Milão – Guerra na Ucrânia, eleições nos EUA, primeiros passos do governo da primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, e até um atentado em Istambul, na Turquia são algumas das razões apontadas por jornalistas e ambientalistas para explicar o espaço reduzido da COP27 na mídia da Itália.

Fernanda Massarotto jornalista Itália COP27
Fernanda Massarotto, jornalista

No país, foi uma cúpula menos impactante se compararmos com a edição de Glasgow.

A comentada ameaça de boicote devido às violações de direitos humanos por parte do governo egípcio e a inibição de protestos de rua não parecem ter sido o fator fundamental para afugentar os jornalistas da cúpula.

Poucos jornalistas italianos acompanharam a COP27

“A imprensa italiana acompanha a COP27 de forma flutuante”, explica a repórter Sara Gandolfi, do Corriere della Sera, um dos mais importantes jornais italianos. Ela só embarcou para o Cairo no dia 14 de novembro.

Entre os poucos jornalistas italianos que participaram desde o início da conferência está Ferdinando Cotugno, que há anos cobre temas relativos ao clima para o jornal romano Domani.

“No ano passado, houve pressão para confirmar as metas do Acordo de Paris de manter o aquecimento global abaixo de 1,5°C e de reduzir pela metade as emissões anuais de gases de efeito estufa nos próximos oito anos”, analisa Cotugno.

Ele culpa a organização da cúpula, a complexa abordagem dos temas tratados e a ausência de personagens como a sueca Greta Trunberg e a italiana Martina Comparelli, da Fridays for Future, pela queda do interesse.

“As jovens ativistas preferiram deixar espaço para as colegas de países em desenvolvimento. E  isso também tirou um pouco da atenção. Uma pena, já que em 2022, só na Itália, os efeitos da mudança climática foram devastadores em várias regiões do país”, disse.

Escassez de água potável, aumento das inundações e até mesmo insegurança alimentar são conseqüências da falta de cuidado com o meio ambiente.

“A enchente de rara dimensão que aconteceu no centro da Itália, na região de Marche, está ligada certamente à mudança climática”, divulgou Alessandro Miani, presidente da Sociedade Italiana de Medicina Ambiental, em um relatório que avalia as interações entre o meio ambiente e a saúde.

Eventos climáticos vêm aumentando no país. Foram 130 desde o começo de 2022. O último foi a falta de água no verão europeu.

Declarações da primeira-ministra da Itália na COP27 recebidas com reservas 

A nova líder do governo italiano, Giorgia Meloni, esteve presente no Egito desde a abertura da COP27.

Mas encontro com o presidente do país anfitrião, Abdul Fatah Al-Sisi, gerou críticas da imprensa e de ativistas devido ao assassinato do pesquisador italiano Giulio Regoni, em 2016, no Cairo.

As autoridades egípcias jamais se pronunciaram sobre o ocorrido e as relações entre os países ficaram estremecidas.

Quanto à política climática, a primeira-ministra reafirmou o compromisso de reduzir as emissões de gás CO2. No entanto, a imprensa está cética.

“A retomada das perfurações no mar Adriático contrasta com o compromisso de redução do uso de combustíveis fósseis e adoção de energias renováveis”, analisa Sara Gandolfi, do Corriere della Sera.

Em 2009, os países ricos concordaram em destinar US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020 para programas de redução de emissões e adaptação às mudanças climáticas.

“Na Itália, o orçamento foi triplicado para € 1,4 bilhão para os próximos cinco anos, incluindo € 840 milhões alocados pelo novo Fundo Climático italiano”, lembra Ferdinando Cotugno, do jornal Domani.

Imprensa italiana atenta a emergência climática, mas não o suficiente

Apesar do espaço limitado nos meios de comunicação da Itália para a COP27, a imprensa do país tem dado mostras de que o assunto é de máxima importância.

Cadernos especiais e jornalistas especializados vêm aumentando como o passar dos anos. Sara Gandolfi acompanha políticas ambientais há 20 anos e acredita que os colegas têm feito um bom trabalho.

“Houve um grande avanço. No início, éramos poucos e os especialistas tinham dificuldade em publicar artigos científicos na imprensa”.

“O risco, porém, é o de se tornar uma ferramenta de ‘greenwashing’. Ou seja, de escrever sobre projetos menores e não totalmente transparentes de empresas que precisam “limpar sua imagem”, observa a repórter italiana.

Ferdinando Cotugno e Sara Gandolfi jornalistas Itália COP27
Ferdinando Cotugno e Sara Gandolfi / Reprodução Twitter

Já Ferdinando Cotugno, que escreveu os livros Primavera ambiental – a última revolução para salva a vida na Terra e Italian Wood, sobre os bosques nacionais, ressalta que a mídia italiana esbarra numa dificuldade:

“É claro que o tema vem recebendo mais atenção. Os meios de comunicação são o reflexo da mudança de pensamento da sociedade, que se interessa mais sobre o assunto.

Infelizmente ainda há uma certa dificuldade em relacionar efeitos e causas das mudanças climáticas. Acabamos falando muito sobre os efeitos e deixamos de lado as causas”.


Este artigo faz parte do MediaTalks Especial COP27.