Londres – Com uma série de fotos de pessoas que de alguma forma cruzaram o caminho do amigo e fotojornalista Anton Hammerl, sequestrado e morto quando cobria a guerra da Líbia, o português Edgar Martins foi escolhido eleito pela Organização Mundial de Fotografia como fotógrafo do ano no concurso Sony World Photography Awards. 

Além de vencedor geral do concurso, que teve mais de 180 mil trabalhos inscritos este ano, Martins também venceu na categoria Retratos. 

“O prêmio é uma experiência emocional, porque faço um tributo ao meu amigo em uma arena mundial e chamo atenção para as dificuldades da família em encontrar os seus restos mortais”, disse ele ao subir ao palco para receber a homenagem, em cerimônia realizada em Londres. 

Fotos de Martins relembram o amigo morto na guerra civil 

Anton Hammerl nasceu na África do Sul e morreu em maio de 2011, aos 41 anos, nas mãos da milícia governamental da Líbia. O corpo jamais foi localizado. Outros jornalistas também foram capturados no mesmo incidente. 

Ele tinha nacionalidade britânica e vivia no Reino Unido com a mulher, que iniciou uma luta incessante para recuperar os restos mortais.

As fotos da série “Nossa Guerra” mostram algumas pessoas que Hammerl conheceu e fotografou, assim como outros envolvidos nos conflitos ocorridos na Líbia entre as forças favoráveis e contrárias ao regime de Muammar Gaddafi.

O fotógrafo resolveu viajar para a Líbia em 2022, depois de também ter tentado achar o corpo do amigo. E resolveu fazer a série, diante da dificuldade de contar “uma história em que não há testemunhas, relatos, provas ou objetos”. 

“Este projeto retrata uma história complexa, distorcida pela ausência, que fala da dificuldade de documentar, testemunhar, recordar, honrar e imaginar”, disse Edgar.

O fotógrafo português procurou recordar  a figura do amigo ausente por meio de retratos das pessoas com que Hammerl cruzou, como combatentes e seus descendentes, ex-milicianos, residentes locais, pessoas fiéis a Gaddafi e até sósias do líder, como este. 

Sósia de Gaddafi fotos de guerra concurso de fotografia Sony Awards
© Edgar Martins, Portugal, Fotógrafo do Ano, Competição profissional, Retrato, 2023 Sony World Photography Awards

Nesta imagem, Edgar Martins retratou um combatente da liberdade com uma burca improvisada, feita com uma sacola plástica de uma loja de departamentos britânica. 

Combatente da liberdade dissidente em burca improvisada fotos de guerra concurso de fotografia Sony Awards
© Edgar Martins, Portugal, Fotógrafo do Ano, Competição profissional, Retrato, 2023 Sony World Photography Awards

Edgar contou que as pessoas retratadas “foram escolhidas porque se pareciam com ele ou tinham ideias e crenças semelhantes, fazendo lembrar dele em diferentes fases da amizade”.

Uma das imagens da mostra um complexo onde as forças rivais ao governo da Líbia treinavam, agora abandonado. 

homem em local abandonado Libia fotos de guerra concurso fotografia Sony Awards
© Edgar Martins, Portugal, Fotógrafo do Ano, Competição profissional, Retrato, 2023 Sony World Photography Awards

A série premiada pela Organização Mundial de Fotografia explora a ideia de ausência, e a documentação do luto como forma de homenagem a uma pessoa.

As fotos também provocam reflexões sobre a função da fotografia dentro de uma zona de conflito, mostrando as muitas contradições e ambiguidades da guerra.

Na imagem feita por Martins, um lutador simula estar sendo baleado na cabeça. Ao fundo, um grande arbusto que sobreviveu à batalha de Misrata.

Lutador demonstrando ser baleado na cabeça fotos de guerra concurso de fotografia Sony Awards
© Edgar Martins, Portugal, Fotógrafo do Ano, Competição profissional, Retrato, 2023 Sony World Photography Awards

Edgar Martins nasceu em 1977 em Évora, mas cresceu em Macau (China), onde estudou Filosofia. Ele é graduado pela University of the Arts (Londres) e tem um mestrado em Fotografia e Belas Artes no Royal College of Art de Londres.

Seu trabalho está presente em diversas coleções públicas, incluindo o museu Victoria & Albert, de Londres.Além de fotógrafo, ele tem vários livros publicados, entre romances e obras sobre fotografia. 


Cenas de outros conflitos pelo mundo também foram selecionadas pelo júri da Organização Mundial de Fotografia. Veja as imagens de reportagens fotografias premiadas na categoria Projetos Documentais. 

Movimento pela paz no Congo, por Hugh Kinsella Cunningham

Quase 20 anos depois de um conflito que matou cinco milhões de pessoas, a República Democrática do Congo está mais uma vez mergulhando no caos. 

Embora o conflito renovado com os rebeldes M23, os massacres e a militarização regional chamaram a atenção do mundo este ano, a contribuição vital das mulheres para a paz permanece invisível, conta Cunningham, premiado fotógrafo britânico especializado em documentar conflitos. 

