Um levantamento organizado a partir de entidades representativas da imprensa na América Latina aponta para uma escalada de tentativas de sufocamento da liberdade de imprensa na região. A medição, feita desde 2018, agrupa alertas feitos a partir do monitoramento de ações na sociedade contra o acesso à informação.
No Brasil, 2020 registrou uma alta de 222% no número de alertas na comparação com o ano anterior, com 419 contra 130. O país passou a fazer o monitoramento em 2019, com a Abraji (Associação Brasileiro de Jornalismo Investigativo), que repassa os dados ao coletivo Voces del Sur, iniciativa composta por 13 organizações da sociedade civil ligadas ao jornalismo na América Latina.
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O Relatório Sombra, como é chamado o agrupamento de dados, destaca a atuação do presidente Jair Bolsonaro, que segundo o estudo “estigmatiza jornalistas, corrói a confiança do público no jornalismo e incentiva a violência de seus apoiadores”.
Os alertas são elaborados de acordo com regras dentro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas, metas para o aprimoramento da sociedade até 2030. Um dos indicadores diz respeito ao livre acesso à informação. Veja aqui o estudo completo.
Brasil é “líder” em estigmatização da imprensa e dos jornalistas
O discurso estigmatizante é apontado pelo levantamento como o problema mais incidente no Brasil, com 159 ocorrências em 2020. Nesta categoria entram episódios do presidente ofendendo jornalistas e os mandando calar a boca, entre outros “desabafos”, bravatas e piadas de Bolsonaro sobre a imprensa.
O país tem o maior número de ataques deste tipo na América Latina, com “liderança folgada”, seguida por México (66) e Venezuela (48).
“O governo Bolsonaro liderou uma estigmatização da imprensa que repercutiu no Estado e na sociedade. Ataques e assédio online se tornaram predominantes e sistemáticos; ameaças nas redes sociais dão lugar a ataques coordenados em massa. As instituições públicas, principalmente o sistema judicial, são usadas como armas contra os jornalistas”, exemplifica o relatório.
Cuba é nação latino-americana com mais detenções arbitrárias, diz estudo
Os governos se mantêm desde 2018, quando o levantamento começou, como autores da maioria dos ataques à liberdade de imprensa e acesso à informação. Em 2020, ações governamentais ou de governantes somaram 59% do total de alertas, enquanto no ano anterior eram 75%.
O Brasil não registra alertas ligados à violência extrema, com exceção de um assassinato ocorrido em 2020. No México foram seis no mesmo ano, o pior índice registrado, seguido por Honduras, com quatro (no ano anterior o país da América Central teve nove jornalistas assassinados). Sequestros e desaparecimentos não constaram na realidade brasileira.
Cuba desponta na questão de detenções arbitrárias. Foram 142 só no ano passado, enquanto no Brasil foram registradas três. Na Venezuela, 61 jornalistas foram detidos, enquanto no México a soma ficou em 40.
Com eleições chegando, tendência é o clima piorar
A situação tensa entre imprensa e governo não tem um horizonte tranquilo no futuro próximo, indica o Relatório Sombra. Uma vez que novas eleições presidenciais se aproximam, esse atrito só deve se intensificar.
“O contexto pré-eleitoral de 2021 e as eleições presidenciais de 2022 podem incentivar a violência de detentores de poder e fanáticos que veem os jornalistas como inimigos”, pondera o estudo do Voices del Sur.
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A julgar pela traumática eleição nos Estados Unidos, com Donald Trump inflamando seus apoiadores contra os resultados, deve haver turbulências adiante. A onda de ataques do candidato às instituições e informações oficiais culminou na invasão ao Capitólio, que resultou em prisões e morte.
No Brasil, Bolsonaro faz campanha pelo retorno do voto impresso, mesmo com auditorias internacionais chancelando as urnas eletrônicas. O presidente chegou a afirmar recentemente a possibilidade de o país não ter eleições caso não fosse possível um pleito “limpo”. Na última pesquisa Datafolha, do último dia 9, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva aparece com 58% das intenções de voto no segundo turno, contra 31% do atual mandatário.