ter sido essa a pior situação enfrentada em seus 25 anos de trabalho como jornalista. 

Além de perder o emprego, Marco Goecke enfrenta um inquérito policial.

Hüster registrou queixa na delegacia logo após o ataque, e o Frankfurter Allgemeine apresentou uma queixa-crime contra o diretor de balé.