Londres – A ideia de convidar o público para jurar lealdade ao novo rei da Inglaterra, Charles III, uma honraria até então reservada aos nobres, foi recebida com críticas e acabou virando uma nova crise de imagem para a realeza a menos de uma semana da coroação

Foi mais uma das iniciativas do Palácio de Buckingham de modernizar a monarquia, convocando os “plebeus” que acompanharão pela TV a celebração na Abadia de Westminster a repetirem as palavras do juramento onde quer que estivessem – na rua, em casa, no pub – em uma “ruptura moderna da tradição”.

A reação à proposta feita ao “coro de milhões” foi diferente da esperada. Desde que o convite foi feito, no sábado, uma onda de críticas tomou conta de jornais e das redes sociais, sobretudo por parte de pessoas e grupos que defendem o fim da monarquia. 

Juramento ao rei Charles III e sucessores 

A ideia foi apresentada quando o Palácio de Lambeth, equivalente à sede da igreja anglicana, divulgou a liturgia da cerimônia de coroação. O texto a ser recitado pelos súditos diz: 

“Juro que prestarei verdadeira lealdade a sua majestade e a seus herdeiros e sucessores de acordo com a lei. Que Deus me ajude.”

Ele irá substituir a tradicional Homenagem dos Pares, na qual uma longa fila de lordes hereditários se ajoelhava e fazia uma promessa ao monarca pessoalmente.

Após a frase haverá um toque de fanfarra, e o celebrante, o arcebispo de Canterbury proclamará “Deus salve o rei”.

Os súditos devem então responder:

“Deus salve o rei Charles. Viva o rei Charles. Que o rei viva para sempre.”

Outras mudanças na cerimônia tradicional foram anunciadas, como destaque a figuras femininas do clero, o rei rezando em voz alta e líderes religiosos de outras fés terem um papel ativo.

Após o término do serviço religioso, o rei  Charles III receberá uma saudação de líderes judeus, hindus, sikhs, muçulmanos e budistas.

Mas tudo ficou em segundo plano com a reação à ideia do juramento. 

Críticas ao rei Charles III lideradas pelo grupo Republic

A organização antimonarquista Republic – que está por trás do movimento #NotMyKing – chamou o convite de “ofensivo, surdo e um gesto que despreza o povo”.

“É provável que essa ideia bizarra se revele um grande erro de cálculo, nascido do medo de que a monarquia esteja perdendo apoio rapidamente”, escreveu o líder do grupo Republic, Graham Smith, em um comunicado. 

Smith lidera o movimento que defende a eleição direta de um chefe de Estado, substituindo o rei que recebe o cargo por hereditariedade. 

Em uma entrevista a um grupo de correspondentes estrangeiros na semana passada, ele criticou a falta de transparência sobre as finanças da família real, as leis que não se aplicam a ela e a falta de democracia no processo de escolha do chefe de Estado. 

Comentando o convite, Graham Smith disse que em uma democracia o chefe de Estado “deve jurar lealdade ao povo, e não o contrário”.

“Esse tipo de absurdo deveria ter morrido com Elizabeth I, não sobrevivido a Elizabeth II”.

Um porta-voz do Arcebispado de Canterbury tentou consertar o estrago dizendo que  “foi mais um convite do que uma expectativa ou pedido”. E acrescentou que as pessoas podem aderir se acharem certo, como fariam ao cantar o hino nacional.

Enquanto alguns protestaram com fúria e argumentos, outros preferiram usar o humor. Memes se multiplicaram nas redes sociais ironizando a ideia de jurar lealdade ao rei.

Um deles fez alusão ao famoso diálogo do então príncipe Charles com Camilla Parker-Bowles, gravado por escuta telefônica, em que o amante apaixonado disse que gostaria de ser o absorvente dela – caso que ficou conhecido como Tampongate. 

Os torcedores do Celtic improvisaram uma musiquinha, sugerindo que a coroação fosse colocada em um lugar pouco nobre. 

A coroação do rei Charles II e da rainha Camilla, planejada para reafirmar com pompa e simbolismos a importância da monarquia, também está sendo criticada pelos altos custos e por ser o único evento desse tipo na Europa.

O valor estimado pelo grupo Republic chega a 250 milhões de libras. 

Outras nações que adotam o sistema fazem passagens de comando em cerimônias bem mais discretas, algumas dentro do próprio Parlamento.

Os maldosos dizem que ele esperou tanto tempo para assumir o trono, já que a rainha Elizabeth morreu aos 96 anos, que a festa se justifica.

Um dos argumentos para os três dias de festa com dinheiro público é que a ascensão de Charles ao trono, em setembro de 2022, aconteceu em clima de tristeza pela morte da rainha.

Agora, seria a hora de alegria, celebrando com convidados e representantes de países para dar um lustro no soft power britânico.

No entanto, diante de uma população cada vez mais inclinada a repensar o futuro da monarquia, segundo as pesquisas, qualquer passo em falso vira uma crise, como foi a ideia do juramento.

Diariamente o Palácio de Buckingham distribui diversas notas para a imprensa com detalhes sobre a cerimônia para criar expectativa. 

Nesta segunda-feira, a novidade foi que o rei usará na coroação uma cadeira reciclada que foi de seu avô, George VI, a fim de tornar o evento mais sustentável.