O ilustrador nicaraguense Pedro Xavier Molina Blandón (conhecido como PxMolina) foi o vencedor do Prêmio Gabo de Excelência 2021, com uma obra que trata de corrupção, autoritarismo crescente, retrocesso das liberdades civis e abusos dos direitos humanos.

Para a Fundação Gabo, “o trabalho de Pedro Molina exemplifica o jornalismo que usa o humor para desafiar governantes despóticos e tiranias, e é um exemplo extraordinário de mordacidade e beleza combinadas que demonstra um sentido muito verdadeiro e profundo dos principais problemas do seu país e da América Latina”.

O conselho da fundação destacou também que a obra de Molina “tornou-se um modelo para o gênero da sátira que valoriza a profissão do jornalismo e desempenha uma importante tarefa de fiscalização e crítica do poder”.

(Jon Miller/Divulgação)
Cartunista tem uma vida de exílios em meio à instabilidade política da Nicarágua

A censura à imprensa e perseguição a jornalistas pelo governo da Nicarágua mobiliza as principais entidades internacionais de defesa da liberdade de imprensa, de expressão e dos direitos fundamentais. 

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O primeiro exílio do cartunista ocorreu ainda na década de 1980, aos dez anos, quando o pai tomou decidiu deixar a Nicarágua, desapontado com a corrupção que viu no setor público, onde trabalhava.

Seu segundo exílio começou por volta do Natal de 2018, quando uma grande crise atingiu a Nicarágua e o jornal Confidencial foi invadido. Ele morava em sua cidade natal, Estelí, um reduto político sandinista, o histórico movimento anti-imperialista do país.

Molina é ainda hoje um alvo do regime de Daniel Ortega devido às suas charges, que o colocam entre as vozes mais destacadas contra violações dos direitos humanos no país hoje.

Mesmo no exílio ele continuou desenhando cartoons e ilustrações sobre a Nicarágua e, além de exercer sua profissão de cartunista e ilustrador, atualmente dá aulas para novas gerações de jornalistas em universidades.

Molina é o primeiro cartunista a receber o prêmio da Fundação Gabo

Ao ser escolhido pela Fundação Gabo este ano, Molina se tornou o primeiro cartunista a receber o prêmio de excelência, instituído em 2013, e o segundo a receber um prêmio da fundação, após do argentino Hermenegildo “Menchi” Sábat (1933-2018), homenageado em 2005.

Molina foi premiado como reconhecimento à sua carreira e para destacar o valor social do jornalismo “que resiste aos abusos de poder político em nosso continente”, afirmou o conselho da fundação.

O presidente Daniel Ortega na ilustração de Pedro Molina. (Reprodução/Instagram/PxMolina)

O cartunista nasceu em Estelí, na Nicarágua, em 1976 e fez seu primeiro cartoon político aos 17 anos.

“Como uma dessas coincidências da vida, foi uma caricatura crítica de Daniel Ortega. Ironicamente, quase 30 anos depois, ainda estou retratando a arrogância imutável do mesmo cara”, ironizou Molina.

Como desenhista profissional, ele já foi publicado em vários meios de comunicação estrangeiros, incluindo Politico, BBC Mundo, Los Angeles Times, Newsweek, The Washington Post e Courier International.

Na Nicarágua, o cartunista passou por veículos como o La Tribuna, a seção de quadrinhos do El Nuevo Diario e, atualmente colabora com o Confidencial, um dos principais jornais do país. Além de um cartoon diário, ele também contribui com um cartoon dominical e ilustrações para vários artigos. 

Molina tem sua obra em livros publicados na coleção Gallimard/ Cartooning for Peace. Entre os prêmios que recebeu, estão o Maria Moors Cabot, da Columbia University (EUA), e o Prêmio Excellence in Journalism, concedido pela Inter American Press Association.

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Imprensa e oposição a Ortega vivem sob cerco na Nicarágua

A premiação da Fundação Gabo é mais um reforço sobre a situação precária da democracia na Nicarágua, que tem Daniel Ortega como presidente desde 2006, passando por duas reeleições.

Ortega já havia sido presidente do país entre 1979 e 1990, e hoje um sistema claro de sufocamento da imprensa e da oposição no país, com confisco de papel para impressão de jornais e o encarceramento de políticos da oposição se estabelecendo como métodos do governo.

Carlos Fernando Chamorro, um dos jornalistas mais importantes da Nicarágua, fugiu do país após ter sua casa invadida durante a noite, em junho. Editor do site Confidencial e membro de uma das famílias políticas mais influentes do país, Chamorro disse que deixou o país para “salvaguardar sua liberdade”.

O romancista nicaraguense Sergio Ramírez Mercado, vencedor do Prêmio Cervantes em 2017 e ex-vice-presidente do país, afirmou na Assembleia-Geral da Sociedade Interamericana de Imrensa que o “jornalismo das catacumbas” está voltando, numa referência a tempos em que as notícias eram lidas em igrejas sob luz de velas na Nicarágua sob ditadura.

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O jornal The New York Times afirmou em texto de junho, sobre a negativa da Nicarágua em conceder visto para um de seus repórteres, que há uma “ofensiva nacional” do governo Ortega para silenciar vozes críticas.

Sobre o Prêmio Gabo de Excelência e o Festival Gabo

A cada ano, o Conselho de Administração da Fundação Gabo seleciona um jornalista ou equipe jornalística que demonstre “independência, integridade e compromisso com os ideais do jornalismo de serviço público”, e homenageia estes profissionais por  “contribuições excepcionais” para a busca da verdade e o avanço do jornalismo. 

O Conselho de Administração é composto por Jean-François Fogel (França), Carlos Fernando Chamorro (Nicarágua), Germán Rey (Colômbia), Héctor Feliciano (Porto Rico), Jon Lee Anderson (Estados Unidos), Leila Guerriero (Argentina), María Teresa Ronderos (Colômbia), Martín Caparrós (Argentina), Mónica González (Chile), Natalia Viana (Brasil), Rosental Alves (Brasil) e Sergio Ramírez (Nicarágua).

Segundo a fundação, “o prêmio e o Festival Gabo têm como objetivo promover a busca pela excelência, inovação e coerência ética no jornalismo, inspirados nos ideais e na obra de Gabriel García Márquez”.

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