“Elas trabalham para criar um diálogo entre os atores armados e as comunidades, rastreiam as violações dos direitos humanos, alertam sobre a violência iminente e pedem aos líderes rebeldes que parem os ataques.”

Enquanto as equipes de mídia chegam brevemente para filmar cenas de guerra, ele passou meses em áreas de difícil acesso cobrindo conflitos e registrando em fotos o lento trabalho de paz de uma perspectiva única.

Segundo o fotógrafo, movimentações frequentes das tropas em combate criam incertezas sobre quais áreas são seguras para os civis.

 Ele registrou o trabalho da ativista pela paz Liberata Buratwa, que recolhe informações sobre a situação da segurança local e depois compartilha com sua rede de contatos em  Rutshuru, província de Kivu do Norte. .

reunião ativista paz Congo fotos de guerra concurso fotografia Sony Awards
© Hugh Kinsella Cunningham, Reino Unido, 1º lugar, Competição profissional, Documentário, 2023 Sony World Photography Awards

 Buratwa, retratada por Cunningham, trabalha pela paz desde jovem. Em 2008, no auge de uma onda de massacres, ela liderou uma delegação de mulheres para se encontrar com Laurent Nkunda, líder do grupo rebelde CNDP.

‘Dissemos a ele, ‘meu filho, a rebelião não vai te levar a lugar nenhum, o mato é para os animais, não para as pessoas”.

ativista paz Liberata Buratwa fotos de guerra concurso fotografia Sony Awards
© Hugh Kinsella Cunningham, Reino Unido, 1o lugar, competição profissional, Documentário, Sony World Photography Awards 2023

As ativistas também falam com civis que tiveram que deixar os locais onde viviam para coletar testemunhos de violações de direitos humanos. 

E organizam encontros entre guarnições militares e comunidades locais para compartilhar queixas abertamente e resolver as tensões, ajudando a prevenir a violência.

Em Beni, província de Kivu do Norte, Madeline Akida é observada por um soldado observa enquanto fala em uma reunião para promover o diálogo entre mulheres locais e uma unidade do exército congolês baseada em uma guarnição próxima.

ativista paz fala com soldado fotos de guerra concurso de fotografia Sony Awards
© Hugh Kinsella Cunningham, Reino Unido, 1o lugar, competição profissional, Documentário, Sony World Photography Awards 2023

Gaza luta para acomodar os vivos e os mortos à medida que a população cresce, por Mohammed Salen, Palestina

As fotos de Salen retratam a crise de moradia na densamente povoada Faixa de Gaza. Uma batalha por espaço está colocando os vivos contra os mortos, com colonos sem-teto alojando-se nos cemitérios da área, como relatou o fotógrafo. 

“A terra está se esgotando e a competição por imóveis é acirrada, com uma demanda cada vez maior por moradias e terras agrícolas.

Agora, até os mortos são afetados, pois seus locais de descanso são pressionados por posseiros e pela realidade implacável de uma população sem lugar para ir”.

menino na porta de casa fotos de guerra palestina concurso de fotografa Sony Awards
© Mohammed Salem, Palestina, 2o lugar, Competição profissional, Documentário, Sony World Photography Awards 2023

 

mãe com filho no cemitério Palestina fotos de guerra concurso de fotografia Sony Awards
© Mohammed Salem, Palestina, 2o lugar, Competição profissional, Documentário, Sony World Photography Awards 2023

Postais do Afeganistão após 40 anos de guerra, por Bruno Zanzottera, Itália

A Ásia Central já foi atravessada por numerosos povos, comerciantes e exércitos. O Afeganistão estava no coração deste mundo, pois recebia aqueles que viajavam pela Ásia, mas sem dúvida nenhum dos invasores jamais partiu completamente.

Essas imagens documentam uma jornada pelo Afeganistão após 40 anos de guerra e quatro anos de seca e ficaram em segundo lugar na categoria Paisagens do prêmio. 

Aqui eles mostraram “um aviso” a motoristas descuidados ao longo da estrada entre a província de Kunduz, no norte, e Cabul. 

carro velho suspenso leito do rio foto de guerra concurso fotografia Sony Award
© Bruno Zanzottera, Itália, 2º Lugar, Competição Profissional, Paisagem, Sony World Photography Awards

Dois jovens turistas de Cabul fazem uma selfie durante um passeio de barco no Lago Bandi Amir, na província de Bamyan. Por causa da guerra muito longa, para muitas pessoas esta é a primeira vez que podem viajar para fora de sua cidade.

turista tirando selfie passeio barco foto de guerra concurso fotografia Sony Award
© Bruno Zanzottera, Itália, 2º Lugar, Competição Profissional, Paisagem, Sony World Photography Awards

As fotos de vencedores do Sony World Photography Awards foram publicadas com autorização dos organizadores e não podem ser reproduzidas.