Londres – Na contramão de muitas pesquisas que apontam o Facebook e outras redes sociais como prejudiciais para a saúde mental de seus usuários, um novo estudo do Oxford Internet Institute (OII) analisando dados de 72 países não encontrou evidências de que a plataforma da Meta cause danos psicológicos generalizados na população – “muito pelo contrário”, diz o relatório. 

Para chegar aos resultados, os pesquisadores cruzaram dados de usuários do Facebook com estatísticas de bem-estar do Gallup World Poll (GWP), que faz um acompanhamento contínuo do estado psicológico das populações de 164 países.

“Examinamos os melhores dados disponíveis e descobrimos que eles não fundamentam a ideia de que o uso da plataforma cause danos gerais. Na verdade, nossa análise indica que a rede social possivelmente está associada ao bem-estar”, disse o professor Andrew Przybylski, um dos autores do trabalho. 

A conclusão não significa que a exposição ao conteúdo do Facebook ou a forma de utilizar a rede social não seja capaz de provocar efeitos negativos específicos em determinadas pessoas, países,  grupos etários ou sociais, como outras pesquisas apontam.

O que o trabalho mostra é que não há um dano generalizado sobre todos os usuários no conjunto dos 72 países avaliados. 

Os autores não aprofundam os motivos pelos quais o Facebook pode está associado ao bem-estar, mas isso pode estar ligado ao fato de que a rede social permite conexões com pessoas distantes, dá acesso a informações úteis (apesar da proliferação de fake news) e a conhecimento que melhora a vida de seus usuários. 

Facebook não participou do estudo sobre saúde mental

O estudo do Oxford Internet Institute foi revisado por pares (processo em que outros pesquisadores avaliam o trabalho realizado) e publicado esta semana na revista científica Royal Society Open Science. 

O Facebook forneceu os dados para a pesquisa, mas não a financiou nem acompanhou o desenvolvimento até que o instituto da Universidade de Oxford apresentasse os resultados publicamente. 

Efeitos negativos das redes sociais principalmente sobre jovens ganharam mais visibilidade quando Frances Haugen, uma ex-gerente da empresa, tornou públicas apresentações internas que demonstravam a influência do Facebook sobre a saúde mental de adolescentes.

Mas o relatório do Oxford Internet Institute afirma que embora relatos de resultados psicológicos negativos associados às mídias sociais sejam comuns na literatura acadêmica e na percepção do público, as evidências de danos são, no geral, mais especulativas do que conclusivas. 

Amostra abrangente e sem auto-relato

Uma das razões apontadas para as conclusões diferentes das de outras pesquisas de grandes centros acadêmicos é a abrangência da amostra.

Ao contrário de outras pesquisas, o novo trabalho analisou dados não apenas de usuários de países do chamado Norte Global, mas de um conjunto muito mais amplo de pessoas em contextos diferentes.  

Outra diferença é que ele não foi apoiado apenas no que os pesquisadores chamaram de “auto-relatos imprecisos de engajamento de mídia social” – como foi o caso dos “Facebook Papers” divulgados pela ex-executiva, que mostravam relatos individuais de usuárias jovens sobre a percepção da própria imagem corporal. 

“Em nosso novo estudo, cobrimos a geografia mais ampla possível, analisando dados de uso do Facebook sobrepostos a dados sólidos de bem-estar, e assim obtivemos pela primeira vez uma perspectiva verdadeiramente global do impacto do uso da rede social na saúde emocional”, explica Matti Vuorre, co-autor do trabalho.

Usuários do Facebook avaliados por idade e sexo

O projeto do Oxford Internet Institute começou antes da pandemia do coronavírus. A equipe trabalhou por mais de dois anos examinando dados de homens e mulheres divididos em duas faixas etárias (13-34 anos e 35 anos ou mais)

Os pesquisadores combinaram dados de bem-estar existentes da Gallup World Poll (GWP) , abrangendo quase um milhão de pessoas de 2008 a 2019, com dados do Facebook relacionados à adesão à plataforma global, permitindo compreender melhor a relação entre eles. 

A GWP é uma pesquisa anual realizada desde 2005, registrando experiências positivas e negativas de pessoas de 164 países para medir seu grau de bem-estar.  

O Facebook afirma ter atualmente quase três bilhões de usuários em todo o mundo, mas a pesquisa analisou os primeiros anos de expansão internacional da plataforma, de 2008 a 2019.

“Esse período foi crítico porque muitos afirmaram, sem evidências, que a saúde mental e o uso  do Facebook nesse período estariam vinculados”, diz o relatório. 

Os pesquisadores relacionaram os dados de rastreamento da adoção global do Facebook a três indicadores de bem-estar: experiências psicológicas negativas,  positivas, e satisfação com a vida. 

A comparação por sexo mostrou que a associação entre a adoção do Facebook e o bem-estar foi ligeiramente mais positiva para os homens do que para as mulheres, em todos os parâmetros analisados, mas essas tendências não foram significativas. 

Além disso, a ligação entre o uso do Facebook e o bem-estar foi geralmente mais positiva para os indivíduos mais jovens em todos os países. 

O novo estudo se alinha com pesquisas anteriores de especialistas de Oxford que exploraram a ligação entre a tecnologia digital e a saúde mental e concluíram que o uso da tecnologia não se tornou mais associado a resultados psicológicos negativos ao longo do tempo.

Mas o Facebook não está ainda totalmente absolvido, nem as demais redes sociais.

Segundo o professor Przybylski, os resultados não representam evidência de que o Facebook seja bom para o bem-estar dos usuários de uma forma generalizada, valendo para todos os países e todas as faixa etárias, e nem se estendem às demais plataformas. 

O relatório observa ainda que embora o Facebook continue sendo a rede social dominante nos Estados Unidos, os jovens de 13 a 17 anos tornaram-se mais propensos a usar TikTok, Instagram e Snapchat, o que torna a base de usuários atual da rede social formada principalmente por pessoas mais velhas. 

“Além das mudanças demográficas entre as plataformas de mídia social, as próprias redes mudam, e suas associações com o bem-estar podem, portanto, não ser consistentes ao longo do tempo ou em diferentes países”, salienta o relatório. 

Na semana passada, quatro pesquisas feitas por diversas universidades em um projeto conjunto não encontraram evidências de que o conteúdo exibido por algoritmos aos usuários do Instagram e do Facebook tenha impacto na polarização.